As cartas do futuro enviadas por 26 escritores no Festival Lisboa 5L
Oficina do Futuro é uma vídeo-instalação que pode ser vista no Festival Lisboa 5L até domingo. Vários escritores imaginaram-se no futuro, escreveram micro-contos e filmaram-se com o telemóvel.
A vídeo-instalação Oficina do Futuro, em que 26 escritores de língua portuguesa se filmaram a si mesmos enquanto liam cartas endereçadas de um futuro por si criado, vai poder ser vista no Festival Internacional de Literatura e Língua Portuguesa Lisboa 5L a partir desta sexta-feira, em permanência, na sala do forno no Unicorn Factory Lisboa – Beato Innovation District. O vídeo vai ser exibido em contínuo no festival cuja programação tem por temática Inovação: Utopia/Distopia e os visitantes vão poder vê-lo do modo que quiserem: ou do princípio até ao fim ou aos bocadinhos.
“As pessoas vêem um dos vídeos, dois, todos, ou vêem um bocadinho, vão-se embora, voltam”, explica ao PÚBLICO Carlos Vaz Marques, um dos curadores desta quinta edição do festival juntamente com Catarina Magro e Jorge Amorim. Ao mesmo tempo será oferecida uma brochura, agrafada e da qual foram feitos mil exemplares, onde estão reunidos os textos dos escritores que responderam ao desafio lançado pelo curador para que fizessem “um exercício literário de antecipação do futuro”.
António Cabrita, Rui Cardoso Martins, José Gardeazabal, Paulo Moreiras, João Pedro Vala, Susana Moreira Marques, Valério Romão, José Luís Peixoto, Martim Sousa Tavares, Teolinda Gersão, Carmen Garcia, Paulo Moura, Luís Carlos Patraquim ou Jorge Reis-Sá são alguns dos escritores que aceitaram o pedido de Carlos Vaz Marques.
“Imaginei que podíamos fazer uma brincadeira pedindo a autores, hoje, para se projectarem num futuro que eles determinavam quando seria”, explica o curador ao PÚBLICO. E “como hoje andamos todos com um telemóvel no bolso – uma máquina de viajar no tempo que é uma forma também de comunicarmos à distância”, o curador pediu-lhes que o usassem para gravar um vídeo. “Houve uns que não acharam ter alguma coisa para inventar nessa matéria, outros tinham questões formais e outros nem responderam, o que é normal. Portanto, estes 26 foram aqueles que decidiram entrar no jogo de se projectarem no futuro e enviarem uma carta para o nosso tempo presente.”
Foram os próprios escritores que conceberam e montaram os seus vídeos, fizeram os efeitos especiais ou criaram o ambiente. Mas sem qualquer tipo de produção. “Tudo o que está ali foi feito pelos autores. Só a moldura com duas ou três informações acerca deles é nossa”, acrescenta o curador.
“Nós, os do futuro, estamos constantemente a mandar-vos cartas, a vocês, os do tempo pré-Dissolução. Escolhi comunicar com um festival literário porque me lembro que quando fui Joana Bértholo ia a muitos. E lembro-me que eram lugares onde se falava bastante do futuro, utopia, inovação, paradigma e consciência. (…) Nesta carta, vimos dizer-te que não se trata de travar a travessia, de ficar em terra, mas que é urgente vocês, os de 2025, usarem esses vossos Festivais, Literários ou de outra índole, para se unirem e, juntos, conseguirem equipar os novos Titanics com o número certo de botes salva-vidas”, diz a escritora Joana Bértholo na sua carta enviada do futuro para uma Lisboa de Maio de 2025. Nestes micro-contos filmados em que os escritores imaginam um futuro em que se projectam, “uns fazem coisas mais de ficção científica, outros mais de intervenção no nosso presente”, considera Vaz Marques. Joana Bértholo, por exemplo, “é claramente um caso de quase uma missiva ecológica. Embora haja dois ou três que têm essa vertente mais interveniente.”
Richard Zimler, numa carta à sua mãe em Fevereiro de 2357, conta que andou a vasculhar no sótão: “What a horrible smell! Consegues adivinhar o que encontrei embrulhado numa espécie de película transparente? No início, não tinha a certeza do que era, mas retirei a película, digitalizei a capa e enviei para HistoriesMysteries, aquele site de que gosto. Descobri que se chama um romance. Era um tipo de história muito longa que as pessoas escreviam e mandavam imprimir.”
O vídeo de Inês Fonseca Santos “tem a força da imagem que ela encontrou com um dispositivo muito simples”, com uns óculos escuros e um casaco com capuz, e é uma carta “imensamente lúgubre”, lembra o curador, escrita em Março de 2065. “Querido amigo, Ainda bem que morreste cedo. (…) Esperar pelo futuro foi um erro”, escreve a autora.
Esta vídeo-instalação, diz Carlos Vaz Marques, tem “esse potencial de vermos ali o que é que os escritores de hoje estão a projectar e a imaginar em relação a um futuro hipotético.”
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