Empresas públicas já devem 450 milhões pelos swaps do Santander

Pagamento foi suspenso em 2013 e a dívida tem vindo a aumentar desde então. Governo mostra abertura para negociar com o banco no dia em que perdeu recurso no tribunal de Londres.

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sara matos

A dívida acumulada pelas empresas públicas desde que suspenderam o pagamento dos swaps do Santander já vai em cerca de 450 milhões de euros. Este montante, que vai aumentando a cada trimestre, terá de ser imediatamente pago pelo Estado se houver uma decisão definitiva favorável ao banco no processo que corre em Londres, acrescendo-lhe ainda juros de mora (em redor de 1%) e os custos com a acção judicial. Os restantes 1250 milhões terão de ser amortizados ao longo da vida dos contratos – embora estes ainda possam ser cancelados antecipadamente, com um impacto orçamental imediato.

O PÚBLICO apurou junto de fonte ligada ao processo que o valor em dívida aumentou perto de 60 milhões de euros entre o final do primeiro semestre e agora, fruto do não pagamento dos cupões associados aos swaps. Uma decisão que as quatro empresas públicas envolvidas neste braço-de-ferro (Metro de Lisboa, Carris, Metro do Porto e STCP) tomaram em Setembro de 2013, seguindo ordens de Maria Luís Albuquerque, ex-ministra das Finanças do anterior Governo PSD/CDS. Face aos valores que estavam em causa em Março quando os tribunais ingleses decidiram, na primeira instância, a favor do Santander, a diferença é de perto de 100 milhões, sendo que a maior fatia cabe à Metro de Lisboa.

Nessa decisão, o Estado foi condenado a ressarcir o banco destes valores em atraso, a que se somam juros de mora que rondam os cinco milhões de euros (e que vão crescendo à medida que a dívida aumenta). Além disso, teria de suportar parte dos custos do Santander com o processo judicial e ainda as despesas com assessores e advogados contratados pelas empresas. Neste campo, as contas são mais difíceis de fazer: sabe-se que a instituição financeira gastou mais de 35 milhões, mas os contratos celebrados pelas empresas deixaram de ser divulgados publicamente, como obrigatório por lei, a partir de Abril (até, lá, o valor já ia em mais de dez milhões).

O pagamento, porém, não foi feito, já que o Governo decidiu interpor recurso do acórdão do juiz William Blair. E, terça-feira, o tribunal voltou a dar razão ao Santander. O Ministério das Finanças explicou que irá recorrer desta nova decisão para o Supremo e, caso o pedido seja aceite, o desfecho deverá ser conhecido dentro de um mês. Até lá, vai aumentando o valor em dívida, os respectivos juros de mora e a factura com assessores e advogados de ambas as partes. Mas, no que diz respeito aos 450 milhões em atraso e, tendo em conta as garantias deixadas nos relatórios e contas, uma parte substancial do valor foi sendo provisionado pelas empresas, pelo que o impacto orçamental já está contabilizado. 

Hipóteses em aberto

Os montantes das perdas potenciais destes contratos, que foram celebrados para proteger o risco de variação das taxas de juros dos financiamentos mas que, em muitos casos, revelaram-se ruinosos para os cofres públicos, têm-se mantido estáveis nos últimos meses. O risco de prejuízo, que só se torna real quando os swaps chegarem ao fim, ronda neste momento 1250 milhões de euros – um valor muito próximo dos 1230 milhões registados em Junho, mas inferior aos 1350 milhões contabilizados aquando da primeira sentença judicial de Março.

Estas perdas só poderão materializar-se antes do final dos contratos se o Santander decidir seguir uma via mais extremada neste dossier, já que os tribunais ingleses declararam os contratos válidos, mas o Estado não está a cumprir os pagamentos. No entanto, o mais provável neste momento é que o banco espere pela decisão do novo recurso interposto agora pelo Governo para tomar uma decisão. Se este não for aceite ou se o tribunal der novamente razão à instituição liderada por António Vieira Monteiro, as empresas terão mesmo de pagar o valor em dívida. Se não o fizerem, serão alvo de acções de execução, o que, além de poder criar um cenário de incumprimento com consequências até para o rating da República portuguesa, abrirá toda uma nova frente de combate jurídico – mas agora em Portugal.

E este é o ponto mais crucial neste braço-de-ferro que dura desde o início de 2013 (e que envolvia muitos outros bancos que foram chegando a acordo com o Governo de Passos Coelho). O recurso que na terça-feira as empresas públicas viram ser recusado em Londres argumentava que os swaps celebrados com o Santander têm de ser julgados à luz do direito português, que lhes seria mais benéfico. Mas, mais uma vez, o juiz foi favorável às alegações do banco, que entende que estes contratos têm um carácter internacional e que, por isso, são as normas inglesas que prevalecem.

Uma discussão que também já chegou ao Tribunal de Justiça da União Europeia, que deverá em breve dar resposta às dúvidas colocadas pelo Supremo no julgamento de um caso que opõe o Santander a uma empresa pública da Madeira. Como o PÚBLICO noticiou recentemente, o debate recebeu já um contributo da Comissão Europeia, que se mostrou favorável à interpretação do banco

Mas há outra via por explorar, que o Governo deixou em aberto na terça-feira, num comunicado divulgado ao início da noite. Embora reitere que as empresas públicas "farão uso de todos os meios jurídicos ao seu dispor para recorrer da decisão proferida" pelo tribunal de recurso, o Ministério das Finanças diz que existe disponibilidade "para encontrar uma solução negocial alternativa que permite pôr fim ao litígio".

Este caminho foi, aliás, sempre defendido pelo Santander, que chegou a fazer uma proposta ao anterior Governo de Passos Coelho para conceder um financiamento ao Estado, com condições mais vantajosas, para que pudesse amortizar os prejuízos dos swaps. Mas, até aqui, foi sempre muito difícil chegar a um acordo, já que o banco recusa fazer descontos sobre as perdas dos contratos, já que não as provisionou. 

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