Milhares de professores estão contra multiplicação das grelhas de avaliação

Petição exige fim do projecto MAIA, que tem desembocado em grelhas de avaliação, por aluno, que “chegam a ocupar duas a três páginas A4 (na horizontal!)”.

Foto
Cerca de 8400 abaixo-assinados exigem o fim do projecto de avaliação MAIA Daniel Rocha

Com cerca de 8400 assinaturas, recolhidas em quatro dias, há mais uma petição lançada por professores que já ganhou direito a ser apreciada em plenário da Assembleia da República. O alvo é agora o chamado projecto MAIA - Monitorização, Acompanhamento e Investigação em Avaliação Pedagógica, que começou a ser aplicado nas escolas em 2019.

Segundo a descrição apresentada pelo Ministério da Educação (ME), este “projecto constitui-se como um esforço concertado a nível nacional” com o objectivo de criar “condições para que a avaliação pedagógica seja integrada nos processos de desenvolvimento curricular e, desse modo, se articule com o ensino e com aprendizagem”.

Mas de acordo com a professora de Matemática do 3.º ciclo e ensino secundário que lançou a petição, Dália Aparício, o projecto MAIA “reduz a educação e avaliação a um processo burocrático”. “O excesso de trabalho que este projecto trouxe à escola leva os professores a perderem a autonomia científica e pedagógica, e traduz-se em menos tempo disponível para os alunos e para a preparação das aulas”, especifica nas razões apontadas para solicitar o fim desta experiência e que, no essencial, se repetem, com mais ou menos pormenores, nas 34 páginas de comentários que, ao princípio da noite desta segunda-feira, acompanhavam a petição.

"Muito desânimo"

O projecto MAIA foi concebido pelo especialista em avaliação e actual presidente do Conselho Nacional da Educação, Domingos Fernandes, e acalentado pelo ministro João Costa para o desenvolvimento do programa de autonomia e flexibilidade curricular. Tem no centro a importância do feedback transmitido aos alunos sobre as suas aprendizagens.

Uma dimensão que é valorizada por vários subscritores da petição, mas que acaba por se traduzir em “muitas horas a mais” de trabalho para os professores, já que por cada aluno necessitam de preencher fichas com as lacunas detectadas e formas de as ultrapassar, alertam.

Além das fichas de feedback, também a avaliação em cada disciplina implica numerosos critérios como, por exemplo, compreensão, apropriação, rigor, clareza, raciocínio, comparação, entre outros. A estes critérios estão associados três níveis de qualidade de desempenho, sendo que para tudo isto é necessário o registo da apreciação do professor e das razões para a avaliação que fez.

“É um projecto que impõe uma metodologia de avaliação que se caracteriza por um número excessivo de avaliações parcelares e que implica a a elaboração de grelhas de observação e de avaliação extremamente extensas e complexas”, confirma Dália Aparício, professora na Escola Secundária de Viriato, em Viseu, que acrescenta uma visão precisa do que tal significa: “O professor tem de estar sistematicamente a avaliar e fazer registos de avaliação. As grelhas de avaliação de final de período são tão extensas que chegam a ocupar 2 a 3 páginas A4 (na horizontal!)”, confirmou ao PÚBLICO.

No último relatório de acompanhamento, elaborado pela equipa responsável pelo projecto, destaca-se que no âmbito dos “grupos focados” que reúnem participantes do projecto, foi destacado que este “estava a ter um impacto francamente positivo a vários níveis da vida pedagógica dos docentes e das escolas” e, sobretudo, que este tinha criado condições para apoiar fundamentadamente a sentida necessidade de que é preciso melhorar as práticas pedagógicas no sistema educativo português.

Dália Aparício contrapõe: tem sido causa de “muito desânimo”. Lembra que o projecto “começou por ser de adesão voluntária por parte das escolas, mas, na verdade, os professores que o põem em prática não o fazem de forma voluntária. Na maioria das escolas, não foram ouvidos. Aplicam o projecto sem acreditar nele. Daí o desânimo.”

Por outro lado, frisa, à semelhança do que tem sido apontado por vários professores, “é um projecto que quando aplicado inflaciona o sucesso e diminui o número de retenções, mas não melhora a aprendizagem dos alunos. Apenas encobre o insucesso e as grandes dificuldades de aprendizagem”.

O PÚBLICO solicitou ao ME um ponto de situação sobre o desenvolvimento do projecto MAIA, mas não obteve resposta.

Sugerir correcção
Ler 23 comentários