Antonino Ponte empresário

Venezuela

O "chefe" do restaurante dos políticos

Ouve-se Antonino Ponte descrever o El Barquero e a primeira ideia que surge é um restaurante por fora e uma equipa de futebol por dentro. “Um restaurante é como uma equipa de futebol. Temos de ter um treinador e os melhores jogadores, para jogarmos bem e sermos campeões. E tal como o Cristiano Ronaldo emigrou para ser o melhor futebolista do mundo, eu emigrei para me propor ser o melhor na restauração”.

O ceviche de peixe, que pode ser de salmão, lagostim ou de peixe-branco, o cherne grelhado na brasa e os pratos de arroz são a imagem de marca do El Barquero, no centro de Caracas e considerado um dos melhores restaurantes da Venezuela. Quem lá entra lê sempre no seu frontispício: “Embaixada dos mares em Caracas”. Já era um estabelecimento de qualidade quando Antonino Ponte, madeirense e emigrante tal como Cristiano, o adquiriu há 28 anos ao seu primeiro proprietário, de origem galega.

Antonino Ponte manteve-o como restaurante de mar e preserva até hoje clientes desse tempo. “Se me proponho, tenho que ser o melhor”, sublinha o emigrante inspirado no futebolista. Tem uma capacidade de 250 pessoas, que enche todos os dias da semana, à excepção de segunda e terça — “é igual em todo o mundo” — e dois tipos distintos de clientela: executivos durante a semana, famílias ao fim-de-semana.

O antigo operador da central hidroeléctrica da Ribeira da Janela da EDM — Electricidade da Madeira foi passar férias à Venezuela, em 1977, tinha então 22 anos, e não voltou. “A minha família só dizia maravilhas disto, vim conhecer e fiquei”. Com uma grande ajuda de um primo, que o considera “como pai”, ficou na Venezuela. Foi seu empregado até chegarem a sócios, relação que ainda mantêm em três restaurantes. “Ele foi a pessoa que me abriu portas e eu abri mais portas”.

Hoje, o que diz o treinador dos seus jogadores é “muito treino e confiança” e com os incentivos devidos. “Como fizeram comigo”. Os seus funcionários são normalmente madeirenses e venezuelanos. “Treino-os, aprendem tudo ao longo dos anos e são da minha confiança”. Quando algum se lança num projecto próprio com possibilidade de ser um bom restaurante, o que já aconteceu várias vezes, apoia-os na fase inicial, como sócio, e tem-se dado bem com o modelo.

Sabe o que é viver num sítio que não dá perspectivas e o ar que entra quando “se abre portas”. “A Madeira é uma ilha pequena. Não temos opções. Para quem tinha sonhos de melhor qualidade de vida, para triunfar na área da restauração, não havia opções. Há 39 anos, era preciso ter-se contactos ou era uma aventura perdida”.

Na Venezuela viu os regimes políticos mudarem e os costumes também, mesmo os mais pequenos. Por exemplo, o uísque com água e gelo que se bebia durante as entradas e com os aperitivos, para depois passar ao vinho durante a refeição, e de novo ao uísque à sobremesa, deixou de existir. Nas últimas duas décadas, os venezuelanos tornaram-se mais europeus. O uísque continua a pedir-se, mas apenas para a sobremesa. E depois veio a crise. O emigrante comenta que “obviamente já não é a mesma coisa. Há uma crise”.

No El Barquero, a crise sente-se mais ao nível de produtos do que no número de clientes. “Temos dificuldade em conseguir mercadoria e, querendo dar qualidade aos clientes, o que lhes digo é ‘desculpe, acabou’ ou ‘ainda não trouxeram mercadoria hoje’”.

Antonino Ponte admite que o seu restaurante é procurado pela classe política e, numa certa altura, “foi restaurante de Presidentes da república, na república anterior”. Hoje não, mas “no El Barquero não há distinção de quadrantes políticos. Todos são bem atendidos”. Os políticos continuam a aparecer no seu restaurante, mas como este madeirense não é político, acredita que é com as pessoas que a Venezuela vai superar a crise “porque são as pessoas que fazem o país”. Por isso, acredita que “2017 vai ser um grande ano”.

Lurdes Ferreira

Ricardo Almeida cientista

Antárctida

“O tipo dos radares e do GPS”

Está uma tempestade tão agreste lá fora que até impede Ricardo Almeida de sair de casa. E este até é um dia normal, ou não estivesse o engenheiro electrotécnico, de 34 anos, na Antárctida. “Se estivesse um tempo destes em Portugal, havia árvores a cair pelas ruas e tínhamos um estado de emergência declarado”, conta-nos ao telefone da Base Halley VI, do British Antarctic Survey (BAS), localizada na costa da Antárctida oriental. É assim que comunica com a família em Portugal. Também podia fazê-lo na Internet, pelas redes sociais, mas este serviço é por satélite e a cobertura é muito “fraquinha”.

Estar na Antárctida está a ser uma verdadeira aventura para Ricardo Almeida. Nascido e criado em Campinho, uma aldeia do concelho de Reguengos de Monsaraz com cerca de 700 habitantes, decidiu concorrer a uma candidatura do BAS, com sede em Cambridge, no Reino Unido. Depois de se ter licenciado em Física e Química, na Universidade de Évora e tirado mestrado em Engenharia Electrónica e Telecomunicações, Ricardo Almeida ainda trabalhou numa empresa em Lisboa, e assume: “Estava cansado de fazer relatórios e apresentações em PowerPoint.” Por isso, a Antárctida foi o caminho certo para sair da monotonia: “Afinal, o que gosto é de resolver problemas.”

E que problemas resolve ele na Antárctida? “Sou o tipo dos radares e do GPS.” É responsável por dois radares de média frequência, que servem para estudar a atmosfera e são usados para fazer previsões de meteorologia espacial. Agora, Ricardo Almeida está a trabalhar no deslocamento da base em cerca de 24 quilómetros para nordeste. “O bocado de gelo onde estamos está a partir-se e temos já uma fenda. Vai isolar a estação”, explica-nos, dizendo que dá indicações para a deslocação a partir de GPS. A Halley VI encontra-se instalada numa placa de gelo e a fenda de que Ricardo Almeida fala estava adormecida há 35 anos. Despertou agora.

E será que esse despertar está relacionado com o aquecimento global? “É difícil dizê-lo nesta altura. Mas é possível que o aumento da temperatura do oceano possa estar a dilatar o gelo e, com isso, aumentar a fenda.” Afinal, foi na Base Halley, em 1985, que se descobriu o buraco na camada de ozono.

E não é fácil ser o “tipo dos radares” na Antárctida. Quando a temperatura fica demasiado baixa, os radares ficam rodeados de gelo. Quem tem de ir quebrar o gelo? “O Ricardo da Antárctida”, como se auto-intitula. No Verão (que corresponde ao nosso Inverno), até não é muito árduo. O problema é quando chega o Inverno e há dias em que não se vê nada. Pois, Ricardo Almeida é um invernante. Se agora, que é Verão na Antárctida, está com mais 80 pessoas na base, no Inverno são 13 pessoas.

No primeiro trimestre de 2017 regressa a Portugal, mas ainda não perdeu muito tempo a pensar nisso. As duas realidades são tão diferentes que está já com saudades do seu país natal e da Antárctida ao mesmo tempo. “Desde há um ano que a minha realidade é isto: o azul do céu, o branco da neve ou o azul do mar. Não há relevo, não há rochas. Temos o privilégio de ter um horizonte que se estende por quilómetros.” Contudo, os acontecimentos de 2016 deixam-no apreensivo quanto ao investimento na ciência: “É certo e sabido que a saída do Reino Unido da União Europeia, o ‘Brexit’, afectou o orçamento de ciência do país.”

Mas enquanto não voltar a Portugal, vai trabalhar até ao último segundo. Não é todos os dias que se está na Antárctida: “Tinha visto muito poucas vezes neve. Sendo um alentejano, só tinha visto neve uma vez na vida, que é uma coisa com que os meus colegas daqui gostam de gozar comigo”, diz, divertido, ouvindo-se sempre com um intervalo de dois segundos que vão separando o telefonema do PÚBLICO para a Antárctida. Afinal, está a 15 mil quilómetros de Portugal.

Teresa Serafim

David Domingues missionário comboniano

Filipinas

“Estamos ao lado do povo”

No seu primeiro trabalho de missão, depois de cinco anos em Famalicão dedicados à animação juvenil e missionária, David Domingues esperava ser enviado para o Quénia, mas a proposta dos superiores da congregação dos Combonianos foi outra: Filipinas. O missionário ainda se lembra da surpresa desse momento, vai para 14 anos. “Era um campo novo de trabalho para nós e eu aceitei o desafio”.

As Filipinas, o destino que lhe baralhou as previsões e do qual faz um balanço positivo é um dos maiores países cristãos do mundo, com fortes carências sociais, económicas, políticas. “Tenho encontrado muitas experiências. Vale a pena servir onde estamos plantados”, diz o missionário “plantado” em Sucat, na zona metropolitana sul de Manila e onde vai ficar mais tempo do que pensava, porque as Filipinas voltaram a baralhar-lhe os planos. No final do ano passado pensou que a rotação de cargos própria da congregação o iria levar para outro destino, mas foi-lhe pedido e aceitou continuar nas Filipinas, já não como responsável editorial da edição local da World Mission, mas para começar um trabalho novo, de coordenação, como provincial. É o que faz desde 1 de Janeiro este missionário de 44 anos.

Responde que as suas preocupações para 2017 fazem eco da “realidade social de grande pobreza” do país e da actualidade política, “com um Governo a eliminar a droga, sem regra nem respeito pelas pessoas”.

“Causa-nos muita preocupação, sentimo-nos pequenos perante uma máquina política engenhosa, vamos continuando a lutar e a aproveitar as oportunidades de fazer valer a nossa presença e a nossa voz para alimentar a esperança junto do povo. Como missionários, estamos ao lado do povo”. Há três semanas, a missão em Manila realizou uma acção de ajuda a famílias carenciadas. “Há muita gente que não tem acesso às coisas mais básicas”, como comer três vezes por dia, sublinha.

No meio de todas as dificuldades que enfrentam, há um período do ano que é “tudo” para os filipinos. O Natal é “a celebração mais importante do ano”, vivendo-a com uma “intensidade muito grande”, diz David Domingues. Começa no início de Setembro e vai até à noite de 24 de Dezembro. Nos últimos quatro dias destes quatro meses ocorre a novena de Natal a que os filipinos chamam Simbang Gabi: vão à missa todas as madrugadas, pelas 4h00, para depois seguirem directamente para o emprego, num país em que o dia começa muito cedo por causa do calor. Por estes dias, a máxima anda pelos 32 graus Celsius e a mínima pelos 23, com elevados níveis de humidade.

A Ásia é o campo de missão mais recente dos combonianos, a congregação que nasceu com o italiano Daniel Comboni, no final do século XIX. A África Central foi o primeiro destino, seguiu-se a América, no pós-II Guerra Mundial e, a partir de 1988, a Ásia. Os últimos dados disponíveis indicam que, em 2011, a congregação contava com 1639 missionários, de 33 países, em vários pontos do mundo.

Lurdes Ferreira

Paulo Cunha Alves embaixador

Austrália

A diplomacia “entre dois mundos”

É o diplomata mais distante do Palácio das Necessidades. Paulo Cunha Alves é embaixador em Camberra, a capital da Austrália, a mais de 18 mil quilómetros de distância de Lisboa e a um dia de diferença após três cansativas ligações aéreas. Está do outro lado do mundo, representante diplomático de Portugal na 12.ª economia mundial, com uma escassa comunidade emigrante ou luso-descendente de 50 mil pessoas, metade das quais em Sydney, mas observador de uma realidade diferente. Como um país como a Austrália, de memória europeia pela influência britânica, joga hoje entre duas forças: os Estados Unidos e a China.

Embora os chineses sejam o principal mercado para os australianos e os segundos maiores investidores no país através da aquisição de propriedades — no Norte compraram recentemente uma extensão comparável à de Portugal continental —, Camberra tem criticado as pretensões de Pequim no mar da China. “A Austrália está entre dois mundos, os Estados Unidos e a China, o que vai ser complicado, tanto mais que há o factor-surpresa da política externa norte-americana. Tudo depende dos conselheiros que rodearem o Presidente eleito, Donald Trump”, refere o diplomata.

Apesar da relação australiana com a Europa ser tão ténue como longa é a distância, o embaixador de Portugal não desvaloriza a repercussão dos episódios da política europeia. “Houve influência do “Brexit” porque há uma relação privilegiada com o Reino Unido, embora os países europeus não apareçam entre os de mais contacto. Estes são, sobretudo, os asiáticos — China e Japão —, os Estados Unidos e só depois a Europa, sobretudo o Reino Unido”, enumera. Contudo, o resultado do referendo em Itália foi uma das notícias de primeira página da imprensa australiana, numa estratégia que sempre destaca uma visão negativa da União Europeia.

“Estão mais interessados em estabelecer relações económicas com a Ásia, Singapura, Coreia do Sul, Japão e China, com os quais têm acordos de comércio livre e mandam os jovens australianos estudar as línguas dos povos asiáticos”, admite Paulo Cunha Alves. O seu trabalho como diplomata cobre o continente australiano, a Nova Zelândia e 14 Estados-ilha do Pacífico Sul. “Sou obrigado a viajar, mas não há grande margem de manobra financeira. Ir à Nova Zelândia implica seis horas de voo e ir às ilhas Fiji é uma viagem de 16 horas com ligações”, observa. Com cinco funcionários, a representação diplomática portuguesa em Camberra é uma das 108 embaixadas naquela capital.

A cidade de 260 mil habitantes é povoada quase exclusivamente por funcionários públicos e diplomatas, mas é uma urbe sem frenesim. “A grande vantagem é a qualidade de vida”, refere o embaixador. O óbice o preço de vida e o hábito é prescindir de memórias portuguesas: “Durante o período de expediente, devido à diferença horária, é difícil falar com os colegas de Lisboa. Informo-me com o boletim diplomático, o Expresso que recebo pela mala diplomática e pela variante Ásia da RTP Internacional.”

Algo tão prosaico como um pastel de bacalhau só em casas de amigos, ou em Sydney. “Há cadeias internacionais que aludem ao galo de Barcelos, como o Nando's, nascido na África do Sul, e que é o de mais aproximado que existe da iconografia do frango na brasa. Paulo Cunha Alves e a sua mulher vingam-se com um projecto já concluído: o lançamento do livro Do Oriente ao Ocidente, o relato da história de Portugal através da produção da Companhia das Índias. “Então, no século XV, fomos os primeiros responsáveis da globalização”, sintetizam os autores.

Nuno Ribeiro

Ana Jahufer professora de crianças com necessidades especiais

Nova Zelândia

"Não nos podemos desligar do que se passa"

Em Palmerson North, uma pequena cidade da Nova Zelândia que não chega aos 100 mil habitantes, a qualidade de vida e as oportunidades de emprego são animadoras, diz Ana Jahufer. “Não temos extremismos, populismos nem terrorismo, mas ao vermos o telejornal não nos podemos desligar do que se passa no mundo, sobretudo nos EUA”. Com o voto de que “tudo o que vem aí de negativo não seja tão mau como estamos a pensar”, esta professora de crianças com necessidades especiais admite que as boas perspectivas materiais não são tudo: “Sentimos falta da família, do seu apoio e da sua companhia, estamos muito sós”.

É o terceiro continente em que esta emigrante, de 61 anos, vive, depois de ter nascido em Portugal, ter estudado na ex-União Soviética, ter ido para a Austrália e, finalmente, para a Nova Zelândia. À procura, com o marido, de uma vida melhor, encontrou-a na Nova Zelândia. “É um país fantástico”. Com qualidade ambiental, estabilidade e prosperidade que se notam, por exemplo, no ensino público. “Não há necessidade de procurar uma escola privada porque as públicas são muito boas”.

Na ex-URSS conheceu e casou com um cingalês. Com os cursos terminados em 1983, viveram seis anos em Portugal, mas a incerteza financeira que atravessava então a Estação Agronómica de Oeiras, local onde ele trabalhava, motivou-os a emigrar para a Austrália. A primeira paragem foi em Nova Escócia do Sul, pequena cidade com 10 mil habitantes no meio do bush australiano, no Departamento de Agricultura.

Após o doutoramento do marido, rumaram ao estado de Hamilton, e ao nascimento do segundo filho. Ana optou nessa altura por ser mãe a tempo inteiro até os filhos ganharem alguma autonomia. Quando entraram para o básico, candidatou-se a um emprego na escola. “Passava a ter os mesmos horários que eles e a vida ficava mais fácil”. Passou a ser auxiliar de estudos, apoiando os professores nessa tarefa. Com os filhos mais crescidos, era hora de “fazer uns cursos, que foram vários”. E foi assim que há cerca de 20 anos o seu interesse em crianças com necessidades especiais e no seu ensino se transformou na sua profissão.

Em 2002, uma proposta de emprego na Nova Zelândia levou a família a mudar de terra, que adoptou até hoje. Em Palmerson North, o marido de Ana ensina na Universidade de Massey, ligado ao Departamento de Genética de Plantas, e os filhos já se licenciaram. Ana diz que se sente feliz com o que os filhos alcançaram e com as profissões que escolheram (arquitectura e económicas e financeiras). “Acreditamos que vão conseguir os seus objectivos”.

Lurdes Ferreira

Pedro Delfino cônsul honorário

Omã

Um “empreendedor” de olhos na paz

Na rota de quem emigra para o Médio Oriente os destinos prováveis são Dubai, Doha e Riade. Para trabalhar durante uns meses ou anos, não tanto para viver. Não foi a opção de Pedro Delfino, que chegou há 17 anos a Omã e é um dos raros portugueses instalados no país. Não se lhe ouve outro plano que não seja continuar a viver no discreto sultanato, liderado há 46 anos por Qaboos bin Said Al Said, “promovendo Portugal”.

Pedro Delfino assume-se como um “empreendedor”. O jovem nascido no Algarve, onde era professor de ténis, foi desafiado então a dar aulas no Médio Oriente e é hoje, com 42 anos, empresário e cônsul honorário de Portugal em Omã. No seu percurso criou uma empresa ligada ao desporto, para eventos e comércio de artigos desportivos, e lançou a primeira escola de futebol no território, com parceiros locais. Ao longo dos anos foi construindo a certeza de que “promover Portugal” é a sua prioridade. Dedicou-se também à importação e comércio de produtos nacionais mais tradicionais, como o vinho e o bacalhau, e inovadores como o calçado de cortiça. Defende que as oportunidades de aproximação entre os dois mercados vão mais além, no turismo, na energia renovável, entre outros. Dá como exemplo a construção "chave na mão" de um novo hospital em Mascate ter sido entregue a uma empresa portuguesa e o concurso de gestão de resíduos urbanos da capital ter sido ganho também por outra empresa nacional.

Com a nomeação como cônsul honorário, há quase três anos, “representar Portugal” traduziu-se na “honra de ser reconhecido pelo Governo de Omã” e em novos projectos, entre eles a criação de um centro de negócios para promover Portugal. “A marca portuguesa não é conhecida em Omã. É preciso mostrar, tal como faz a Coreia do Sul, que também construiu um centro de negócios onde faculta toda a informação”. É uma infra-estrutura que “vale a pena”, sublinha, convicto de que ajudará a captar novo investimento. Não tem dúvidas de que “não há melhor promotor de Portugal em Omã desde há 17 anos”, e que o que faz “sem apoios podia ser, com apoios, muito mais”.

Se, por um lado, a marca portuguesa deve ser promovida, por outro, quem procura mercados externos tende a preferir o Dubai e Qatar em vez de Omã, sendo todos eles territórios muçulmanos sem extremismos, abertos ao mundo. Pedro Delfino vê os dois primeiros mercados “saturados e muito competitivos”, pelo que é mais difícil aceder a eles. Com mais potencial de negócios no imediato, acredita que Omã tem ainda mais vantagens no médio prazo. O Iémen é um país que, diz, “entrará em reconstrução dentro de uns anos e o único ponto de acesso seguro é Omã e o seu porto de Salalah”.

Vivendo no mais discreto e estável país do Médio Oriente, sem extremismos, Pedro Delfino deseja mais tolerância e mais oportunidades para a paz, em 2017. Tal como as tem na terra onde vive e onde se encontra hoje uma comunidade de 250 portugueses. “A minha cor, a minha religião e a minha nacionalidade nunca foram problemas em Omã, bem pelo contrário”, garante.

Lurdes Ferreira

Tomé Costa gestor de projecto

Itaipu

"Acho que vai dar certo"

No rio Paraná, que desenha a fronteira entre o Brasil e o Paraguai, a Barragem de Itaipu é um gigante que domina a região. A central eléctrica era a maior do mundo em capacidade, até à construção da Três Gargantas, na China, mas continua a ser a que mais electricidade produz no planeta, alimentando simultaneamente os dois países fronteiriços. Este é o principal local de trabalho de Tomé Costa, desde 2014, no lado brasileiro. “Reparto o meu trabalho entre Brasília, Campinas, Belo Horizonte e Foz do Iguaçu. Mas nesta é onde passo 90% do meu tempo agora”, diz.

O engenheiro electrotécnico, de 31 anos, não trabalha na barragem, mas está lá por causa dela e os seus interlocutores são os operadores da central. Em 2014, a Itaipu e o CEEIA, o centro português de engenharia de Matosinhos, lançaram em parceria o projecto de mobilidade inteligente (Mobi-i), na Foz do Iguaçu. Trata-se da concepção e desenvolvimento de um modelo de partilha de veículos de frota, que começou por ser apenas eléctrica, podendo ser alargada a toda a frota que inclui veículos de combustão, caso Itaipu assim o queira. “É uma iniciativa no Brasil de car sharing para os funcionários de uma empresa”, sublinha. O projecto procura uma gestão sustentável e optimizada da frota de 250 veículos que a empresa tem para os seus 1500 funcionários (parte brasileira). O potencial de optimização é grande, estimando-se que a utilização de 20 a 30% dos veículos pode ser substancialmente melhorada. Indicadores, monitorização, partilha de informação em tempo real são elementos fundamentais produzidos e desenvolvidos neste projecto que começou apenas com veículos eléctricos. Os veículos de combustão não geram tanta informação como os eléctricos, “mas é possível optimizar a sua utilização”.

O impacto deste projecto na empresa é reduzir custos? “A Itaipu é uma empresa muito grande, com uma facturação milenária. Nos últimos anos quer construir o seu legado de mais sustentabilidade e de uma imagem de responsabilidade social. Não é tanto a necessidade económica”.

No perímetro da Itaipu, e por causa desta, nasceu uma pequena cidade, com três universidades, um centro tecnológico — que com o Mobi-i passou a albergar um centro de operação para projectos na área da mobilidade —, bancos, restaurantes e estradas para se circular. Para Tomé Costa, o novo laboratório “é uma infra-estrutura destinada a desenvolver tecnologia”. Itaipu é 23 vezes maior do que o Alto Lindoso.

Na parte minoritária do seu tempo de trabalho, que tenderá a aumentar dentro de uns meses, Tomé Costa acompanha projectos semelhantes e também de parceria em Brasília, Campinas e Belo Horizonte, antevendo que este último será, dentro de uns meses, “um dos mais relevantes, não só a nível da cidade, mas de política estadual [Belo Horizonte]”.

No país que atravessa hoje uma fase difícil mas que “tem um potencial tremendo para explorar”, Tomé Costa vê que as questões ligadas à mobilidade inteligente estão a desenvolver-se no país. A escala do Brasil cria não só grandes oportunidades. Na área que melhor conhece refere microempresas de bike sharing “que dão certo” e novas iniciativas políticas que aprofundam o tema, como uma que nasceu recentemente por pressão da sociedade civil. “São reuniões mensais de um conjunto de deputados que discutem com especialistas questões desde bike sharing, mobilidade inteligente, cidades inteligentes”, entre outras, repartidas por grandes áreas que incluem políticas públicas, sistemas de informação e mobilidade. A ideia é que o conhecimento mais detalhado dos parlamentares sobre estas “zonas cinzentas” ajuda a definir melhores políticas públicas. “Acho que vai dar certo”, diz Tomé: a iniciativa e o país.

Lurdes Ferreira