A estratégia socialista em Loures de culpabilização dos mais excluídos alimenta a extrema-direita

A Câmara de Loures propõe-se cobrar dívidas aos moradores da habitação social, ameaçando-os com despejos em série. Mas estas dívidas são da responsabilidade direta da própria autarquia.

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Com o nome inusitado “Habitação Justa”, o presidente da Câmara de Loures anunciou numa conferência de imprensa o programa que apelidou de “revolucionário”, cujo objectivo único é a cobrança de dívidas no pagamento de rendas de habitação social, ameaçando com despejos em massa as famílias que não acatarem.

Num momento em que a crise inflacionista aumenta dramaticamente o custo de vida e as pessoas, na sua generalidade, têm rendimentos baixos ou muito baixos e, por isso, crescentes dificuldades em fazer face às suas necessidades fundamentais, a autarquia de Loures elege como prioridade a cobrança coerciva de dívidas constituídas na habitação pública.

O nível de endividamento no pagamento de rendas sociais é elevado em Loures (cerca de 50%, de acordo com a autarquia) não porque as pessoas de Loures sejam de outro tipo, diferente dos restantes concelhos, mas porque a autarquia assim fez que acontecesse. Durante muitos anos Loures abandonou completamente os bairros de habitação pública à sua sorte, deixando de fazer manutenção, ignorando as necessidades dos moradores e desaparecendo dos bairros que estavam sob a sua gestão. Perante o abandono e total desresponsabilização, os inquilinos dos bairros, deixados à sua sorte com todo o tipo de problemas, deixaram igualmente de pagar a renda.

Ao contrário do que diz, a câmara não cumpriu, e continua a não cumprir, as suas responsabilidades. O edificado tem muitos problemas estruturais e falta de manutenção, há casas cobertas de fungos negros devido a níveis muito elevados de humidade, há casas onde chove, há casas sem circuitos elétricos em condições, há edifícios com cinco e seis andares sem manutenção do elevador (onde vivem pessoas idosas ou doentes que ficam impedidas de sair), falta arranjo do espaço público, não há parques infantis ou limpeza urbana. Em suma, falta a Loures criar oferta de habitação social que confira dignidade e qualidade de vida às pessoas que necessitam dela.

Não assumindo quaisquer responsabilidades no abandono a que deixou e continua a deixar a habitação social, a autarquia elege como objectivo apontar o dedo, promovendo a imagem dos moradores e moradoras da habitação social como pessoas irresponsáveis que não pagam o que devem, acionando mecanismos especiais de cobrança e ameaçando com despejos em massa. O que faz na prática é colocar pessoas com dificuldades no acesso à habitação em geral contra pessoas que vivem na habitação social, pobres contra pobres, alimentando ressentimentos, e desviando a atenção sobre os verdadeiros problemas e causas da crise na habitação e da sua falta de ação. Revelando o seu ódio aos pobres – e promovendo-o – assim como o seu oportunismo político, o PS elege uma narrativa que se assemelha à estratégia típica da extrema-direita, a quem acabará, por este andar, por passar a pasta.

O que a autarquia deveria fazer perante esta situação era anular as dívidas passadas, arranjar os bairros, em diálogo com os moradores e moradoras e suas organizações, e a partir daí receber as rendas sociais que sejam proporcionais aos rendimentos das famílias.

A autora escreve segundo o novo acordo ortográfico

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