Portugal derrubou “muro” uruguaio e está nos “oitavos” do Mundial

A sina portuguesa é a de sofrer. Arranjar bilhetes “caros” em play-offs desnecessários, ter matemática complexa… No Qatar, porém, não é assim. Ao segundo jogo, Portugal tem o problema resolvido.

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Reuters/LEE SMITH

Quando se ouve, no Qatar, o refrão de “A Minha Casinha”, dos Xutos e Pontapés, é porque algo está, provavelmente, a ser bem feito pelos portugueses. Quando se ouve esse refrão três vezes então não há dúvidas: é porque está tudo como deve estar - neste caso, com Portugal nos oitavos-de-final do Mundial 2022.

O Uruguai quis pouco deste jogo da 2.ª jornada, muito pouco. Portugal, por outro lado, quis mais - e, mesmo não querendo de forma perfeita, quis melhor. E é por isso que já está nos oitavos, com um triunfo por 2-0, nesta segunda-feira, frente à selecção sul-americana.

Habitualmente, a sina portuguesa é a de sofrer. Fazer contas, arranjar bilhetes “caros” em play-offs desnecessários, ter matemática complexa… No Qatar, porém, não tem sido assim. Ao segundo jogo, Portugal tem o problema resolvido, ficando a faltar decidir quem acaba em primeiro lugar no grupo.

Mas é bom que Portugal não enjeite, com a Coreia do Sul, a possibilidade de ficar nessa posição, já que se cruzará nos oitavos-de-final com o grupo do Brasil, que tem elevada probabilidade de terminar na liderança do seu grupo. E este Brasil não é para brincadeiras.

"O Uruguai ainda é mais aborrecido"

Tudo isto foi feito em Lusail, perante um estádio essencialmente de adeptos portugueses. Ou que se vestiam de portugueses. O mais correcto é dizer que havia muitas camisolas vermelhas da selecção nacional, que deixamos, assim, a premissa indesmentível.

Neste jogo, Portugal teve de derrubar um muro. O Uruguai montou uma equipa defensiva, com três “torres” na defesa, mais dois laterais, mais dois médios defensivos.

Para este jogo, Diego Alonso montou um 5x3x2 com uma defesa alta em vários períodos. A ideia poderia ser replicar o que correu bem ao Gana frente a Portugal, mas, sabendo que os centrais uruguaios não são rápidos, optou por ter um a mais, para dobras. Ofensivamente, o plano era... não ter plano.

Aos 25’, Cavani e Darwin, os dois avançados uruguaios, tinham tocado cinco vezes na bola e defendiam frequentemente a meio do próprio meio-campo. Na equipa portuguesa, até Diogo Costa, com nove, estava acima. De resto, os outros dez tinham todos acima de 17 toques na bola.

Esta curiosidade estatística atesta a forma como o Uruguai encarou a partida, mas não é um dado definitivo. Esse vem da forma até algo antiquada como Diego Alonso pediu a Giménez, o central pela direita, que fizesse uma marcação individual a João Félix, praticamente a campo inteiro. E o português, que começou a irritar-se, acabou por fugir ao uruguaio, obrigando-o a ir para zonas que não lhe são confortáveis. E Portugal até percebeu duas vezes onde estaria o “ouro”.

A ideia poderia passar por Félix arrastar Giménez para onde quisesse, que o uruguaio iria atrás dele, e depois Ronaldo ou Bruno Fernandes romperem pelo espaço deixado vazio por Giménez, expondo a fragilidade de Godín na defesa da profundidade.

Ronaldo fê-lo aos 15’, num movimento de fora para dentro, e repetiu aos 22’, acabando com cruzamento torto. De resto, este movimento não se viu mais, apesar de ser claramente uma via tremenda para criar perigo.

Portugal surgiu com William no lugar do lesionado Otávio e isso deixou a equipa com fluidez na posse, como o médio do Betis oferece sempre, mas refém de capacidade de ser mais criativa perto da área – faltou a William alguma predisposição para se chegar uns metros mais à frente, algo que possivelmente teve que ver com duas saídas rápidas de Valverde e Bentancur, que poderão ter deixado o médio receoso de ser exposto.

Também Ronaldo andou sempre muito longe da área, possivelmente para “fugir” aos centralões uruguaios que povoavam a zona central. E isso deixou várias vezes a selecção com possibilidades de cruzamento, mas sem ninguém para o receber.

Um jornalista australiano sentado na zona “portuguesa” da tribuna de imprensa disse-me, antes do jogo, que a Suíça é uma selecção aborrecida. Aos 35’, corrigiu a informação: “Eu disse que a Suíça era aborrecida? Desculpa, enganei-me. O Uruguai consegue ser pior”.

Esta ideia serve para mostrar o que estava a ser o jogo. Portugal atacava em “U”, quase como num jogo de andebol, e o Uruguai nada fazia, a não ser uma iniciativa individual de Bentancur, aos 32’, com Neves caído, que terminou com um ressalto a deixar o uruguaio isolado perante Diogo Costa, que salvou a selecção nacional.

Já perto do intervalo, Giménez conseguiu, finalmente, o abraço que queria: pôde abraçar Félix, que tinha agarrado uma bola que o uruguaio iria repor em jogo.

Ronaldo? Bruno? Portugal

Para a segunda parte Portugal não mudou nada nos jogadores, até porque já tinha feito uma alteração quando Nuno Mendes saiu lesionado e a chorar.

Mas mudou uma coisa: Ronaldo na área. O português começou a prestar-se a dar mais luta aos centrais, algo que teve significado aos 54’, quando Bruno Fernandes cruzou e Ronaldo tentou cabecear. Tocou-lhe? Não sabemos. Aparentemente não. E a FIFA diz o mesmo. 1-0, golo de Bruno Fernandes.

A partir daqui Portugal tinha o que queria: um resultado que iria obrigar o Uruguai a expor-se e um jogador no banco, como Leão, que seria leão a aproveitar esse espaço.

A equipa sul-americana já não tinha uma defesa a cinco, trocando Godín por De Arrascaeta, e Fernando Santos acabou por chamar Leão, montando um 4x3x3 com William, Fernandes e Bernardo no meio-campo, Félix na direita e Leão na esquerda.

O Uruguai pela primeira vez neste jogo estava a chegar-se à frente, não tanto pelo engenho técnico ou táctico, mas pelo número de jogadores que tinha na frente. E a isso ajudava a forma como Portugal estava a deixar o jogo partir, mostrando-se sofrível na recuperação defensiva.

O Uruguai esteve três vezes perto do golo em seis minutos e ficou visível a forma como Portugal voltou a permitir com relativa facilidade que o adversário crie oportunidades de golo. Solução? Chamar os “tanques” – Palhinha e Matheus Nunes vieram dar a capacidade física e frescura que pareciam faltar ao meio-campo e a equipa estabilizou.

O Uruguai não mais conseguiu jogar e Bruno Fernandes ainda conseguiu, já perto do final, fazer o 2-0, num penálti visto pelo VAR. O resultado sugere tranquilidade, mas Portugal voltou a sofrer.

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