Ministério Público arquiva inquérito ao desaparecimento de obras de arte do Estado

Passados dois anos e meio, termina a investigação aberta pelo Departamento de Investigação e Acção Penal de Lisboa. Por onde andarão as 94 obras da antiga colecção SEC cujo paradeiro se desconhecia?

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Entre as obras desaparecidas está um estudo de Júlio Pomar para o mural do Cinema Batalha, recentemente restaurado Nelson Garrido

O Ministério Público arquivou o inquérito ao desaparecimento de 94 obras da colecção de arte contemporânea do Estado, revelou esta terça-feira a Procuradoria-Geral da República (PGR) à agência Lusa.

O inquérito tinha sido aberto em Julho de 2020 pelo Departamento de Investigação e Acção Penal (DIAP) de Lisboa, depois de o Ministério da Cultura ter enviado ao Ministério Público um relatório da Direcção-Geral do Património Cultural (DGPC) para apurar o paradeiro das obras em falta.

Contactada pela Lusa, fonte do gabinete de imprensa da PGR indicou que o inquérito em causa “conheceu despacho de arquivamento”.

O relatório da DGPC dava conta de 94 obras de arte da antiga Colecção SEC (Secretaria de Estado da Cultura) com paradeiro desconhecido, e outras 18 obras de arte “cuja localização não é conhecida, ou é necessário rectificar com o Centro Português de Fotografia”, no Porto.

Na altura, a ministra da Cultura, Graça Fonseca, tinha anunciado o envio do relatório ao Ministério Público, justificando que a tutela não tinha competências de investigação e que, por isso, o documento seria “encaminhado para as devidas instâncias”.

Por seu turno, a PGR remeteu o documento ao DIAP de Lisboa, onde deu origem a um inquérito, indicou em Julho fonte oficial contactada pela Lusa: “Este processo encontra-se em investigação e está sujeito a segredo de justiça externo.”

O relatório da DGPC alertava que “a existência de obras por localizar constituiu uma fragilidade da colecção” de arte contemporânea.

Entre as obras de arte cujo paradeiro é desconhecido estão gravura, desenho, pintura e escultura de vários autores, entre eles José de Guimarães, Malangatana, Xana, Helena Almeida, Jorge Pinheiro, Abel Manta, Júlio Pomar e Graça Morais.

A Lusa contactou o Ministério da Cultura para obter uma reacção, e o gabinete de imprensa indicou que o ministro Pedro Adão e Silva “não comenta” o arquivamento do inquérito.

Um milhar de obras

Iniciada em 1976, a chamada colecção SEC –​ actual Colecção de Arte Contemporânea do Estado – reúne cerca de um milhar de obras, sobretudo de artistas portugueses, como Helena Almeida, Julião Sarmento, José de Guimarães, Abel Manta, Júlio Pomar, Ilda David e Noronha da Costa.

Também inclui artistas estrangeiros como Andy Warhol, Robert Mapplethorpe e Sebastião Salgado, encontrando-se dispersa por vários organismos públicos, culturais e não culturais, em Portugal e fora do país.

“O constante movimento de circulação de obras ao longo de mais de quatro décadas de existência da colecção, nem sempre [foi] acompanhado do indispensável registo documental e em sede de inventário”, lia-se no relatório, validado pela então directora-geral do Património Cultural, Paula Silva.

O anterior documento oficial de inventário da colecção data de 2011 e dá conta de 170 obras cuja localização era, então, desconhecida. Neste novo inventário foram actualizados e expurgados registos, esclarecidas informações sobre o paradeiro de obras de arte, tendo a DGPC chegado à soma de 94 obras em parte incerta.

Outras 18 fotografias têm também paradeiro desconhecido, mas não foram tidas em conta neste inventário porque não estão sob a alçada da DGPC, embora sejam de cariz público, pois fazem parte do acervo do Centro Português de Fotografia, cuja gestão compete à Direcção-Geral do Livro, Arquivos e Bibliotecas.

A colecção de arte contemporânea do Ministério da Cultura está dispersa por organismos como embaixadas e direcções-regionais de Cultura, mas a maioria encontra-se na Fundação de Serralves (553 obras), no Porto, na Câmara Municipal de Aveiro (159) e no Centro Cultural de Belém (37), em Lisboa.

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