A psicose de Diamantino

Sobre Diamantino, de Gabriel Abrantes.

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O texto seguinte foi produzido por um dos participantes do 3.º Workshop Crítica de Cinema realizado durante o 26.º Curtas Vila do Conde – Festival Internacional de Cinema. Este workshop é formado por um conjunto de masterclasses e debates com convidados internacionais e pela produção de textos críticos sobre os filmes exibidos durante o festival, que serão publicados, periodicamente, no site do PÚBLICO e no blogue do Curtas Vila do Conde.

Diamantino (2018) marca o regresso ao Curtas Vila do Conde de um realizador acarinhado pelo festival: Gabriel Abrantes, que aqui apresenta a sua primeira longa-metragem, realizada a quatro mãos com Daniel Schmidt. O filme partilha o título com o nome da sua personagem principal, o maior jogador de futebol do país e do mundo, homem que os espectadores não terão dificuldade em reconhecer como uma versão transmutada de Cristiano Ronaldo.

Tendo em conta a obra anterior de Abrantes, é surpreendente ver um filme com uma carga política tão concreta como Diamantino. Mas, pese embora a intenção política da obra, a sua representação da contemporaneidade é inteiramente original. Portugal constitui aqui uma amálgama de todas as crises políticas atuais do mundo ocidental, um sítio onde slogans trumpistas (“Tornar Portugal grande outra vez”) se confundem com referendos sobre a saída da UE e a chegada de refugiados.

Por entre esta cacofonia, Abrantes e Schmidt mostram a maneira como regimes utilizam símbolos nacionais com meios propagandísticos, como é o caso de um atleta, que, num anúncio televisivo financiado pelo estado, surge como D. Sebastião, o eurocéptico salvador da pátria. Os media também não escapam ilesos, sendo expostos pelo papel que têm na génese da histeria colectiva que invariavelmente acompanha uma crise, promovendo entre as pessoas uma resposta emocional a estes problemas, como acontece ao protagonista, que, para “fazer o bem”, se dispõe a adoptar um refugiado… moçambicano.

Estas ideias são acomodadas numa narrativa progressivamente mais esquizofrénica, o que constitui tanto a maior força como a maior fraqueza de Diamantino. O que inicialmente parece uma crítica mais ou menos subtil rapidamente tende para o didáctico, algo a que o filme escapa através da sua execução cómica - uma pequena falha num filme que graciosamente percorre o estreito caminho entre o divertimento leviano e a seriedade ideológica.

Texto editado por Jorge Mourinha

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