Número de casos de sarampo na Europa já ultrapassou total do ano passado. Portugal está alerta

Organização Mundial de Saúde alerta para situação “preocupante”. Portugal tem cobertura vacinal “tão elevada que não há condições para que o vírus se torne endémico”, diz directora-geral de Saúde.

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marco duarte

Pela primeira vez desde que a Comissão Regional para a Verificação da Eliminação do Sarampo e da Rubéola (RVC, na sigla inglesa) da Organização Mundial da Saúde (OMS) começou a trabalhar na Europa, em 2012, quatro países — Reino Unido, Grécia, Albânia e República Checa — perderam o estatuto de eliminação do sarampo.

A perda do estatuto significa que, em 2018, os países não foram capazes de controlar a tempo (têm um ano) o surgimento de novos surtos. As conclusões da RVC foram publicadas nesta quinta-feira. Em comunicado enviado às redacções, a OMS avisa que a Europa está a “perder terreno nos esforços pela eliminação do sarampo”. Esta avaliação foi feita com recurso aos dados de 2018. O cenário será ainda pior em 2019. Só na primeira metade do ano, já foram reportados cerca de 90.000 casos de sarampo nos 53 países que integram a região europeia da OMS. Mais do que o total registado em 2018 durante todo o ano (84.462).

A nível mundial, a situação também não é melhor. Na primeira metade do ano já foram registados cerca de 364.000 casos de sarampo em todas as regiões da OMS. “É o valor mundial mais elevado [para o período homólogo] desde 2006”, disse em conferência de imprensa Kate O’Brien, directora do departamento de imunização e vacinas da OMS.A responsável garante que “vamos continuar a ver um aumento a não ser que sejam tomadas acções significativas”.

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No caso dos países que perderam o estatuto de eliminação do sarampo, O’Brien diz que “têm coberturas vacinais extremamente altas e foi por isso que conseguiram alcançar a eliminação em primeiro lugar”. Contudo, lança o alerta: “Não basta conseguir e manter uma grande cobertura vacinal a nível nacional num cenário onde as importações [casos de sarampo que vêm de fora] ocorrem”, como mostra o exemplo destes países.

Dos 53 países analisados, há 35 que mantêm ou conquistaram (caso da Suíça e da Áustria) o estatuto de eliminação do sarampo — Portugal é um deles. Há ainda 12 países onde a doença é endémica. Já a Bélgica e o Cazaquistão interromperam a transmissão do sarampo há mais de 12 e 24 meses, respectivamente.

“A reemergência da transmissão do sarampo [em 2018] é preocupante. Se a alta cobertura vacinal não for alcançada e mantida em todas as comunidades, tanto as crianças como os adultos sofrerão de forma desnecessária e, tragicamente, alguns morrerão”, alerta em comunicado Günter Pfaff, presidente da RVC.

A avaliação da comissão de verificação da OMS — composta por um painel independente de especialistas que se reúne anualmente para avaliar o estatuto de eliminação do sarampo na Europa —, tem em conta relatórios relativos a 2018 submetidos por cada país. A comissão avalia os “dados de vigilância do sarampo, cobertura vacinal, resposta a surtos e o alcance de campanhas suplementares de imunização e outras actividades”.

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Portugal está alerta

A gravidade da situação já levou a OMS a declarar uma emergência de nível 2 para a infecção na Europa. Graça Freitas, directora-geral de Saúde, diz que é uma situação “extraordinária”. A responsável explica que este nível de alerta ajuda “a OMS a mobilizar recursos técnicos, humanos e financeiros — é um mecanismo interno da organização”, mas pouco habitual na Europa. “Não temos doenças infecciosas com esta magnitude.”

Em Portugal a situação é mais animadora: no primeiro semestre deste ano contaram-se 10 casos. Em 2018 foram 171. Além disso, Portugal mantém o estatuto de eliminação do sarampo desde 2015 e, apesar dos surtos pontuais desde o início dos anos 2000 que o número de novos casos é residual.

Mas há riscos. “Mesmo países como Portugal que não têm circulação endémica do vírus e que têm [cobertura de] vacinação tão elevada que não há condições para que o vírus se torne endémico, podem sempre ter surtos”, explica Graça Freitas. “Isso é uma preocupação.”

Para a responsável da Direcção-Geral da Saúde (DGS) “a capacidade de resposta é muito importante”. Nomeadamente, a “rapidez com que detectamos os casos e que tomamos medidas para não continuar” — os últimos surtos foram resolvidos em menos de dois meses, diz Graça Freitas. “O que aconteceu nalguns países é que a partir de pequenos surtos eles não foram contidos enquanto eram relativamente pequenos, expandiram-se e tornaram-se grandes surtos e epidemias.” 

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O facto de Portugal ter grande proximidade com o Reino Unido e com a República Checa, dois dos países em que a situação se agravou, “aumenta o risco”. Por outro lado, a Suíça “tomou grandes medidas e voltou a adquirir o estatuto de eliminação”. “É bom porque temos grandes ligações através dos emigrantes com a Suíça”, diz a directora-geral da Saúde.

E como é que se mantém o controlo da doença numa Europa onde proliferam novos casos? “Com muito trabalho, confiança nas pessoas, muita advocacia e muita comunicação a favor da vacinação”, refere a responsável pela DGS. “Temos mesmo de trabalhar sempre muito. É uma doença muito contagiosa e há sempre pequenas comunidades e pequenos grupos que não se vacinam.”

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