“Eu não nasci feminista, nasci mulher numa sociedade machista. Sou filha da luta”, afirmava ao microfone uma das mais de 200 mulheres que estiveram presentes no Rossio, em Lisboa, no final da tarde desta quarta-feira, para celebrar o Dia da Mulher sob o mote “Não Me Calo”.

A manifestação, convocada pelo grupo de colectivos feministas Rede 8 de Março, marcou a participação simbólica de Portugal na Paralisação Internacional de Mulheres, uma greve que aconteceu em mais de 40 países esta quarta-feira.

Juliana Inácio, activista da Assembleia Feminista de Lisboa, um dos colectivos da Rede 8 de Março, justifica o mote do protesto em Portugal: “não me calo porque, mais do que nunca, estou a ser silenciada todos os dias.”

“Existe por parte do próprio Governo uma ideia pré-concebida de que a questão das mulheres está conseguida e que temos direitos todos iguais, o que não é real. Mais do que nunca, nós, mulheres de todo o mundo, estamos a sofrer o machismo”, afirma a activista.

A brasileira Renata Pretti, de 26 anos, fala sobre a condição das mulheres no seu país, onde têm acontecido várias manifestações desde 2015, no que já foi apelidado de “Primavera Feminista”. “No Brasil, talvez pelas contradições sociais serem mais... contraditórias, mais gritantes, o movimento feminista acaba por ser mais gritante. É uma verdadeira luta diária”, descreve a estudante do mestrado em Sociologia na Universidade de Lisboa.

“Aqui em Portugal o que me parece é que a situação é melhor do que o Brasil em termos de legislação, existe uma maior aceitação de questões relacionadas com a igualdade de género na sociedade portuguesa”, aponta a estudante, com o símbolo feminino pintado na face, que vive em Portugal há cinco meses.

Na manifestação "pela mãe e pela avó"

As colegas Rosa Ferreira e Diana Magalhães, estudantes da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, vieram do Seixal para protestar contra os abusos que sentem todos os dias. “Ser mulher é andar pela rua sem temer piadas machistas, erguer a cabeça e lutar pela igualdade”, lê-se no cartaz de Rosa, que lamenta não apenas o sexismo mas também o racismo que sofreu ao longo da vida.

“Às vezes sinto que as pessoas ainda me olham de lado, não só por ser mulher mas por ser negra. Na escola sentia que às vezes falavam comigo como se não fosse ter um futuro”, recorda a estudante de 19 anos, que afirma ter estado na manifestação pela sua mãe e pela sua avó, que a “ensinaram que tinha que lutar pelos direitos que ainda não tinha na prática”.

Também a amiga Diana - com o seu cartaz “Homens de qualidade não temem igualdade” - se queixa de falta de liberdade no espaço público: “Estamos sempre a ouvir piropos na rua, se estivermos de mini-saia, então, não conseguimos andar em paz”. “A primeira vez que me aconteceu foi quando tinha apenas 12 anos”, lamenta Rosa.

As celebrações do Dia Internacional da Mulher, organizadas pela Rede 8 de Março, não se ficam pela Paralisação Internacional de Mulheres. No sábado, está prevista uma marcha que reúne vários colectivos de Lisboa, com partida às 15h do Largo Camões.

E as reivindicações, garantem as organizadoras, não se vão ficar pelo Dia da Mulher. “O movimento feminista acordou em todo o mundo”, afirma Juliana Inácio. “O manifesto para esta greve é tão politicamente rico que não há como se esvaziar nesta manifestação. Não vamos parar por aqui”, garante a activista.