A marijuana traz dinheiro, mas nem todos estão contentes

Desde a década de 1930 que a marijuana é proibida na maior parte dos estados americanos. Depois de um aligeiramento das penas por posse nos anos 1970, vários estados começam agora a permiti-la para fins recreativos e medicinais. É o que acontece no Colorado. Mas basta atravessar a estrada e a realidade é outra.

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Um homem velho com uma barba branca debruça-se na casa portátil onde fica a única loja de erva da zona Leste do Colorado. Usa um macacão por cima de uma T-shirt branca e tem um sorriso gigante. É um agricultor do Nebrasca de 78 anos. “Quanto é que posso ter por 100 dólares?”, pergunta. Ray — sem apelido, disse, nervoso — compra alguns gramas, atravessa a rua para mostrar à mulher quanto conseguiu e corre de volta para a caixa registadora. “Esqueceu-se de alguma coisa?”, pergunta o empregado, um professor que passa o Verão a vender marijuana. “Mais erva!”, gritou de alegria. 

Tem fumado desde os 12 anos e irá continuar “até ao dia em que morrer”, diz. E agora Ray prepara-se para voltar para o seu camião e transportar a sua primeira compra legal ao longo de 520 quilómetros em direcção a leste, de regresso à sua quinta no Nebrasca. A viagem iria fazer dele um criminoso porque, apesar de a marijuana se ter tornado legal no Colorado este ano, decerto que não o é no outro estado.

Em Goodland, Kansas, a cerca de 30 quilómetros do Colorado, quatro dos 18 homens na prisão do xerife Burton Pianalto estão lá porque trouxeram marijuana do outro estado. Em finais de Abril, Pianalto gastou metade do seu orçamento de refeições para o ano inteiro. Ele não tem a certeza de como irá pagar a comida até Dezembro. Custa-lhe uns 45 dólares por dia acolher um miúdo do Minnesota ou Illinois que comprou erva legalmente no Colorado e pôs-se na estrada interestadual 70 em direcção a Leste para a vender aos amigos. 

Em Chappell, no Nebrasca, a 20 quilómetros da loja de marijuana em Sedgwick, o xerife Adam Hayward rebentou com o orçamento para as horas extraordinárias e aumentou três vezes os gastos da prisão em três anos — quase tudo por causa do aumento das detenções por marijuana.

Não muito longe, no condado de Scotts Bluff, também no Nebrasca, o xerife Mark Overman diz que o Colorado está a exportar problemas para os seus vizinhos. “Estão a promover o turismo de marijuana”, disse. “A mensagem é: venham ao Colorado, fumem marijuana. E depois as pessoas levam alguma para casa. Não vamos atrás dela — não temos ninguém sentado na fronteira —, mas esta marijuana do Colorado é muito potente, muito aromática e tropeçamos nela frequentemente se alguém está em excesso de velocidade e os mandamos parar.” 

As fronteiras entre os estados podem ser símbolos de divisões de valores e culturas. O aborto foi legal em alguns estados mas não noutros. Fogo-de-artifício é permitido de um lado da fronteira mas banido noutro, um quilómetro à frente. As leis que regulam a venda de álcool variam imenso de estado para estado. Por isso não deveria chocar que, à medida que as atitudes em relação à marijuana mudavam, novas divisões fossem aparecendo ao longo das fronteiras. 

Em Great Plains, a leste de Rockies e a três horas da profusão de lojas de marijuana em Denver — a última contagem dava 340 com fins medicinais e recreativos —, a experiência social ousada do Colorado confunde os pais que têm de explicar aos filhos por que é que esta substância atraente mas problemática é legal ao fundo da rua, no estado vizinho.
As mesmas políticas que libertaram os fumadores de erva do Colorado estão a encher prisões minúsculas no Kansas, Nebrasca e Wyoming. “Cada vez que paramos alguém, significa que tenho de perder o meu tempo de xerife com a tua erva do Colorado”, diz Overman. “Temos de pagar horas extras, pagar ao juiz, pagar para os prender, para a sua defesa se forem indigentes. O Colorado está a taxá-lo, mas todos estão a pagar um preço por isso.”

Um centro comercial de marijuana

Quando o vento sopra na direcção certa, toda a Baixa de Sedgwick cheira a erva, um sinal de que as receitas fiscais estão a crescer nas traseiras do reboque que acolhe a loja de erva de Mike Kollarits, a Alternative Relief (Alívio Alternativo). Num par de meses, quando Kollarits acabar de renovar a antiga mercearia na Main Avenue, o segundo maior edifício na cidade, vazio há uma geração, irá tornar-se um enorme centro comercial de marijuana com uma frente lustrosa em vidro. Nessa altura, vai livrar-se do reboque e pôr lá três estufas onde o seu produto irá crescer. Quando estiverem concluídas, as operações de Kollarits ocuparão tanto espaço quanto os outros negócios na cidade juntos.    

Kollarits, 45 anos, que construiu casas nos subúrbios de Chicago até a recessão matar todo esse esforço, comprou a sua propriedade a Lupe Pena-Casias em Sedgwick. Casias é proprietária do edifício bancário do outro lado da rua, um grande bloco de pedra antigo que converteu num encantador bed and breakfast com 15 quartos e o único buffet de comida mexicana no raio de uma hora de carro. Os quartos custam 25 dólares por noite e só aceitam dinheiro. 

Casias foi uma das primeiras em Sedgwick a verem ouro na erva. Quando estava no conselho da cidade, acreditou durante muito tempo que Sedgwick — 147 habitantes, um bar e um cabeleireiro — poderia voltar a florescer. A cidade, um sítio que se destacava numa região de agricultores e caçadores conservadores, é abrigo de uma pequena colónia de budistas, descendentes de imigrantes japoneses que ajudaram a construir o caminho-de-ferro transcontinental e refugiados de esquerda da zona da Denver. 

No século XIX, o condado de Sedgwick era um ponto de encontro para índios e cowboys, conhecidos pelos saloons barulhentos e as casas de jogo. Mas em 2012, quando no Colorado 55% votaram a favor e 45% contra a legalização da marijuana para fins recreativos (o estado já tinha aprovado a marijuana para fins medicinais em 2000), o condado de Sedgwick votou 797 contra 522 para rejeitar a ideia. 

A minúscula cidade de Sedgwick, com o peso de um défice de 28 mil dólares e uma taxação-base minúscula, tinha uma ideia diferente. Quando a erva se tornou legal no estado, cada município do Colorado podia decidir se queria juntar-se à experiência. Em Abril, numa reunião especial da cidade, os residentes votaram 27 contra 4 para permitir a venda de marijuana recreativa, com uma taxa de 5 dólares por transacção para a cidade. 

“Sou muito certinha”, disse Casias, 60 anos, que passou a maior parte da sua carreira a ensinar inglês às crianças falantes de espanhol. “Mas somos uma pequena cidade rebelde e não tínhamos dinheiro para pavimentar a estrada ou contratar um novo professor. Perdemos a nossa escola, o nosso posto de correios está fechado metade do tempo. Estávamos a morrer. Só pensei que tínhamos de fazer qualquer coisa, mesmo que eu não fumasse marijuana — nem nunca fumei.” 

Casias tem agora planos para renovar um dos seus edifícios e abrir um café em frente à loja de erva. Mesmo assim há alturas em que se sente um pouco desconfiada. “Construí uma parede entre a minha sala e a fachada da pousada porque me preocupa os estranhos que agora aqui chegam”, diz. “Talvez deva colocar um cadeado na porta da frente. Não sei. A quantidade de dinheiro que as pessoas aqui estão a gastar em erva é impressionante. Sedgwick vai tornar-se grande, vão ver.” “Ah, por favor!” É o antigo xerife do condado, Rick Ingwersen, que por acaso é o novo namorado de Casias e que acaba de entrar na pousada para um copo de sumo de maçã e groselha. Ingwersen, que se queixa das pessoas que um dia pôs na cadeia acusadas de ter marijuana e que hoje se tornaram empresários de marijuana legal, não tem assim tanta confiança na renascença de Sedgwick trazida pela erva. Mas, enquanto um dos maiores proprietários da cidade, vê a situação de ambos os lados. “Tenho demasiados edifícios emparedados”, diz. Depois, uma gargalhada: “Tenho esperado pacientemente que a erva chegue e salve a cidade.” Comprou propriedades nos anos 1980 quando a conversa sobre a legalização do jogo trouxe uma onda de optimismo a Sedgwick. Mas o jogo nunca chegou. A cidade continuou a decrescer.

A marijuana, que cresce de forma selvagem em muitas das quintas da zona — os locais chamam-lhe “erva de estrada” —, “é uma forma de vida aqui, claro, mas irá ter as suas consequências ao longo do tempo”, diz Ingwersen. “Toda a gente aqui está demasiado interessada em ficar pedrada. Acho que me vou manter firme e lutar por uns tempos.” 
Imediatamente depois, ele e Casias seguem para o RD, o bar em Sedgwick, duas portas a seguir à loja de erva e o único sítio na cidade onde as pessoas saem à rua depois de anoitecer.  O bebedouro, escuro e húmido, serve cerveja — cerveja com pouco álcool. Sedgwick pode estar à vontade com erva, mas imperiais com espuma a toda a força não são permitidas aqui. 

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O RD é o único bar na pequena cidade de Sedgwick Nikki Kahn/The Washington Post

Nos primeiros quatro meses deste primeiro ano de venda de marijuana para fins recreativos, o Colorado recebeu 11 milhões em impostos e 7 milhões de vendas de erva para fins medicinais. O dinheiro vai para a construção de escolas e para ajudar a localidade. Mas nem um centavo foi para Deuel porque o condado de Deuel é apenas a norte da fronteira estatal, no Nebrasca. 

É perto o suficiente para permitir que os filhos de Cori Koehler peguem nas suas bicicletas e vão à loja de erva de Sedgwick. “Sinceramente, qualquer miúdo que queira quase que pode ir a pé até lá”, diz. Koehler, 34 anos, tem um cabeleireiro na rua principal em Chappel, condado de Deuel. Desde que a marijuana se tornou legal do outro lado da fronteira, ela assistiu a um aumento da droga na Estrada interestadual 80, pessoas a serem algemadas e a ficarem de pé nas valas ao longo do leito do Nebrasca. 

“Vejo Intervention e todas essas séries sobre droga na televisão, e é interessante, mas não quero que isso chegue aqui”, diz Koehler. Os seus filhos ainda são pequenos, “e jogamos à bola ali em Sedgwick,  eles vão ver erva ou ouvir falar dela, e depois perguntam o que é e ficam curiosos. Porque é que tenho de passar por isso? O meu mais velho tem 13 anos, e quando se tem 13 anos não se deve saber essas coisas”.

“Eles não se vêem a cometer um crime”

É por pessoas como Koehler que o xerife Hayward quer que se faça alguma coisa sobre o choque de leis ao longo da fronteira estadual. Os seus três polícias sempre fizeram apreensões de erva, mas o número e o tipo mudaram substancialmente este ano. No ano passado, os polícias prenderam 30 condutores acusados de posse de marijuana, todos na auto-estrada (apenas 1800 pessoas vivem no condado); este ano, até Junho, já houve 32 detenções deste tipo. 
No ano passado, foram detidas 15 pessoas por conduzirem sob influência de marijuana. Este ano já foram detidas 12, três vezes mais do que as detenções por condução sob álcool. A marijuana que transportam agora é quase toda do Colorado — as embalagens têm frequentemente as etiquetas das lojas de erva de Denver (“Plantado em Colorado/Compre sempre no Colorado”) — em vez das dos cartéis mexicanos. A erva do Colorado é agora o centro do mercado negro dos estados vizinhos, dizem as autoridades.

Os xerifes no Kansas e Nebrasca dizem que poderiam fazer muito mais detenções do que aquelas que fazem. Os agentes patrulham a interestadual apenas cinco horas por semana. Mesmo aí, dizem, não estão a fazer qualquer esforço para farejar a erva do Colorado. “Por que é que uma pessoa vai a 140 à hora quando leva sacos cheios de erva é algo que  me ultrapassa, mas as pessoas fazem-no”, diz Hayward.

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O xerife Adam Hayward, do condado de Chappell, Nebrasca, aumentou o número de detenções por posse de marijuana vinda do Colorado Nikki Kahn/The Washington Post

Joel Jay, o único advogado de defesa no condado de Deuel, descobriu que muitas pessoas que trazem marijuana para o Nebrasca só o estão a fazer porque está disponível. “Eles não se vêem a cometer um crime”, diz. “Claro que sabem que é ilegal, porque de outra forma para que é que iriam ao Colorado? Ao fim de alguns dias lá, perde-se a perspectiva. Está mesmo ao lado da loja de donuts e começa-se a pensar: ‘Isto não pode ser assim tão mau’.”   

A marijuana tornou-se uma constante no trabalho de Jay, e não apenas nas detenções na auto-estrada. Este mês, no tribunal de jovens, ele e o juiz lutaram para tentar perceber se o Nebrasca deveria ficar com a custódia de uma criança a cujos pais foi ordenado que não consumissem drogas ilegais. Os pais mudaram-se para o Colorado, onde fumavam marijuana — legal ali, mas uma violação da ordem do juiz no Nebrasca. 

Ao contrário dos vizinhos de Plains, o Nebrasca fez parte da onda dos 11 estados nos anos 1970 que descriminalizaram a posse de pequenas doses de marijuana. As pessoas com menos de 30 gramas recebem uma multa e pagam multa até 300 dólares. Mas a lei do Nebrasca não poderia antecipar o mercado que se iria desenvolver no Colorado, onde as muito populares barras de chocolate com marijuana pesam o suficiente para fazer com que alguém apanhado no Nebrasca com meia dúzia de doces facilmente atinja o tecto de 30 gramas a partir do qual se é acusado de distribuir, o que é crime. Há algumas semanas, os agentes de Hayward pararam um carro onde três homens foram encontrados com 90 gramas de sementes de marijuana e 500 gramas de um creme para as mãos à base de cannabis. Só com as sementes, os viajantes teriam ido embora com uma multa. Mas o creme — que continha pequenas quantidades de THC, o químico responsável pelos efeitos psicológicos da marijuana — pesava mais do que 30 gramas, por isso o xerife podia tê-los acusado da intenção de distribuição e prendê-los.  

“Deixei-os em paz porque era creme e registei-o apenas como delito”, disse o xerife. “Não posso encher a cadeia com estes casos.” Hayward, 34 anos, quer que o Nebrasca aumente as multas por posse de 30 gramas ou mais de marijuana, mas os políticos mostraram pouco interesse na ideia. Ele e outros xerifes ao longo da fronteira também querem que o Colorado ajude a pagar os custos adicionais da aplicação das leis da marijuana. Uma legisladora do Colorado, Amy Stephens, republicana que se opôs à legislação, concorda que o seu estado deve alguma recompensa aos estados vizinhos. Propôs que parte das receitas fiscais da venda de erva fosse para ajudar os outros estados que enfrentam agora custos de aplicação da lei. A sua proposta não foi a lado nenhum. “Mas precisamos de ter esta discussão”, disse Stephens. “Corremos para isto tão depressa que não pensámos na segurança das crianças ou no impacto nos nossos vizinhos”, diz. 

Até os xerifes do Colorado que concordam com Stephens sobre a erva legal ter sido uma má ideia não estão muito inclinados a enviar dinheiro para outros estados. “Estamos a ver substancialmente mais condutores sob efeito de drogas aqui, também”, diz o xerife do condado de Sedgwick, Randy Peck, “e precisamos de pagar a despesa dessas detenções antes de pensarmos noutros estados”. 

A minutos do Colorado, um homem que distribui comida congelada traz o seu camião para o condado de Sherman, para a garagem da prisão de Kansas que funciona como sala de recreio dos prisioneiros. Cada pilha de jantares representa um rombo no orçamento do xerife Pianalto. A marijuana legalizada representou o dobro das prisões por posse de marijuana neste condado de 6 mil pessoas.

Pianalto, 51 anos, viu a marijuana descarrilar adolescentes promissores, mas também se deixou comover por histórias do alívio que provoca a doentes com cancro. “Repare, eu vejo que a proibição não funciona”, diz. “Mas também sei que a liberdade total de deixar que as pessoas façam o que querem também não funciona. Não sei qual é a resposta. O problema é que agora falo com as crianças na escola sobre marijuana e elas deixam-me de cabeça perdida. No mês passado, tinha um miúdo do 1.º ciclo a argumentar comigo, a dizer que não fazia mal nenhum. Ele andava a usar os mesmos slogans que os anúncios de televisão no Colorado pela legalização.”    

Fins medicinais

Mike Kollarits precisava começar do zero e o Colorado oferecia essa oportunidade. O seu negócio de construção e de limpeza de neve em Chicago foram afectados pela recessão e um amigo falou a Kollarits sobre o negócio em expansão da marijuana medicinal à volta de Denver. 

Há quatro anos, Kollarits, a mulher e os dois filhos adolescentes mudaram-se. Kollarits não fumava erva desde os 26 anos; a sua mulher — que pediu para não ser identificada porque é uma professora do ensino especial cujo empregador pode desaprovar o facto de ela vender erva nos intervalos — nunca foi adepta da marijuana.   

A loja deles de erva para fins medicinais num subúrbio de Denver lançou-se com um grande arranque, atraindo gente maioritariamente mais velha. Quando começaram a ouvir os clientes dizer que estavam a consumir marijuana para se livrarem da dependência dos comprimidos contra as dores, acreditaram que não estavam apenas a gerir um bom negócio, estavam também a fazer algum bem. 

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Mike Kollarits está a renovar uma antiga mercearia em Sedwick para abrir uma loja com venda de marijuana para fins medicinais Nikki Kahn/The Washington Post

Depois, Kollarits ouviu falar de Sedgwick e da oportunidade de investir na única loja de erva na metade leste do estado. Situada entre as duas auto-estradas interestaduais que levam 15 mil carros diariamente ao Colorado, Sedgwick “tinha tudo menos interacção social”, diz Kollarits. Afirmar que a cidade é calma não está propriamente correcto; as vacas mugem durante a noite e os arrulhos das pombas asseguram que maior parte das pessoas começa o dia cedo. Isto não é Chicago. Kollarits tem estado demasiado ocupado para se preocupar com o isolamento. Passa pelo menos metade do seu tempo na aldeia, a construir a nova loja, a encher o reboque. Contratou sete pessoas — incluindo duas mulheres reformadas de Denver que são budistas, adoram erva e deliciam-se com o facto de serem chamadas “as senhoras da erva” quando visitam o restaurante perto da interestadual. 

Kollarits espera duplicar a sua equipa este Outono. E está em vias de quadruplicar as receitas fiscais da cidade. Mas numa cidade em que a chegada de um estranho a um bar é motivo para um grupo ficar especado, Kollarits teve de acalmar alguns receios. O comissário do condado de Sedgwick, por exemplo, preocupa-se com o facto de a loja afectar a reputação da zona. 

“Há muita gente aqui que não muda de ideias”, diz Glen Sundquist. Mas, quando a sua irmã estava a morrer de cancro, alguém lhe trouxe bolinhos de marijuana; ela não chegou a comê-los, mas ele acha que não teria sido assim tão mau se os tivesse comido. Ainda assim, as lojas não lhe parecem bem. “As pessoas dizem que estão a ser cada vez mais aceites, mas eu não tenho de gostar só porque alguém faz alguma coisa.”

Alguns dos seus novos vizinhos “acham que a marijuana destrói vidas e foram muito claros a esse respeito”, diz o vendedor. “Mas eu sou um empresário com família. Cresci na igreja Baptista. As pessoas ficam surpreendidas por eu não andar pedrado ou ser um traficante de droga inveterado. Um a um, nota-se uma mudança gigante de atitude; agora vêm ter comigo ao bar e perguntam-me como está a correr.”

Tem tido clientes dos 50 estados; bem mais de metade têm 50 anos ou mais. Os seus primeiros clientes foram um casal de reformados do Iowa que perguntaram se poderiam ter desconto (desculpem, mas não). Cerca de um terço dos compradores vem do Nebrasca e quase dois terços são de outros estados.
Insiste que o seu objectivo “não é vender aos habitantes do Nebrasca. O objectivo é vender a todas as pessoas que vêm de Nova Iorque ou Chicago”.

Uma mulher em Sedgwick queixou-se a Kollarits que não quer que “os filhos pensem que foi a marijuana que salvou esta cidade”. O lojista não mostra arrependimento. “Antes era ilegal”, disse-lhe. “Agora não é. É assim que as coisas são.” Ele sabe que alguns pais ao longo do estado o acusam de ter complicado as suas vidas. “Mas, se eles falarem mais cedo com os filhos, isso é uma coisa boa”, diz. “Na minha casa, dizemos-lhes tudo. Agora, eu sei que o meu filho de 19 anos fuma erva. Ele disse-me. Mas temos regras — não se fuma em casa. Todos os pais deviam ter regras.”

No mês passado, Kollarits foi ao Nebrasca encontrar-se com Hayward, o xerife. Falaram durante uma hora e meia. Kollarits disse-lhe que estava a focar-se nas pessoas que entram no Colorado e não nas que saem do estado. Hayward não ficou impressionado. Quer os compradores entrem ou saiam, a loja em Sedgwick dirige-se a pessoas fora do estado e isso não está certo, disse.

O xerife concorda que a erva que tem confiscado é sobretudo da área de Denver; os seus subordinados detiveram apenas uma pessoa com marijuana de Sedgwick. Não faz sentido alguém vir a Sedgwick para comprar um stock para vender na sua terra, argumenta Kollarits. “A verdade é que é possível comprar marijuana ilegal em qualquer parte dos Estados Unidos mais barata do que aquela que eu vendo.”

Mas ele está empenhado em capitalizar a sua localização. “Vamos ser a próxima Amesterdão”, diz. “O nosso modelo de negócio é tornarmo-nos a primeira loja que se encontra quando se entra no Colorado.”
É isso que irrita o xerife. “O que interessa é o dinheiro, eu percebo. Aquele tipo criou empregos na comunidade e agora tem uma base fiscal. Mas ele está a trazer pessoas do Nebrasca e do Leste. Ele fá-los desviarem-se de Denver quatro horas e depois são apanhados como se fossem criminosos. O que estão a fazer em Sedgwick é hipotecar o futuro dos miúdos.”

Exclusivo PÚBLICO/The Washington Post

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