Agradeçam ao Bloco Central

Andámos umas semanas a discuti-lo e chegou pela porta dos fundos. Eis o Bloco Central, com os cumprimentos da sra. Merkel e do sr. Schulz.

É claro que o tema é quente — e ainda bem que o PSD o discutiu: 20 anos depois, faz sentido voltar a juntar os dois maiores partidos portugueses num Governo?

Até há dois anos, quando António Costa vibrou com Borgen e virou o sistema político português, o PSD não tinha qualquer razão para ter um trauma com o Bloco Central. Em 1983, quando Mota Pinto serviu de apoio a Mário Soares, serviu o país. Em 1985, quando Cavaco Silva rompeu o acordo, com a Europa à porta e o pior para trás das costas, serviu-se bem da ruptura - e abriu caminho a dez anos no poder.

Passaram 20 anos e, sim, António Costa virou as regras do jogo. Mas, é bom lembrar, o que aconteceu nas últimas legislativas é caso único na nossa democracia: o PSD foi o mais votado, mas a esquerda estava em maioria. Foi também um acaso: só por estarmos a sair de um resgate o PCP aceitaria abrir a janela do poder — e prescindir da luta na rua. 

É claro que há excelentes argumentos para recusar um Bloco Central: os grandes partidos devem servir de alternância no poder; a convivência dos dois num mesmo Governo potência o protesto — e a atractividade dos que se posicionam nos extremos. 

Que o digam Angela Merkel e, sobretudo, Martin Schulz. O líder do SPD passou toda uma campanha eleitoral na Alemanha a guardar distância da CDU e a jurar que nunca, em cenário algum, se juntaria a ela de novo num Governo (do último, o SPD saiu pior do que o PS de Almeida Santos). Chegaram os resultados e o discurso foi o mesmo: nem pensar numa grande coligação. Mas, sem surpresa, a alternativa era pior: se Merkel governasse com os liberais do FDP e com os Verdes, não teria uma Jamaica, teria uma salada russa, muito, muito longe da coerência a que chegou a nossa “geringonça”. 

Ontem, ao fim de 111 à espera de um novo Governo, Merkel e Shultz chegaram a um princípio de acordo para o regresso do Bloco Central na Alemanha. E não é por acaso que a Europa suspirou de alívio, nem foi por acaso que muitos líderes socialistas ligaram a Schulz pedindo-lhe que engolisse as suas promessas. É que sem governabilidade na Alemanha não há rumo para Europa, nem segurança na recuperação económica.

É por tudo isto que a discussão que o PSD abriu é importante. E é por isto que é de todo imprudente fechar portas que não sabemos se teremos que abrir - muito menos por puro despeito. Portugal, como a Europa, já não vive na idade das maiorias absolutas. Vive na era dos governos de concertação. Talvez António Costa lhes possa explicar que, às vezes, o pior cenário pode ser mesmo o único que sobra. Ou, vá, como o PSD é PPE, talvez possa pedir uma aula à sra Merkel.

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