A ver se é desta

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As Galerias Lumière, entre as ruas das Oliveiras e a de José Falcão, estão a renascer. E digo “estão” porque tem sido um processo que se tem desenrolado devagar, sem estardalhaço, com a pacatez de quem sabe para onde vai mas tem tempo para lá chegar, pelo que pode ir devagar. Uma loja de cada vez.

Já me habituara a ver as galerias praticamente vazias e transformadas em pouco mais do que um local de atravessamento entre duas ruas do centro do Porto. As resistentes do costume, entre as quais uma florista e uma livraria, lá continuavam, mas pouco mais. As coisas mudaram em Julho, de repente, sem alarde nem foguetório. Num desses raros dias de sol que foi o Verão deste ano a norte, saímos do jornal sem sabermos muito bem onde iríamos almoçar. Alguém disse para passarmos pelas Galerias Lumière, onde abrira, recentemente, uma conhecida loja de sandes. Não sabíamos ao que íamos e muito menos que ao entrar nas galerias já não encontraríamos o habitual ar de desalento das lojas vazias e abandonadas. Havia cor, havia luz, havia doces e salgados e havia música.

Não é a segunda vida das galerias do centro da cidade. Nem sequer se pode dizer que é a sua terceira vida. A verdade é que, ao longo dos anos, por várias vezes, se tentou que as Lumière saíssem do esquecimento e se reanimassem, voltando a chamar as pessoas para o seu interior. Mas, inevitavelmente, depois de um respirar fundo de algumas semanas ou meses, as galerias lá voltavam a fechar-se sobre si mesmas, deixando-se usar como pouco mais além de uma passagem de atravessamento coberta.

Os cinemas Lumière A e L, que abriram em 1978 e encerraram em 1997, já só fazem parte da memória de alguns. A travessia do deserto da cidade, abatida pela fuga de população e pelo cerco dos grandes centros comerciais que abriam em praticamente todos os municípios que com ela faziam fronteira, ditara a morte (mais rápida ou mais lenta) das pequenas galerias comerciais do centro e dos cinemas, tantos cinemas, que o Porto tinha. Às cavalitas do turismo, as coisas têm começado a mudar nos últimos anos. O grande teste — o regresso em força das famílias para morar no centro — está longe de ser ultrapassado, mas os negócios, os cafés e restaurantes, as lojas alternativas, os bares e as galerias nascem em cada esquina.

É neste contexto que as Galerias Lumière tentam, de novo, a sua sorte. A ver se é desta. Lá dentro há pequenos espaços bonitos, com pessoas sorridentes atrás do balcão que pedem que nos sentemos nas mesas colocadas no centro, sob a luz da grande clarabóia, que os nossos pedidos hão-de aparecer lá, em tabuleiros, não tarda nada.

Foi assim que esta nova vida das Lumière começou, em Julho, mas hoje elas já são mais do que apenas um conjunto acolhedor de coisas para comer. A inauguração “oficial” foi em Setembro e, entretanto, abriram lojas novas. Há brinquedos, um respigador e uma respigadora de quem gosto muito, e até (loucura!) uma tabacaria de venda de jornais e revistas. O mezanino ainda está praticamente vazio. Ainda há espaços à espera de ser ocupados. Mas cruzamos os dedos atrás das costas para que também eles se encham.

Queremos mais lojas, daquelas que não se encontram em cada esquina de qualquer cidade. Podem vir mais doces e salgados. Pode vir mais música e brinquedos. E um cinema, se viesse um cinema… A cidade já tem demasiados espaços moribundos, ainda sem solução à vista. Quando se tenta como se tenta com as Galerias Lumière, merece-se que as coisas, um dia, corram bem.     

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