Entrega do IRS: há quem deduza 296 euros de juros e quem deduza zero euros

Alguns contribuintes com crédito à habitação podem reaver até 296 euros, outros não conseguem deduzir qualquer valor. Diferença decorre da lei. Prazo para apresentar declarações arranca a 1 de Abril.

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O prazo para entregar o IRS decorre de 1 de Abril a 30 de Junho Nuno Ferreira Santos

A entrega das declarações de rendimento de 2022 começa este sábado e, neste ano de maior aperto financeiro para muitos cidadãos, a expectativa é grande em relação ao reembolso do IRS a receber. O cálculo final do IRS ditará se um contribuinte ainda terá alguma parcela de imposto a entregar ao Estado, se tem direito a um reembolso ou se nada há a dever nem a receber.

Deduções distintas

Com a declaração dos rendimentos auferidos ao longo de 2022, chega também o momento de fazer a conta às deduções à colecta que permitem diminuir a factura fiscal a pagar ao Estado. E este ano, fruto do agravamento dos juros dos empréstimos bancários que se fez sentir a partir do Verão passado, há um tipo de deduções à colecta do IRS que assume uma maior importância para uma parte dos contribuintes que viram os empréstimos ser revistos entre o Verão e o final de 2022: a dedução dos encargos com imóveis.

Alguns contribuintes com contratos de crédito à habitação própria e permanente poderão deduzir à colecta do IRS (ou seja, subtrair ao valor do imposto a pagar) até 296 euros de juros. Outros, mesmo podendo estar em igualdade de circunstâncias do ponto de vista da situação económica, contributiva e familiar, não conseguirão deduzir qualquer valor.

A explicação está na lei. De acordo com o Código do IRS, só os contribuintes com contratos celebrados até 31 de Dezembro de 2011 podem deduzir os juros dos empréstimos (15% do valor, com um limite anual de 296 euros). Mas para os empréstimos contraídos desde 1 de Janeiro de 2012 não há qualquer dedução.

Este tratamento diferencial entre cidadãos decorre meramente da data da celebração do contrato. A distinção foi decidida no tempo da troika e mantém-se até hoje — e agora que os juros estão mais altos o problema torna-se mais visível. Se nos últimos anos alguns contribuintes com contratos recentes poderiam nem dar conta da existência desta diferença porque os juros estavam baixos, agora que o esforço no orçamento familiar para pagar o empréstimo é maior, o facto de não poderem deduzir qualquer parcela agiganta o problema.

Existe um incentivo fiscal para uns contribuintes, mas não existe para outros: por exemplo, quem contraiu um empréstimo em 2004, 2008, 2009, 2010 ou 2011 pode deduzir até ao tal limite dos 296 euros; já quem contraiu em 2012, 2014, 2018, 2020 ou 2022 (em qualquer data depois de 31 de Dezembro de 2011) não tem qualquer benefício fiscal.

No Parlamento, alguns partidos da oposição tentaram acabar com a diferença durante a discussão do Orçamento do Estado para 2023, mas o PS chumbou as várias iniciativas — do PSD, Livre, Iniciativa Liberal e Chega (se alguma tivesse sido aprovada, a mudança iria sentir-se no IRS a declarar em 2024, relativo aos rendimentos deste ano).

Os únicos contribuintes sem possibilidade de dedução são os novos proprietários dos últimos 11 anos. Porque, além dos anteriores a estes, também os contribuintes que sejam inquilinos podem deduzir no IRS 15% das rendas (com um tecto de 502 euros, que sobe para mil se uma pessoa tiver mudado a residência recentemente para um concelho do interior; com com um limite de 296 euros se estiver em causa um contrato celebrado até 31 de Dezembro de 2011).

Prazo igual

O prazo de entrega estende-se até 30 de Junho e é o mesmo para todas as categorias de rendimento, dos trabalhadores dependentes aos pensionistas, passando por quem acumula trabalho por conta de outrem com trabalho por conta própria, por quem trabalha a recibos verdes ou tem a declarar rendimentos prediais e de capitais.

Declaração automática

Os contribuintes podem optar por entregar o IRS através da funcionalidade do IRS Automático caso reúnam os requisitos legais ou podem entregar a declaração “nos termos gerais”. Se uma pessoa for abrangida, o Portal das Finanças indica-o; caso contrário, o site informa que a pessoa não reúne as condições.

O automatismo já se aplica quer aos trabalhadores dependentes e pensionistas, quer aos trabalhadores independentes, desde que cumpram uma série de condições (por exemplo, se exercerem uma das actividades da tabela do IRS dos profissionais liberais). De fora fica, no entanto, quem esteja registado com o código 1519, de “outros prestadores de serviços”.

Há casos em que o IRS Automático não se aplica, por exemplo se o contribuinte usufruir de benefícios fiscais, com excepção dos que se referem aos valores aplicados em Planos de Poupança-Reforma (PPR) e aos donativos no âmbito do regime fiscal do mecenato. O site da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) explica estas questões na área da entrega da declaração.

Para entregar a declaração automática, o contribuinte deve consultar o documento provisório e a demonstração da pré-liquidação, aceita-o assinalando “Li e entendi as condições” e, a partir daí, a declaração converte-se em definitiva e é dada como entregue.

Declaração de substituição

Se um contribuinte verificar que a informação apresentada não está certa, pode entregar a declaração pela via normal, ou seja, não aceita a declaração proposta. Se nada fizer até ao fim do prazo da entrega (30 de Junho) e se reunir as condições de acesso ao IRS Automático, a AT converte essa declaração em definitiva e dá-a como entregue. Ainda assim, um contribuinte pode sempre apresentar uma declaração de substituição nos 30 dias seguintes à liquidação sem ser penalizado.

Declarar despesas à mão

A apresentação pela via normal permite aos contribuintes indicar eventuais despesas que estejam em falta. Mesmo nesta modalidade, a AT já apresenta uma série de informações pré-preenchidas. As despesas gerais e familiares, e as deduções do IVA pela exigência de factura, aparecem registadas automaticamente e, nesta fase, já não é possível indicá-las à mão (a fase para reclamar das despesas já acabou).

No entanto, é preciso fazê-lo para outras categorias. As despesas de saúde, educação, encargos com imóveis e despesas com lares do agregado familiar também aparecem automaticamente, mas em relação a este leque de gastos a lei permite o preenchimento nesta fase (com algumas excepções). Para isso, é preciso acrescentar ou corrigir a informação no quadro 6C1 do anexo H. O Portal das Finanças explica de forma sucinta que passos deve um contribuinte dar.

Entrega separada

Um casal que viva em união de facto ou que esteja casado pode entregar o IRS separadamente ou em conjunto. A regra é a entrega separada, por isso, se pretendem declarar os rendimentos em conjunto por ser uma opção mais vantajosa economicamente, os dois elementos do casal têm de exercer a opção na declaração de IRS. Mesmo no IRS Automático é possível seleccionar uma das duas. Na tributação conjunta, os dois elementos devem “autenticar-se para visualizar as declarações provisórias de ambos e a declaração provisória conjunta”, refere a AT num folheto publicado no site.

Confirmar o IBAN

No momento da entrega, mesmo com o IRS Automático, um contribuinte pode confirmar ou alterar o código de identificação bancária (IBAN) da conta onde pretende receber o eventual reembolso do IRS a que tenha direito. A pessoa pode “indicar se pretende que a AT associe o IBAN aos seus dados de identificação do NIF, caso ainda não esteja, para utilização em pagamentos de reembolsos e restituições a efectuar pela AT”, refere o fisco.

Consignar o IRS

Antes de confirmar a declaração, os contribuintes podem consignar 0,5% do IRS pago ao Estado a uma instituição ou associações de solidariedade social, religiosa, assistência humanitária ou de actividade cultural que conste da lista oficial apresentada pela AT. Se pretenderem, podem também abdicar da dedução do IVA das facturas consignando adicionalmente essa parcela à mesma entidade.

Esperar pelo reembolso

O Ministério das Finanças não divulgou, até agora, uma previsão do número médio de dias para o pagamento dos reembolsos do IRS. No ano passado, a projecção era de 17 dias (e de 12 para quem submete pelo IRS Automático).

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