Fugas de informação durante o interrogatório de Sócrates sob investigação

Juiz Ivo Rosa mandou extrair uma certidão para investigar as fugas de informação que ocorreram durante os cinco dias do interrogatório do antigo primeiro-ministro a pedido do procurador Rosário Teixeira. Os Advogados concordam com a averiguação para evitar uma suspeição generalizada sobre a classe.

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Juiz ameaçou apreender os telémoveis dos advogados no segundo dia do interrogatório de Sócrates LUSA/MANUEL DE ALMEIDA

O Ministério Público (MP) vai investigar as fugas de informação que terão ocorrido durante os cinco dias do interrogatório de José Sócrates, no âmbito da fase de instrução do processo da Operação Marquês. Já terá sido extraída uma certidão para o efeito depois de um pedido feito pelo procurador Rosário Teixeira ao juiz de instrução Ivo Rosa.

Em causa está o facto de o juiz ter advertido os advogados para aquilo que entende ser o seu dever de sigilo, no segundo dia de interrogatório, dia 29 de Outubro, sobre as notícias que saíram, quase em tempo real em alguns órgãos de comunicação no dia anterior, isto é, no dia 28 de Outubro.

Ivo Rosa ameaçou apreender os telemóveis, caso essa fuga de informação continuasse a ocorrer.

Facto é que, segundo o PÚBLICO apurou, o juiz apenas cumpriu com a ameaça no último dia de interrogatório, ou seja, na segunda-feira, dia 4 de Novembro.

E as várias fontes ouvidas pelo PÚBLICO confirmaram que foi de comum acordo que os advogados e até os procuradores do MP entregaram os respectivos telemóveis e tablets.

Aliás, nenhum dos advogados deste processo manifestou, até ao momento, intenção de apresentar queixa contra o juiz pela decisão.

Pedro Delille, advogado de José Sócrates, confirmou que o acordo foi unânime e que o que se veio a verificar “é que mesmo assim ocorreram fugas de informação” e que concorda que se investiguem.

Fonte ligada ao processo afirmou ao PÚBLICO que a certidão não visa advogados em concreto, mas para já, tem na mira apenas dois órgãos de comunicação que terão reproduzido as declarações do antigo primeiro-ministro ainda os interrogatórios não tinham terminado.

A propósito desta questão, Guilherme Figueiredo, bastonário da Ordem dos Advogados, disse ao PÚBLICO, que concorda com a investigação, de forma a tirar dúvidas e suspeições que parecem recair sobre os advogados deste processo. “É preciso saber também se as fugas de informação foram por culpa de advogados ou de outros intervenientes”, disse, sublinhando que só pode estar em causa um crime de desobediência ao divulgar-se a informação se o juiz fez uma advertência nos termos legais às partes processuais. “A advertência é central para a possibilidade de estar em causa um crime de desobediência simples, mas não foi feita qualquer advertência formal. Não tendo existido a advertência não é possível estarmos perante um crime de desobediência simples”, explicou.

Ordem dos Advogados reage

O Conselho Regional de Lisboa da Ordem dos Advogados já reagiu, afirmando, em comunicado, que a decisão do juiz Ivo Rosa de apreender os telemóveis e tablets “foi interpretada como uma atribuição de responsabilidade aos advogados pelas fugas de informação do processo Operação Marquês”.

“É inaceitável que sejam os advogados publicamente responsabilizados pelas fugas de informação de um processo que, desde o início e durante a fase de inquérito, em que os advogados não tinham acesso ao processo, foi objecto de constantes violações do segredo de justiça e sistemáticos atropelos aos direitos de defesa dos arguidos nele visados”, prossegue o comunicado.

O Conselho Regional de Lisboa da Ordem dos Advogados refere ainda que “desde detenções em directo, passando por peças processuais escancaradas nas páginas dos jornais até à reprodução televisiva de inquirições de arguidos e testemunhas, tudo se passou como se nada de anormal se passasse”, acrescentando que “não pode por isso deixar de rechaçar qualquer tipo de imputação que, directa ou indirecta, sobre os Advogados faça recair o odioso da mediatização de mais um processo judicial, ante a completa impotência dos seus titulares na fase de inquérito, quando tudo se iniciou, de impedir a sua escalada”.

A nota sublinha ainda que, actualmente, a prática da profissão “não é dissociável do uso de equipamentos electrónicos como telemóveis, tablets e outros equipamentos portáteis que constituem instrumentos de trabalho que permitem o registo e armazenamento de informação e o acesso a bases de dados de suporte à actividade dos advogados em tempo real”.

Esta situação, de alguma forma, servirá de exemplo para evitar mais fugas de informação nas próximas diligências, já que a fase de instrução ainda não terminou. Dia 27 de Novembro está marcado o interrogatório de Carlos Santos Silva, amigo de José Sócrates, que também é arguido no processo.

E para o inicio de Dezembro ficaram marcados os interrogatórios dos ex-ministros socialistas Mário Lino, Maria de Lurdes Rodrigues e António Mendonça, arrolados por José Sócrates como testemunhas.

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