Reedição de Sempre leva o balanço do jazz às ruas do Chiado

Este sábado há jazz à porta dos Armazéns do Chiado, em Lisboa, com Carlos Martins, João Paulo Esteves da Silva, Mário Delgado, Carlos Barretto e Alexandre Frazão. O pretexto é a reedição em vinil do disco Sempre, 20 anos depois, homenageando agora um dos seus músicos, Bernardo Sassetti (1970-2012).

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Os músicos de Sempre, em 1999: João Paulo Esteves da Silva, Alexandre Frazão, Carlos Martins, Carlos Barretto, Bernardo Sassetti e Mário Delgado LUÍSA FERREIRA

Em 1999, um disco trouxe para o jazz várias canções de cantautores portugueses. Chamou-se Sempre, trazia na capa o nome de Carlos Martins, e para além dele (no saxofone), contava com uma equipa de peso: Bernardo Sassetti (piano), João Paulo Esteves da Silva (piano), Alexandre Frazão (bateria), Carlos Barretto (contrabaixo), Mário Delgado (guitarra), Miguel Gonçalves (trompete e fluegelhorn), João Ferreira (percussão) e Daniel Belo (voz). Vinte anos passados, este mesmo disco foi remasterizado e reeditado em vinil e, no dia do seu lançamento, sábado, vai ser apresentado ao vivo à porta dos Armazéns do Chiado, em Lisboa, com Carlos Martins, João Paulo Esteves da Silva, Mário Delgado, Carlos Barretto e Alexandre Frazão. Bernardo Sassetti (1970-2012), autor de dois dos arranjos originais, será ali homenageado.

Carlos Martins, que esteve na origem do projecto, recorda ao PÚBLICO como tudo começou: “Havia uma coisa que me inquietava um pouco: o facto de haver música fantástica, feita por cantautores, em que os músicos de jazz não pegavam; e, paralelamente, haver cantautores que usavam músicos de jazz nos seus arranjos e concertos sem que isso fosse reconhecido. O trabalho desses músicos veio enriquecer mais a música portuguesa. Houve sonoridades que aconteceram por influência dos músicos de jazz.” E vice-versa, com resultados positivos.

“Uma luta de civilização”

O título, Sempre, pode ser visto como uma sugestão abreviada da habitual palavra de ordem “25 de Abril, sempre!”, que ano após ano se repete nas manifestações comemorativas. Mas Carlos Martins quis dar-lhe ainda outro sentido: “Quis acentuar uma ligação à revolução, mais nas questões que ultrapassam os dias, as ideias e algum seguidismo dos tempos históricos; e dizer que aquilo em que estávamos a trabalhar, as questões ligadas à liberdade, ao combate a preconceitos raciais, homofóbicos e outros, era uma luta de sempre, uma luta humana, de civilização. Por isso quis associá-lo ao 25 de Abril mas também a esse lado de transformação.”

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Capa da reedição em vinil

O disco em vinil teve de reduzir para 10 os 11 temas originais, por estritas razões técnicas (o espaço de gravação). No entanto, a canção que fica de fora desta edição (E depois do adeus, que Paulo de Carvalho levou ao Festival da Canção de 1974 e viria a ser uma das senhas do 25 de Abril), entra na edição que será distribuída e vendida através das plataformas digitais.

No LP que agora chega às lojas, a ordem dos temas é a seguinte: lado A, Revolução Romântica/ Grândola Vila Morena (Carlos Martins/ José Afonso), Caramba (Sérgio Godinho), Estrela do Mar (Jorge Palma), Rosalinda (Fausto Bordalo Dias) e Pedra Filosofal (Manuel Freire); no lado B, Maio Maduro Maio (José Afonso), Ana II (Vitorino Salomé), Tardes de Casablanca (Janita Salomé), Jaula de Néon (Carlos Martins/ Al Berto) e Mariazinha (José Mário Branco). Os arranjos são, na sua maioria, de Carlos Martins, excepto os de Caramba (João Paulo Esteves da Silva), Rosalinda e Ana II (Bernardo Sassetti) e Tardes de Casablanca (Mário Delgado). A masterização foi feita por Rui Dias e as fotos são de Luísa Ferreira (as de 1999) e Vitorino Coragem (em 2019).

Mais lento, com mais balanço

O uso do espaço frente aos Armazéns do Chiado costuma ser habitual para lançamento de projectos associados à música portuguesa, pop ou rock, mas jazz não. Será, diz Carlos Martins, “a primeira vez que acontece, segundo julgo.” Os arranjos originais de Bernardo Sassetti serão mantidos, em sua memória. “São dois arranjos brilhantes, que revelam não só o extraordinário músico e arranjador que ele já era, nessa altura, mas o anúncio óbvio do grande músico e da grande pessoa que continuaria a ser. Aproveito todas as oportunidades para lembrar, não de uma maneira demasiado sentimental mas lúcida, como ele foi tão essencial na nossa vida.”

Para prepararem o concerto de sábado, os cinco músicos decidiram ouvir as versões de 1999, mas só depois de começarem a tocar primeiro. E notaram uma curiosa diferença. “As coisas rápidas estão ligeiramente mais lentas. Isto tem a ver com a urgência com que se abordava a música à época e com a maturidade dos músicos hoje, com a não-necessidade de correr. Na altura, tocar rápido era uma coisa essencial, para mostrar que se tinha dedos, que se tinha voz. Agora não. A música está lá, mas tem mais balanço do que tinha há 20 anos.”

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