Giuliani quer falhar depoimento na Georgia por não poder viajar de avião, juiz recusa e sugere “comboio ou autocarro”

Advogado foi intimado a depor numa investigação sobre as pressões para reverter a vitória de Joe Biden na eleição presidencial de 2020. Como porta-voz de Donald Trump, Rudolph Giuliani promoveu queixas infundadas de fraude eleitoral junto do grande público e de congressistas republicanos.

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Rudolph Giuliani foi o porta-voz de Donald Trump nas queixas infundadas de fraude eleitoral em 2020 EPA/PETER FOLEY

O advogado norte-americano Rudolph Giuliani, antigo presidente da câmara de Nova Iorque e um dos mais próximos colaboradores de Donald Trump, vai ter de se deslocar ao estado da Georgia, na próxima semana, para depor num processo criminal sobre pressões para reverter o resultado da eleição presidencial de 2020. Giuliani, de 78 anos, disse ao juiz que não pode viajar de avião, por motivos de saúde, tendo recebido uma sugestão para se deslocar “de comboio, de autocarro, de Uber, ou de qualquer outro modo”.

A audição de Giuliani perante um grande júri estava marcada para a última terça-feira, mas os seus advogados pediram ao juiz que a sessão fosse adiada para meados de Setembro, com a justificação de que o advogado tem ordens médicas para não viajar de avião por causa de uma operação recente. Em alternativa, Giuliani propôs ser ouvido esta semana, por vídeo, ou então presencialmente, mas numa região mais perto da cidade de Nova Iorque.

“O sr. Giuliani não está apto a deslocar-se por via aérea, A-É-R-E-A”, disse o juiz Robert McBurney, da Georgia, na sua resposta ao pedido de adiamento para Setembro. “John Madden percorreu o país de autocarro, de estádio em estádio”, continuou o juiz, referindo-se ao famoso comentador de futebol americano, que morreu em Dezembro, e que era conhecido por ter pavor de viajar de avião.

“Temos de saber se o sr. Giuliani pode vir sem pôr em causa a sua recuperação, seja de comboio, de autocarro, de Uber, ou de qualquer outro modo. Nova Iorque não fica perto de Atlanta, mas também não é como viajar desde Fairbanks”, disse McBurney, referindo-se à cidade mais fria do Alasca.

Salientando que o depoimento presencial de Giuliani foi remarcado para quarta-feira da próxima semana, o juiz sugeriu que o advogado faça três paragens pelo caminho, para atenuar os efeitos de uma viagem de 1400 quilómetros e 14 horas de automóvel: “Conhece alguém em [Washington] D.C.? Podia passar lá a noite.”

Pressão “em vários estados"

O processo foi aberto pela procuradora Fani Willis, a responsável do Ministério Público no condado de Fulton. A peça central da investigação é o telefonema, revelado no início de Janeiro de 2021, em que o então Presidente dos EUA, Donald Trump, pediu ao secretário de estado da Georgia o republicano Brad Raffensperger ​para “encontrar 11.780” votos em seu nome, referindo-se à diferença que o separou de Joe Biden na derrota eleitoral de Novembro de 2020.

Nessa altura, os votos dos eleitores da Georgia já tinham sido contados por três vezes: primeiro, através da contagem automática das máquinas de voto; depois, numa recontagem feita à mão; e, por último, numa auditoria feita a pedido do secretário de estado. Nos três casos, a vantagem de Biden foi sempre superior a 10.000 votos, e não foi detectada nenhuma situação de fraude eleitoral que pudesse ter influenciado o resultado final.

Depois das três recontagens – e antes do telefonema de Trump para Raffensperger –, as queixas de fraude eleitoral promovidas pelo então Presidente dos EUA foram descartadas pelos tribunais, incluindo por vários juízes nomeados por Trump e pelo Supremo Tribunal dos EUA, e a vitória de Biden foi confirmada pela votação do Colégio Eleitoral.

Como advogado de Trump, Giuliani esteve na linha da frente das queixas de fraude eleitoral, dando a cara por essas acusações nos canais de televisão e em sessões com congressistas republicanos em vários estados.

Numa dessas sessões, na Georgia, Giuliani mostrou um vídeo que, segundo ele, provava a contagem de votos falsos a favor de Biden e longe do olhar dos responsáveis eleitorais – o que, a ser verdade, poderia levar os congressistas republicanos a tentarem anular o processo de certificação dos resultados.

Em poucas horas, o gabinete do secretário de estado da Georgia desmontou o vídeo e reafirmou que as autoridades não tinham detectado fraude em larga escala. Segundo a procuradora, Giuliani continuou a promover acusações cuja falsidade já tinha sido determinada, “como parte de um plano em vários estados, coordenado pela campanha eleitoral de Trump, para influenciar os resultados da eleição de Novembro de 2020”.

Pelo seu envolvimento na promoção de informações falsas no período pós-eleitoral, de Novembro de 2020 a Janeiro de 2021, Giuliani foi suspenso, em Junho de 2021, de exercer advocacia no estado de Nova Iorque.

Segundo o Supremo Tribunal de Nova Iorque, o advogado “fez declarações comprovadamente falsas e enganadoras aos tribunais, aos legisladores e ao grande público”, e a sua conduta configurava “uma ameaça premente ao interesse público”.

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