Sem maioria para governar, PSD deverá forçar eleições em São João da Madeira
Presidente da câmara acusa oposição de “bloqueios sucessivos”. PS critica autarca pelo discurso de “vitimização”
São João da Madeira poderá ter eleições intercalares. O social-democrata Ricardo Figueiredo, presidente da câmara, não confirma nem desmente este cenário, mas depois do comunicado que escreveu na última quarta-feira é previsível que nada fique igual. O autarca acusa a oposição de “bloqueios sucessivos”, que travaram o investimento de “mais de 10 milhões de euros nos últimos dois anos”, e de desrespeitar deliberações aprovadas na Assembleia Municipal. “Todos os cenários estão em aberto”, diz, prometendo, para os próximos dias, uma comunicação à imprensa para anunciar uma decisão das suas reflexões. “Há um bloqueio que tem de ser ultrapassado para que a cidade avance”, atira. A oposição não se revê nas acusações e fala em “incompetência” e em incumprimento do plano de actividades.
O PSD não tem a maioria na câmara: três vereadores são do PSD, três do PS e um é independente. Nas autárquicas de 2013, o PSD ganhou com 38,02%, o PS com 35,07% e o Movimento Independente São João da Madeira Sempre com 9,98%. Na última frase do comunicado, o presidente da câmara deixa claro que “a cidade não pode estar refém daqueles que são contra a natureza empreendedora e inconformada dos sanjoanenses”.
Ricardo Figueiredo lembra que o programa foi sufragado pela população e que promoveu diligências para garantir a governabilidade do município. “Esta oposição tem bloqueado a câmara desde o início. Quando ganhámos as eleições, tínhamos um programa que queríamos cumprir, mas a oposição tem-nos impedido de o fazer plenamente. Os são-joanenses são gente de palavra”, diz ao PÚBLICO.
A gota de água foi o chumbo do empréstimo para 22 investimentos que representam, no total, três milhões de euros – um milhão de fundos comunitários, dois milhões de financiamento bancário. A recuperação de quatro prédios de habitação social, a construção de um campo de futebol para as camadas jovens, a melhoria da eficiência energética da iluminação pública, a reabilitação da capela mortuária, entravam nesse pacote. O autarca lembra que parte dos investimentos foi chumbada na câmara e que dos 22, 15 foram aprovados na assembleia municipal que entretanto, com os votos do PSD e da CDU, acabou por decidir que o assunto iria novamente à câmara para averbar os dois milhões de euros do empréstimo. “A oposição chumbou esta deliberação da assembleia municipal. É um caso perfeitamente suis generis, anti-democrático, e que tem uma gravidade extrema”, refere. No comunicado, o autarca comenta que “é inconcebível que a oposição, em atropelo aos princípios democráticos, tenha desrespeitado uma deliberação da Assembleia Municipal, como é intolerável que a oposição – contra tudo e todos – persista em impedir a cidade de avançar.”
“Incompetência e descalabro na gestão”
O PS contesta todas as acusações, acusa o presidente da câmara de alterar as condições do empréstimo que queria aprovar, e diz que a cidade já se habituou ao “discurso de vitimização” do autarca. “O único bloqueio à cidade é o próprio presidente da câmara que consegue sempre encontrar truques e que está mais preocupado em encontrar dificuldades à oposição do que governar a cidade. Está mais preocupado em vitimizar-se para, dessa forma, esconder a incompetência e o descalabrado da gestão autárquica”, afirma Luís Ferreira, vereador do PS.
O socialista recorda que a 21 de Julho deste ano foi aprovado o empréstimo com a condição desse financiamento não exceder a capacidade máxima de endividamento do município de 1,99 milhões. “Uma exigência absolutamente razoável”, explica. “Entretanto, o presidente da câmara quis alterar as condições, queria outra vez os 22 investimentos aprovados. Isso é tão ridículo, ele sabia quais eram as nossas condições”.
Na terça-feira, o PS de São João da Madeira emitiu um comunicado com o título: “PSD continua a preferir bloquear a cidade em vez de governar”. Nesse texto, mostra-se disponível para “viabilizar as condições financeiras necessárias à execução de todos os projectos, dentro da disponibilidade financeira da autarquia e dos limites legais de endividamento apurados anualmente” e refere, por outro lado, que o “PSD tem todas as condições para governar e é isso que, se souber e quiser, deve fazer com empenho e dedicação total”. O PS deixa ainda claro que não vai entrar “em qualquer lógica de política de guerrilha”. E relativamente ao empréstimo, realça que sete projectos não foram reprovados, mas que transitaram para 2016. “Passados três meses, o presidente da câmara prefere rasgar o consenso e não executar as obras, trazendo às reuniões de câmara propostas que contrariam o acordado anteriormente e que comprometem o consenso e o acesso ao crédito”, sustenta no comunicado.
Jorge Lima, vereador independente, diz que a situação é simples e faz a sua leitura das críticas de Ricardo Figueiredo. “O presidente da câmara quis ser presidente da câmara, mas se calhar agora já não quer ser presidente da câmara e está a arranjar um pé porque não é capaz de executar o plano de actividades que propôs a São João da Madeira”. Lima votou contra a alteração orçamental. “Estava disponível para aprovar o empréstimo desde que o dinheiro fosse exclusivamente para esse fim. Com a alteração orçamental, o presidente da câmara queria cabimentar esse dinheiro e utilizá-lo onde lhe apetecesse e quando calhasse”. O empréstimo, na sua opinião, não pode ser utilizado para resolver problemas de tesouraria. “Ninguém mexeu no plano de actividades aprovado em Janeiro. Chegamos a Outubro e o presidente da câmara não consegue realizar aquilo a que se comprometeu com a cidade”, afirma.
O verniz começou a estalar no ano passado. As piscinas cobertas desenhadas pelo arquitecto Souto de Moura para São João da Madeira, durante o anterior executivo, não saíram do papel depois do chumbo da oposição. O assunto mexeu na cidade, o investimento de cerca de seis milhões de euros foi questionado, o cartão vermelho surgia com o argumento da câmara não conseguir cumprir com as suas obrigações financeiras. Souto de Moura foi a São João da Madeira explicar o projecto, foi feito um manifesto a favor da construção das piscinas e surgiu uma petição com cerca de 3.000 assinaturas para uma segunda votação e o chumbo manteve-se.