Comissão propõe instrumento para responder a “tácticas intimidatórias” de parceiros comerciais

Bruxelas quer poder retaliar de forma mais célere e assertiva quando for confrontada com restrições e outras medidas de carácter comercial que têm como objectivo a alteração de políticas da UE.

Foto
EPA/OLIVIER HOSLET

Bruxelas quer aumentar a sua margem de manobra para reagir mais rapidamente e de forma mais assertiva às “tácticas intimidatórias” dos seus parceiros comerciais, através da imposição de sanções económicas que poderão ser aplicadas sem a necessidade de um voto por unanimidade dos Estados-membros no Conselho da União Europeia (UE), como no caso das medidas punitivas adoptadas no quadro da política externa.

“Num período de tensões geopolíticas crescentes, o comércio está cada vez mais a ser utilizado como uma arma para intimidar a UE e os seus Estados-membros. Precisamos de ter as ferramentas adequadas para agir e responder quando isso for necessário”, defendeu o vice-presidente executivo da Comissão Europeia, Valdis Dombrovskis, responsável pela pasta do Comércio.

A Comissão Europeia aprovou esta quarta-feira uma proposta para o estabelecimento de um “novo e poderoso instrumento comercial” para responder à coerção económica de países terceiros, ao abrigo do qual poderá aplicar medidas retaliatórias que podem ser a restrição de tarifas preferenciais, mas também de serviços e investimentos, ou a imposição de direitos aduaneiros, e ainda a exclusão da participação em concursos públicos internacionais ou programas financiados pela UE.

“Não aceitaremos tácitas intimidatórias e não hesitaremos em responder quando sob ameaça para proteger os nossos interesses, direitos e valores”, garantiu o vice-presidente executivo da Comissão, sublinhando que o instrumento anti-coerção é defensivo e preventivo, e de natureza essencialmente dissuasora.

Só na eventualidade de não ser possível, através do diálogo e da mediação, resolver uma situação identificada como coerção económica, é que a UE aplicará contra-medidas direccionadas (contra indivíduos, empresas ou estados), que “serão equilibradas, proporcionais e no âmbito da lei internacional”, acrescentou.

Segundo explicou Dombrovskis, o novo mecanismo foi desenhado para responder a situações em que um país terceiro procura utilizar os fluxos comerciais de e para a UE, por exemplo através de restrições das importações, controlos selectivos nas fronteiras ou boicotes de mercadorias, como arma de pressão, para que o bloco altere certas acções ou políticas.

Para responder aos conflitos comerciais “clássicos”, quando por exemplo um parceiro recorre ao “dumping” ou outras práticas que penalizam a posição concorrencial da UE, Bruxelas continuará a recorrer à Organização Mundial de Comércio, distinguiu.

Apesar de insistir que a proposta legislativa da Comissão foi “cuidadosamente calibrada” para não apontar para nenhum parceiro comercial em particular, Dombrovskis admitiu, em resposta a perguntas dos jornalistas, que a China e a Rússia seriam candidatas à aplicação de contra-medidas na sequência de duas acções recentes dos respectivos governos.

Com este mecanismo em vigor, Bruxelas poderia responder à decisão de Pequim de travar as importações da Lituânia e restringir as suas exportações para o país, por causa da decisão do governo de Vilnius de autorizar a abertura de uma representação de Taiwan.

“As situações em que um país terceiro está a restringir ou a ameaçar restringir o abastecimento de gás com o objectivo de influenciar as decisões políticas da UE também se qualificam para o uso do instrumento anti-coerção”, confirmou.

A proposta do executivo foi muito bem recebida pelos co-legisladores do Parlamento Europeu, que há bastante tempo exigiam a criação de um mecanismo de defesa que permitisse ao bloco ripostar ao primeiro salvo de uma possível guerra comercial.

Porém, vários Estados-membros exprimiram reservas e dúvidas sobre este tipo de instrumentos, que têm óbvias implicações em termos de política externa e podem acabar por promover o proteccionismo. Segundo Dombrovskis, a França, que assumirá a presidência do Conselho da UE em Janeiro de 2022, manifestou um “forte apoio” proposta do executivo.

Sugerir correcção
Ler 2 comentários