Enquanto treme, a Lua também encolhe

Dois artigos científicos publicados esta semana revelam-nos alguns segredos sobre a geologia da Lua.

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Voltaram-se a analisar os registos dos sismógrafos do programa Apolo Daniel Rocha

Basta olharmos para o céu (praticamente) todas as noites para vermos a Lua. Mas o que se passa ao certo no nosso satélite natural? Uma equipa de cientistas dos Estados Unidos e do Canadá voltou a analisar os dados de sismógrafos deixados na Lua durante o programa Apolo e percebeu que os sismos dessa altura terão sido causados pela actividade tectónica. Já as imagens da sonda Lunar Reconnaissance Orbiter (LRO) revelam que o satélite natural está a encolher, formando milhares de falhas na superfície lunar. Por isso, conclui-se que a Lua estará a encolher e a produzir sismos ao longo dessas falhas.

Durante as missões da Apolo 11, 12, 14, 15 e 16, foram deixadas na superfície da Lua cinco sismógrafos. O aparelho levado pela Apolo 11 só funcionou três semanas, mas os restantes instrumentos registaram 28 sismos entre 1969 e 1977, refere-se num comunicado da Universidade de Maryland (EUA), que teve cientistas envolvidos no trabalho publicado esta semana na revista científica Nature Geoscience.

Agora, uma equipa que tem como principal autor Thomas Watters, da Instituição Smithsonian (EUA), decidiu voltar a analisar esses dados e a sobrepô-los às imagens recolhidas pela LRO. Desde que foi lançada em 2009, a LRO já recolheu imagens de mais de 3500 falhas geológicas na Lua. Essas imagens também mostraram manchas brilhantes nas falhas. “Como gradualmente a desagregação escurece o material na superfície lunar, as áreas mais brilhantes indicam as regiões que são recentemente expostas a sismos”, lê-se no comunicado.

“Agora relacionámos alguns dos sismos superficiais detectados pelos sismógrafos do programa Apolo entre 1969 e 1977 com as recentes falhas geológicas [observados pela LRO]”, explica ao PÚBLICO Thomas Watters. Através de um novo algoritmo, os cientistas descobriram que os epicentros de oito dos 28 sismos estavam dentro de uma área 30 quilómetros de falhas geológicas observadas pela LRO. Devido a esta proximidade, concluiu-se que as falhas causaram os sismos.

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Sinais de movimento: as setas mostram um terreno com penedos NASA/GSFC/Universidade Estadual do Arizona/Smithsonian

A equipa percebeu ainda que seis desses oito sismos aconteceram quando a Lua estava perto ou mesmo no seu apogeu, o ponto da sua órbita mais afastado da Terra. Nesse momento, a força de maré da gravidade da Terra causou maior tensão na crosta da Lua, o que tornou provável deslizamentos na sua superfície.

“Pensamos que é muito provável que esses oito sismos tenham sido produzidos pelo deslizamento de falhas quando a crosta lunar foi comprimida por uma contracção global e pela força de maré. O que indica que os sismógrafos das Apolos registaram o encolhimento da Lua e que ela ainda é tectonicamente activa”, explica Thomas Watters.

O cientista acrescenta que estas falhas estão também a arrefecer o interior (ainda quente) da Lua. “Este arrefecimento resulta na contracção global da Lua. Temos de descobrir como pequenos corpos rochosos como a Lua conseguem reter o seu interior quente durante milhares de milhões anos [no caso da Lua durante 4510 milhões de anos]”, sugere.

“Para mim, estes resultados reforçam a necessidade de voltarmos à Lua”, diz por sua vez Nicholas Schmerr, da Universidade de Maryland e também autor do artigo, no comunicado. “Aprendemos muito através das missões Apolo, mas elas apenas arranharam a superfície da Lua. Com uma rede maior de sismógrafos modernos, podemos fazer grande progressos na compreensão da geologia da Lua.” Já Thomas Watters frisa que em futuras missões é preciso tomar em conta a localização das falhas geológicas.

Notícias da Chang’e-4

Esta semana também foram divulgadas as observações iniciais do robô Coelho de Jade-2 (ou Yutu-2, em mandarim) da sonda chinesa Chang’e-4, que a 3 de Janeiro deste ano se tornou a primeira a alunar no lado oculto da Lua. A Chang’e-4 aterrou na Bacia do Pólo Sul-Aitken, a maior e mais antiga cratera lunar provocada por um impacto, e libertou depois o Coelho de Jade-2 para explorar o sítio.

Agora, uma equipa de investigadores da Academia Chinesa de Ciências divulga os primeiros resultados dessa exploração, nomeadamente das observações do espectrómetro do robô. Poderá ter-se encontrado material do manto lunar no sítio onde a sonda pousou, o que poderá dar pistas sobre a sua composição, segundo os cientistas chineses.

“Neste estudo, concluímos que o manto superior da Lua pode ser composto predominantemente de olivina e piroxena com baixo teor de cálcio, o que significa que não pode ser descartada a hipótese de que o manto lunar é rico em olivina [um silicato]”, explica ao PÚBLICO Bin Liu, da Academia Chinesa de Ciências e um dos autores do artigo científico publicado na revista Nature.

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O sítio na Lua explorado pelo Coelho de Jade-2 NAOC/CNSA

Segundo uma hipótese dos anos 70, terá existido um oceano de magma a cobrir a superfície da Lua na sua infância, refere-se num comunicado da Academia Chinesa de Ciências. Depois, quando esse oceano começou a arrefecer, os minerais mais leves ficaram na superfície e os mais pesados – como a olivina e a piroxena – foram para ao manto lunar.

Ao caírem na Lua, os asteróides e o lixo espacial criam fissuras na crosta e expõem pedaços do manto lunar. O Coelho de Jade-2 terá encontrado esses pedaços e reunido pistas sobre a composição do manto lunar.

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