Críticas à capa da Vogue portuguesa incendeiam redes sociais e chegam à imprensa britânica

Número dedicado à loucura é de “muito mau gosto”, diz Sara Sampaio. “Estão a julgar o livro pela capa”, responde a directora da edição portuguesa da revista de luxo.

cultura,saude-mental,moda,artes,saude,doencas,
Fotogaleria
Com um Verão atípico por causa da pandemia, o director criativo José Santana imaginou uma praia na cidade Vogue Portugal
cultura,saude-mental,moda,artes,saude,doencas,
Fotogaleria
Com o título "Madness", loucura, a capa simboliza a doença mental Vogue Portugal
cultura,saude-mental,moda,artes,saude,doencas,
Fotogaleria
Capa que representa a loucura que se pode fazer por amor Vogue Portugal
cultura,saude-mental,moda,artes,saude,doencas,
Fotogaleria
Uma evocação a Alice no País das Maravilhas e ao surrealismo, interpreta Sofia Lucas, directora da Vogue Portugal Vogue Portugal

A Vogue Portugal propõe quatro capas aos leitores e a edição, que vai para as bancas no próximo dia 10, desta vez é dedicada à loucura, a vários tipos de loucura. Madness é a palavra comum às quatro versões, mas é uma delas que está a suscitar críticas nas redes sociais, aquela em que a modelo Simona Kirchnerova está dentro de uma banheira, ladeada por duas enfermeiras que lhe dão banho. A capa representará a saúde mental, mas este é um tema que não deve ser tratado com leveza, dizem as vozes mais críticas, citadas pelo Guardian. Ao PÚBLICO, a directora da edição portuguesa da revista internacional, Sofia Lucas, reage: “Estão a julgar o livro pela capa.”

A responsável acredita que tudo terá começado depois de a revista ter publicado as quatro capas na sua conta de Instagram e de a modelo Sara Sampaio ter comentado a fotografia de Simona Kirchnerova, considerando-a de “muito mau gosto”. “Este tipo de fotos não deveria estar a representar a conversa sobre saúde mental! Acho de muito mau gosto!”, escreve a modelo portuguesa. O seu comentário tem quase dois mil gostos. Este terá “espoletado o rastilho”, aponta Sofia Lucas. “É normal as pessoas reagirem. Ironicamente, um dos temas da revista é também sobre os comportamentos nas redes sociais”, acrescenta o director criativo José Santana, ao PÚBLICO. “Trata-se de um julgamento precipitado porque as capas são polémicas mas ainda ninguém leu os temas. Abordamos temas importantes”, aponta Sofia Lucas. “Falamos da loucura destes tempos”, completa José Santana — nas legendas das capas (em cima) estão as ideias que levaram ao produto final.

Quanto à capa que está na origem da polémica, José Santana defende que não há nada de ofensivo na imagem. A personagem principal está a ser cuidada por duas enfermeiras que, no caso, são a mãe e a avó da modelo — refere a própria na sua conta de Instagram, considerando esta imagem o ponto mais alto da sua carreira —, num hospital psiquiátrico em Bratislava. O acto de dar banho é feito com carinho e cuidado, continua José Santana. Se a imagem parece sombria é porque o assunto o é, refere um comunicado que a Vogue enviou ao Guardian. A imagem é também uma homenagem aos doentes e aos profissionais de saúde. “Também queremos trazer para o debate as instituições, a ciência e as áreas que hoje lidam com a doença mental”, acrescenta o mesmo texto. 

Sofia Lucas lembra que vivemos tempos em que a “loucura tomou conta de nós”. No mesmo comunicado, a direcção da Vogue enumera algumas das questões que contribuem como o confinamento por causa da covid-19, a limitação da liberdade dos cidadãos, a “raiva e o ódio que são visíveis nas redes sociais e que são aumentados ao extremo”. É “um novo mundo de loucura”. Para os artigos foram ouvidos psiquiatras, sociólogos, psicólogos e diferentes especialistas em áreas relevantes, enumera Sara Andrade, da redacção da revista ao PÚBLICO.

Se houve uma reacção negativa, a Vogue também recebeu muitos elogios. Aliás, Sofia Lucas diz que é maior o número de pessoas que elogia a revista por ter focado este tema. “Trazer um assunto como este para a discussão nunca pode ser feito de maneira leve, porque o assunto em si não é leve. Sabíamos que esse seria um tópico que não geraria consenso, e estávamos cientes disso. Mas não é possível aumentar a consciencialização e esclarecer assuntos importantes sem dividir opiniões. Não há imagem ideal para ilustrar um tema como este — é por isso que não há apenas uma capa”, diz o comunicado.

Nenhuma imagem seria consensual, reforça José Santana. “Como director criativo preocupa-me a liberdade artística ser atacada, porque parece que não se pode tocar em nenhum assunto”, lamenta. Na verdade, nenhuma imagem é consensual e a Vogue tem tido, ao longo do tempo, muitas capas que podem incomodar. O responsável lembra a da edição de Abril, a que chamaram Freedom on Hold, onde dois modelos se beijam com máscaras postas. 

Sugerir correcção