Uma perigosa convergência de interesses na AR

Por vingança ou por conveniência, o Chega tem conseguido fazer com que seja mais fácil aos socialistas aprovarem as suas propostas na Assembleia da República do que ao Governo governar.

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Faz neste domingo um mês que o Governo começou a funcionar como um todo. Os ministros tomaram posse a 2 de Abril, mas os secretários de Estado só três dias depois estiveram no Palácio da Ajuda para jurar solenemente pela sua honra cumprir as funções que lhes foram confiadas.

Este mês que agora se cumpre serviu sobretudo para fazer cortes com o passado e com o essencial – e o possível – da governação socialista. O primeiro dos cortes foi com o logótipo encomendado ao designer Eduardo Aires, numa atitude que o autor entendeu como ilustrativa de “uma profunda divisão cultural entre os sectores tradicionais e progressistas da sociedade”. O último deles foi a demissão de Ana Jorge da provedoria da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, por "actuações gravemente negligentes".

Luís Montenegro também mudou a orgânica do Governo e o regimento do Conselho de Ministros (como é habitual sempre que uma nova equipa é empossada) e aprovou um novo código de conduta. Usou o lado mais institucional e simbólico da governação para deixar claro que o inquilino de São Bento já não é António Costa.

No capítulo dos equívocos, o executivo da AD anunciou um alívio do IRS mais acentuado do que o prometido por Fernando Medina, mas fê-lo de forma tão pouco clara que o momento se transformou no primeiro imbróglio comunicacional do Governo.

Outro equívoco foi alimentado por Nuno Melo, quando lançou uma ideia “académica” que, afinal, nunca pretendeu seguir: pôr “os jovens que cometem pequenos delitos” a “cumprir serviço militar” para se tornarem “cidadãos melhores”.

Finalmente, foi levantada uma dúvida grave sobre as “contas certas” do PS, o que originou uma troca de acusações que ainda não se sabe como terminará e que vai ter consequências ao nível da credibilidade do país.

De todos os registos que seria possível fazer sobre este primeiro mês, há, porém, um que se impõe: a dificuldade (ou mesmo bloqueio) que a evidente e perigosa convergência de interesses entre PS e Chega no Parlamento trará à governabilidade.

Por vingança ou por conveniência, o Chega tem conseguido fazer com que seja mais fácil aos socialistas viabilizarem as suas propostas na Assembleia da República (como a do fim das portagens nas Scut) do que ao Governo governar. Por enquanto, o PS sorri e agradece, mas quem mostra o seu poder não é Pedro Nuno Santos… é André Ventura.

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