O barco, os comboios e a pista da Playmobil - todos contra o PS e o ministro das Infra-estruturas

Interpelação do CDS ao Governo sobre infra-estruturas públicas foi marcado por declarações do ministro Pedro Marques a dizer que construiu e lançou obras, e os restantes partidos, incluindo Bloco, PCP e PEV, a acusarem-no de não investir.

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LUSA/MIGUEL A. LOPES

O debate marcado pelo CDS era sobre "in-fra-es-tru-tu-ras pú-bli-cas", como lhe soletrou o centrista Nuno Magalhães, mas o ministro Pedro Marques preferiu dar atenção à reprogramação dos fundos comunitários do programa Portugal 2020 para anunciar que, na sequência disso, desde sexta-feira o Governo já colocou à disposição das empresas e dos candidatos 1200 milhões de euros.

Talvez por ter sido acusado durante duas horas de se ficar pelos anúncios sucessivos de concursos lançados mas não ter obra real concretizada, Pedro Marques, rematou a sua intervenção final aos berros para colocar a voz sobre os protestos do plenário: "Podem gritar mas vão ter que ouvir!" E depois listou os 500 quilómetros de ferrovia que sofreram intervenções, da linha do Norte à do Douro, da Beira Baixa à Beira Alta, ou a linha de Évora para Badajoz.

O ministro passou a tarde a responder quase aos gritos aos deputados - até mesmo quando respondia a questões do PS aproveitava para dar recados à direita num tom duro e elevado. Listou números de investimento em rodovia, ferrovia, material circulante por várias vezes. Atirou responsabilidades ao anterior Governo pelo estado actual das infra-estruturas devido ao desinvestimento durante quatro anos e por ter projectado e anunciado obras que nunca chegou a concretizar e ter deixado os cofres do ministério vazios. E garantiu que anda no terreno, visita as obras, e que elas estão a avançar no terreno para quem quiser ver - quem não sabe é porque não vai lá, atirou aos críticos.

Pedro Marques acusou PSD e CDS de terem "perdido o Norte" e recorrerem a um "discurso passadista" e de "propaganda", de terem descoberto uma "enorme paixão pelas greves". Contra a imagem de um país a cair aos pedaços, com pontes, estradas e linhas de comboio "perigosas", o ministro fez questão de vincar que as infra-estruturas do país "são seguras" e que podem ser usadas "com confiança", de acordo com os estudos do LNEC - Laboratório Nacional de Engenharia Civil. A ponte 25 de Abril, por exemplo, terá obras de manutenção que começam ainda este ano, garantiu, sem especificar data.

PSD e CDS recusaram enfiar o barrete da culpa. Lembraram que receberam um país na bancarrota, que os constrangimentos de investimentos foram todos incluídos no memorando da troika elaborado pelo PS, disseram que encontraram também obras anunciadas que não tinham saído do papel, e tentaram colar Pedro Marques aos investimentos dispendiosos de José Sócrates - de quem foi secretário de Estado. O social-democrata Luís Leite Ramos citou os 794 quilómetros de via férrea fechados pelo Executivo de Sócrates que representou o "encerramento e destruição total da ferrovia".

Do CDS, que agendou o debate, veio um cenário de "colapso" das infra-estruturas públicas. "As greves são apenas a face visível de uma governação falhada, de promessas não cumpridas, de um país a cair aos bocados. A geringonça falhou consigo própria e com os portugueses: PCP, BE e PEV não podem voltar a dar garantias de mais direitos e melhor serviço prestado pelo Estado", disse Hélder Amaral, listando depois uma série de casos de acidentes, reclamações e atrasos nos transportes públicos durante este ano. O deputado falou também de muitos casos de obras agendadas há anos mas nunca feitas. "Das promessas à realidade existe uma distância socialista. Na propaganda é um mar de rosas, na realidade uma floresta de enganos."

O PSD não foi mais brando mas as acusações foram as mesmas. O deputado social-democrata Carlos Silva até pediu a Pedro Marques, usando o lema das passagens de nível: "Pare, escute e olhe! Pare com a propaganda; escute os portugueses e olhe para a realidade sem fantasias." E recorreu à ironia: "Gerir uma rede de infra-estruturas não é gerir a pista da Playmobil que temos lá em casa..."

À esquerda, Bloco, PCP e PEV dispararam em todas as outras direcções, que é o mesmo que dizer, para a direita pelo "branqueamento de responsabilidades" que tenta fazer e para o Governo que promete investimento mas não o concretiza. Para a direita porque cortou o investimento entre 2011 e 2015 e que levou ao envelhecimento de comboios e barcos, à deterioração da rodovia e ferrovia, e à suspensão de novas obras. E que apesar de dizer mal dos transportes públicos se juntou ao PS na discussão do orçamento e fez chumbar as propostas para o aumento do investimento proposto pelos três partidos mais à esquerda.

O caso do barco da Soflusa "invadido" por passageiros em excesso foi várias vezes citado - o ministro até acabou por garantir que a outra embarcação que está em manutenção chega ainda esta semana - mas o comunista Bruno Dias deu-o como exemplo de uma filosofia. "O problema não é só o que aconteceu ontem, nem de um barco específico. É de uma política de indigência de décadas que continua", recordando que PSD e PS continuam a juntar-se para travar o investimento nos transportes públicos. 

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