Morreu Phil Mendrix, o guitarrista que atravessou a história do rock português

Músico que se revelou com os Chinchilas, passou pelos Roxigénio e mais recentemente se juntou à trupe Ena Pá 2000, Irmãos Catita e Corações de Atum tinha 70 anos. Morreu esta segunda-feira.

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DANIEL MENDONÇA

Chamava-se Filipe Mendes, mas fica para a história do rock português, que ajudou a inventar nos anos 60, como Phil Mendrix, nome de guerra inspirado no seu mestre Jimi Hendrix. Morreu esta segunda-feira, de cancro, aos 70 anos.

Revelado em meados da década de 60 com Os Chinchilas, passou, ainda antes do 25 de Abril, por bandas como Fluido, Grupo 5, ou Heavy Band, participou depois nos Psico ou nos Roxigénio, e vinha colaborando mais recentemente com Manuel João Vieira nos Ena Pá 2000 e noutros projectos, como Irmãos Catita ou Corações de Atum.

Filipe Alberto do Paço de Oliveira Mendes nasceu em Lisboa a 10 de Novembro de 1947, mas foi ainda criança para Moçambique, onde se iniciou na música, primeiro com estudos de piano e depois praticando incessantemente com uma viola que o avô lhe ofereceu aos 14 anos.

Regressado a Portugal em plena vaga yé-yé, tem 16 anos quando funda em Lisboa Os Chinchilas, em 1964, com três amigos ainda mais novos do que ele. O baterista, Vítor Mamede, tinha apenas 13 anos quando começou a tocar com o grupo. Em 1965, Os Chinchilas vencem o Festival de Música Moderna da Costa do Sol, e no ano seguinte participam num então muito badalado Concurso Yé-Yé organizado no Teatro Monumental, em Lisboa, pelo Movimento Nacional Feminino, acabando na sexta posição.

Com Filipe Mendes como compositor, viola solo e vocalista, o primeiro disco do grupo, um EP, sai em 1967, e abre com uma cover de I’m a believer, um tema de Neil Diamond que os Monkees tinham popularizado no ano anterior. Mas as restantes três músicas do disco eram todas originais de Mendes: Take that train, Crying e Marry me.

Nesse mesmo ano, o guitarrista ruma aos Estados Unidos, para estudar na Chicago School of Music, e testemunha a explosão do movimento hippie nesse Verão que ficou conhecido como Summer of Love. Influenciado por Jimi Hendrix, que lançara em 1967 Are You Experienced, mas também pelos Cream de Eric Clapton, Filipe Mendes regressa a Portugal em 1968 e grava um segundo disco com Os Chinchilas, Calmas São as Imagens, um tema melancólico e psicadélico, com uma versão de Don’t want you no more, do Spencer Davis Group, no lado B.

Mendes editou depois a solo o single Ring stone eyes / O urso Ki e um último disco dos Chinchilas, em 1970, quando a banda já se dissolvera, e que reunia o psicadélico Barbarella, que dava título ao single, com D. João, um tema cuja letra tinha laivos de crítica social.

O Jimi Hendrix português

Desde cedo considerado um virtuoso da guitarra eléctrica e conhecido como “o Jimi Hendrix português” – só bastante tarde assumiria, no entanto, o nome de guerra Phil Mendrix, pelo qual é hoje mais conhecido –, Filipe Mendes esteve envolvido na fundação de várias bandas, mas também passou por muitas outras como músico convidado.

Ainda no final dos anos 60 colaborou com o grupo Fluido, de Paulo de Carvalho, que se estreou em 1969 com o EP A Idade dos Lilases, e também com o Grupo 5, do Porto, que lançou três discos entre 1968 e 1970. Em 1971 criou a Heavy Band com o vocalista Fernando Girão, o baixista Zé Nabo e o baterista João Heitor. O grupo editou dois singles em 1972, Beggar man e Your new motel, este último um ambicioso tema de rock progressivo em cinco andamentos que ocupava os dois lados do disco. 

No ano anterior, em 1971, Filipe Mendes ressuscitara efemeramente os Chinchilas, em versão trio, para participar (à borla) na mítica edição do festival de Vilar de Mouros, cujo cartaz incluiu Elton John e Manfred Mann.

Após o 25 de Abril envolve-se na recuperação de um grupo dos anos 60, os Psico, de Tony Moura, com quem grava o single AI’s, e funda depois com António Garcez e Zé Castro uma das mais apreciadas bandas portuguesas da década, os Roxigénio, que lançam o seu disco epónimo de estreia em 1980. É com os Roxigénio que regressa ao palco do festival Vilar de Mouros para actuar na não menos lendária edição de 1982, ao lado de grupos como os Echo & the Bunymen, The Stranglers ou U2.

A partir dos anos 90 associa-se aos Ena Pá 2000 e a outras bandas de Manuel João Vieira, como Irmãos Catita ou Corações de Atum. É neste período que a velha alcunha informal de “Jimi Hendrix português” se transforma no nome artístico Phil Mendrix.

Nos últimos anos, o guitarrista criou ainda a Phil Mendrix Band, tocou regularmente com Os Charruas, uma banda sobrevivente dos anos 60, e, fechando um círculo que começara a ser traçado quase 50 anos antes, ressuscitou, com Vítor Mamede, José Machado e João Maló, Os Chinchilas, que estrearam a sua nova vida com um concerto no Ritz Club, em Lisboa, em Julho de 2012.

O corpo de Filipe Mendes estará em câmara ardente na Capela de Santa Maria do Mosteiro dos Jerónimos, em Lisboa, a partir das 15h de terça-feira. O funeral está marcado para quarta-feira, dia 15, com missa de corpo presente às 14h e saída para o Cemitério dos Prazeres uma hora depois.

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