Democratas dizem que Trump agiu como “chefe de máfia” ao perdoar pena de Roger Stone

O amigo e antigo conselheiro de campanha do Presidente dos EUA tinha sido condenado a 40 meses de prisão por mentir ao Congresso, manipular testemunhas e obstruir as investigações à interferência russa nas eleiçoes de 2016.

donald-trump,eua,mundo,justica,america,russia,
Fotogaleria
LUSA/ERIK S. LESSER
donald-trump,eua,mundo,justica,america,russia,
Fotogaleria
Reuters/KEVIN LAMARQUE

A decisão de Donald Trump em perdoar a pena de prisão do seu amigo e antigo conselheiro Roger Stone não foi bem recebida pelos democratas. O Presidente dos Estados Unidos foi acusado pelos democratas de agir como “chefe de máfia”, de atacar o Estado de Direito, de abusar de poder, de gozar com a democracia americana e de ser o chefe de Estado mais corrupto que o país já teve. 

“O que estamos a ver hoje é uma mudança assustadora. O Presidente está a dizer: ‘Se mentires por mim, se me cobrires, vou-te recompensar. Por outro lado, se fores um rato e cooperares, irei atrás de ti'”, disse na MSNBC congressista democrata Adam Schiff, que liderou parte das audiências de impeachment, salientando que Trump agiu como “chefe de máfia”.

O republicano Mitt Romney, ex-candidato presidencial, não poupou também as críticas. “É uma corrupção histórica, sem precedentes. Um Presidente americano comuta a pena de uma pessoa condenada por um júri de ter mentido para proteger esse mesmo Presidente”, afirmou no Twitter.

A senadora Elizabeth Warren também não perdeu a oportunidade de criticar duramente o Presidente. “Donald Trump abandonou o Estado de direito e fez pouco da nossa democracia. É verdadeiramente o Presidente mais corrupto da História”, escreveu. 

“Olhem apenas para esta Administração. Este Presidente e os seus homens. Tantos amigos, conselheiros, membros da campanha, etc, na cadeia e é ridículo o Presidente poder emitir perdão na base de uma crime que a pessoa cometeu o ajudou”, reagiu na CNN a democrata Nancy Pelosi, líder da Câmara dos Representantes

Trump comutou a pena de Roger Stone, seu amigo há mais de 40 anos e antigo conselheiro, na sexta-feira à noite, poucos dias antes de este ter de se entregar numa prisão federal para cumprir 40 meses de pena o seu pedido para não se entregar, por causa da pandemia de covid-19, tinha sido poucas horas antes recusado por um tribunal. 

Stone foi condenado, em Novembro de 2019, por mentir ao Congresso, manipular testemunhas e obstruir as investigações sobre a interferência russa nas presidenciais de 2016 e o perdão da pena não reverte a condenação – já disse que vai continuar a lutar nos tribunais.

Stone, que desde a década de 1960 é um consultor político, conhecido pelos truques baixos, garantiu que documentos roubados dos servidores do Partido Democrata fossem divulgados durante a campanha eleitoral, tendo contactado um alegado “intermediário” da WikiLeaks de Julian Assange

“Roger Stone é uma vítima do embuste da Rússia e da esquerda e seus aliados nos media que há anos tentam prejudicar a presidência Trump”, disse Kayleigh McEnany, secretária de Imprensa da Casa Branca, ao comunicar a comutação da pena. “Nunca houve conluio entre a campanha de Trump, ou o Governo Trump, com a Rússia”. 

O longo comunicado não defende a inocência do antigo conselheiro nos crimes pelos quais foi condenado, salienta o New York Times. Ao invés, limita-se a denunciar mais uma vez os “procuradores demasiado zelosos” e uma suposta “caça às bruxas” e “embuste da Rússia”. Trump já sugeriu que poderá vir a comutar as penas de outros condenados no âmbito das investigações da interferência russa. 

Além de Roger Stone, Paul Manafort, antigo director da campanha de Trump, Ric Gates, adjunto de Manafort, Michael Flynn, antigo conselheiro de Segurança Nacional, Michal Cohen, antigo advogado pessoal de Trump, e George Papadopoulos, antigo assessor, foram condenados pela Justiça. No caso de Flynn, o Departamento de Justiça pretende retirar o caso contra ele.

Há meses que Stone e seus próximos faziam lobby junto da Administração para o Presidente evitar que cumprisse pena e, ainda na semana passada, uma dessas pessoas, Michael Caputo, apareceu no programa de Tucker Carlson, na Fox News e a que Trump assiste religiosamente, a defendê-lo. Mas, por outro lado, também havia a preocupação, entre os conselheiros mais próximos do chefe de Estado, de que um perdão desse munições aos democratas em ano de presidenciais. 

“Ele [Trump] sabe que eu estava sob imensa pressão para o entregar”, disse na sexta-feira Stone ao jornalista Howard Fineman, que publicou a conversa numa coluna de opinião no Washington Post. “Teria facilitado consideravelmente a minha situação. Mas não o fiz”.

Numa outra entrevista, desta vez na Fox News, Stone caracterizou-se a si próprio como dano colateral na guerra do “Estado profundo” contra Trump ao dizer que “as pessoas que estão a tentar destruir Michael Flynn, estão agora a tentar destruir-me”. 

A Constituição dá poder ao Presidente para decretar perdões e comutações de penas, mas a actuação de Trump difere de todos os seus antecessores ao usá-lo para evitar que pessoas próximas de si, seja profissional ou ideologicamente, ou até por proveito próprio, cumpram penas de prisão. Até ao momento, Trump comutou a pena a dez pessoas, enquanto, por exemplo, Barack Obama fê-lo a 1715. 

Na lista das dez pessoas, incluem-se, por exemplo, Joe Arpaio, xerife do Condado de Mariopa, no Arizona, acusado de desrespeitar uma ordem de tribunal por ter continuado a deter pessoas por causa da sua cor de pele, suspeitando serem imigrantes ilegais, e Conrad M. Black, antigo barão da imprensa e amigo de Trump condenado a 12 anos de prisão por fraude e obstrução de justiça. E Alice Johnson, afro-americana condenada a prisão perpétua por tráfico de droga, tendo sido depois transformada em rosto da campanha de Trump para apelar ao eleitorado afro-americano. 

Sugerir correcção