Concurso Nacional de Leitura chegou ao fim, agora é a vez das famílias

Leituras em Família é a nova aposta do Plano Nacional de Leitura, que decidiu pôr fim ao concurso que era a sua imagem de marca.

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Concurso Nacional de Leitura contava com 16 edições realizadas Daniel Rocha
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As famílias vão passar a ser a aposta central do Plano Nacional de Leitura (PNL) para os próximos anos, substituindo assim as escolas que foram o terreno de eleição deste programa intergovernamental desde o seu lançamento, em 2006. A mudança foi concretizada com o fim do Concurso Nacional de Leitura, a acção mais concorrida do PNL com 16 edições cumpridas, e a sua substituição pelo novo programa Leitura em Família com candidaturas abertas até ao próximo dia 21 de Março.

“O Concurso Nacional de Leitura (CNL) cumpriu o seu papel, que era sobretudo o de criar práticas locais, por todo o país, de celebração da leitura. Nesse sentido, decidimos fechar este ciclo de 16 anos, e iniciar um novo modelo, que celebre a leitura com toda a família e a comunidade, e não apenas com os alunos”, explica a comissária do PNL, Regina Duarte, em respostas ao PÚBLICO.

O CNL tinha como destinatários os alunos dos 1.º, 2.º e 3.º ciclos do ensino básico e do ensino secundário. Na 16.ª edição, realizada no ano lectivo passado, participaram 7800 alunos destes vários níveis de escolaridade. Já os destinatários do programa Leitura em Família são os municípios. Foram abertas 40 candidaturas para 2024 “para que, com o apoio do PNL, desenvolvam acções de promoção da leitura com famílias”, descreve-se no regulamento da iniciativa.

Cada município envolvido contará com uma verba de dois mil euros que “pode ser utilizada para o pagamento de formadores, aquisição de fundo documental e outros serviços”.

Nesta primeira fase, o PNL aponta para o envolvimento de 40 a 60 famílias que serão identificadas pelos municípios entre aquelas que se encontram “em contextos de intervenção prioritária”. Esta designação costuma referir-se a territórios marcados por carências económicas e ameaçados de exclusão social.

Impacto da família na leitura

“Décadas de investigação têm mostrado que a intervenção junto das famílias é uma das acções mais fundamentais e transformadoras na alteração de hábitos de leitura”, frisa Regina Duarte, que destaca algumas das conclusões patentes nos estudos sobre esta temática.

Esta, por exemplo: “Crianças que crescem com livros em casa e que lêem com os adultos cuidadores entram no pré-escolar com três vezes mais vocabulário do que as crianças que não têm estas práticas em casa. Entram também com hábitos de atenção selectiva, essenciais a qualquer aprendizagem.”

Isso significa também que “estas vantagens da leitura em família colocam em desvantagem os alunos que a ela não têm acesso, de tal forma que são precisos vários anos de intervenção escolar direccionada para compensar esta diferença”.

É um cenário que, segundo a comissária do PNL, também pesou na decisão de pôr fim ao Concurso Nacional de Leitura. “Se é certo que 16 anos deste concurso foram importantes para dar visibilidade à leitura e para premiar bons leitores”, também se percebeu que não há um impacto claro junto dos não leitores. “É aqui que temos de centrar o nosso trabalho e o nosso investimento, dado ser uma área a descoberto”, acentua.

Críticas ao Concurso Nacional de Leitura

No relatório de actividades relativo ao ano 2022-2023, o Concurso Nacional de Leitura figura entre as “acções encerradas por terem concluído o seu ciclo de vida”. No caso descreve-se que aquele concurso, apesar da forte adesão nacional, denota desgaste a vários níveis, que vai da selecção dos livros à selecção dos participantes, assinalando-se ainda “comportamentos competitivos pouco ou nada saudáveis”.

Assinala-se também que “a forma como muitas provas escritas e orais se apresentavam, muito semelhantes a exames, associava o concurso ao escolar e à leitura escolarizada, promovendo a leitura sobretudo junto dos que já são leitores”.

Estas provas de selecção deixam de existir para a inscrição no Festival Leitura em Família, um encontro anual que terá a sua primeira edição em Setembro. Para além das acções junto das famílias o novo programa do PNL apostará também na “investigação e formação de mediadores”, um lugar que será ocupado por professores e bibliotecários municipais.

Um estudo de 2019 promovido pelo PNL e pelo Centro de Investigação e Estudos de Sociologia (Práticas de Leitura dos Estudantes dos Ensinos Básico e Secundário) dava conta de que 57,7% dos alunos estavam inseridos em famílias em que a relação com a leitura é fraca.

Apontava também para um crescente desamor dos jovens pelos livros, traduzido em dados como estes: 17,4% dos alunos do ensino básico e 26,2% do secundário assumem que no último ano antes do inquérito não leram “nenhum livro por prazer”. Em 2007, primeiro ano do PNL, estes valores eram, respectivamente”, de 12,5% e 11,35.

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