A revolução ecológica de Lisa, Oliver e do porco Arnold

Viver no Campo agarrava o ar dos tempos nos Estados Unidos pós-revolução cultural dos anos 60.

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O casal Lisa e Oliver Douglas
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Viver no Campo girava em torno da chegada de um casal nova-iorquino à região rural de Green Acres METRO-GOLDWYN-MAYER
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Oliver era Eddie Albert, Lisa era a mais nova das irmãs Gabor, Eva METRO-GOLDWYN-MAYER
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No final de um dos primeiros dias da nova vida radicalmente alterada pela decisão de deixar Nova Iorque e ir viver para a pequena Hooterville, na região de Green Acres, o casal Oliver e Lisa Douglas termina o seu jantar. Como não podia deixar de ser, a mesa mantém a elegância e o requinte que lhes eram habituais na cidade. Mas, refeição terminada, Lisa trata de se dedicar às tarefas domésticas, comuns a quem vive mais frugalmente no campo, sem a panóplia de criados permitida na vida luxuosa que o casal tinha decidido abandonar.

Lisa prepara-se, assim, para lavar a loiça recorrendo a uma moderna máquina. Levanta-se da cadeira. Uma por uma, agarra nas quatro pontas da toalha de pano que naturalmente cobre a mesa do repasto. Juntas-as bem juntinhas ao alto e puxa com as duas mãos.

Feita a trouxa, com os copos, pratos, talheres, candelabros e tudo o mais que estava em cima da mesa, avança para a máquina de lavar. Abre a porta e procura encafuar na prateleira da máquina o embrulho da louça do jantar. A cena acaba com Lisa a digladiar-se com a prateleira e a trouxa, na tentativa insana de assim cumprir a sua tarefa doméstica.

A cena é uma dos inúmeros momentos de non-sense que fizeram de Viver no Campo uma das grandes séries televisivas até hoje fixadas na memória de milhões. Foi uma das produções da CBS que brilharam nos ecrãs durante anos – a série foi produzida e emitida nos Estados Unidos entre 1965 e 1971. Portugal transmitiu-a a partir de 1971.

Filmada em ambiente de estúdio – e emitida em Portugal a preto e branco, claro –, a sua trama assentava numa ideia-base que agarrava o ar dos tempos nos Estados Unidos pós-revolução cultural dos anos 60. O mote era o impacto nas elites urbanas da onda da ecologia e do regresso à natureza.

A história era simples: um advogado de sucesso em Nova Iorque, já na meia-idade, fazia uma opção radical de vida e decidia ir para o campo com a sua mulher, uma senhora de classe média-alta nova-iorquina submersa no mais puro consumismo e inebriada pelo glamour com que vivia os grandes e os pequenos momentos do seu quotidiano de membro das elites sociais.

A opção de Oliver, que a impõe a Lisa, é comprar uma quinta – a cair de podre – em Hooterville, na região de Green Acres, Noroeste dos Estados Unidos. Mudarem-se de armas e bagagens da sua penthouse nova-iorquina para o ar puro. Daí surgem, naturalmente, as atitudes conflituantes de quem quer aderir sem impedimentos à “country life” e quem não sabe respirar fora da “city life”.

A série vivia dos contra-sensos, dos contrastes e dos paradoxos entre estes dois membros da elite nova-iorquina e os campónios, gente rural, atrasada, mas finória e cheia de matreirice, entre os quais passam a residir.

Evidente é também que a chave de Viver no Campo, cujo nome original era precisamente Green Acres, era o excêntrico facto de o casal nova-iorquino ser desempenhado por dois actores de mão-cheia. O desajustado e ingénuo Oliver Wendell Douglas era magistralmente intrepretado por Eddie Albert (1906-2005); quanto à deslumbrante Lisa Douglas, basta provavelmente dizer que era uma criação da actriz de origem húngara Eva Gabor (1919-1995), a mais nova das irmãs Gabor – Magda, Zsa Zsa e Eva – que marcaram o universo hollywoodesco.

Eva Gabor construiu uma personagem que ficou no imaginário de várias gerações, pelo seu desempenho magistral – embora sujeita sempre à critica depreciativa de que no fundo desempenhava em Lisa Douglas o seu próprio papel de diva da alta sociedade norte-americana.

Viver no Campo valia pela forma como o simpático Oliver se dedicava a tentar adquirir novos hábitos de vida rural e as competências – como hoje se diz – para viver no campo e explorar uma quinta com sucesso, além de procurar, nem sempre com grande êxito, desempenhar o seu papel cívico na nova comunidade rural.

Mas o gozo maior dos 30 minutos de cada episódio era a fenomenal Lisa Douglas, que aderiu à vida no campo sem nunca abdicar da sua elegância e sofisticação, das jóias, da maquilhagem e das toilletes inerentes ao seu glamour. Na verdade, a única grande mudança que Lisa Douglas fez ao mudar-se para Green Acres foi juntar ao seu inseparável Yorkshire Terrier, que passeava ao colo, um novo animal de estimação: o porco Arnold, com a sua coleira de brilhantes.

Esta série é publicada às segundas e às terças-feira. Próxima: Anos Dourados

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