A palavra escolhida por Lígia é precisamente a primeira barreira na hora de fazer comparações. O sistema de saúde holandês é frequentemente apontado como um dos melhores da União Europeia e é citado pela Organização Mundial de Saúde como exemplo em vários relatórios. A realidade contrasta claramente com a portuguesa: 30% das crianças nascem em casa com apoio dos serviços de saúde. Em 2014, a associação sueca de consumidores Health Consumer Powerhouse colocou o sistema holandês pela quinta vez consecutiva no primeiro lugar do ranking que faz para 36 países europeus. De um total de 1000 pontos que avaliam várias áreas, dos direitos dos doentes, ao acesso aos serviços de saúde, passando pela prevenção e pelos resultados, conseguiu quase 900. Portugal ficou neste ano em 13º lugar, com 722 pontos, o que representou apesar de tudo uma recuperação de três lugares em relação ao índice europeu de saúde dos consumidores de 2013. Mas houve um alerta sobre as assimetrias.
Além dos diferentes resultados, há algo na génese dos sistemas que dificulta paralelismos. Em Portugal há o Serviço Nacional de Saúde, geral, universal, tendencialmente gratuito e financiado maioritariamente através dos impostos – incluído naqueles a que se costumam chamar os modelos beveridgianos, que têm como base a fiscalidade. Na Holanda, uma grande reforma introduziu em 2006 o seguro privado básico de saúde obrigatório. Este substituiu a coexistência de sistemas públicos e privados baseados em seguros de saúde maioritariamente pagos através das empresas e geridos pelos chamados fundos de doença – o chamado modelo bismarckiano. A reforma manteve o sistema assente em seguros, mas pretendeu unir as várias realidades existentes e dar mais força aos cuidados de saúde primários.
O principal objectivo foi “resolver o problema financeiro dos custos crescentes em saúde, mas também a desigualdade no acesso a cuidados de saúde e o crescimento das listas de espera para algumas pessoas”, explicou ao PÚBLICO o holandês Chris van Weel, professor emérito de medicina geral e familiar na Universidade de Radbound, em Nijmegen, na Holanda. No entanto, o também professor em investigação em cuidados primários na Universidade Nacional da Austrália, em Camberra, adverte que as reformas não podem ser feitas ao sabor de mudanças políticas rápidas: “O que encontramos hoje na Holanda é o resultado de algo criado ao longo de muito tempo. Temos mudanças recentes, mas o desenvolvimento dos cuidados de saúde primários é algo com história e passado. Essa é a primeira coisa a reter da nossa experiência: é preciso perceber o tempo que demorou.”
Chris van Weel adverte que nem sempre o caminho foi fácil. “Os doentes ficaram muito preocupados com uma eventual perda de direitos em 2006 e lutaram muito cedo por coisas como a manutenção do médico de família e das listas. Outra ideia retida foi a de que o seguro básico teria de incluir os cuidados de saúde primários sem co-pagamentos”, acrescenta. Aliás, a escolha do médico de família, desde que haja vagas, é livre e o mais comum é trabalharem em consultórios particulares com poucos médicos. A integração de cuidados com outros profissionais é feita sobretudo pelo recursos a bons sistemas de informação. Quase todos os processos clínicos estão em formato electrónico e acessíveis em qualquer unidade de saúde. Os doentes também podem mudar de seguradora todos os anos. Só 1% da população não tem o seguro - quem não o tiver, pode ser multado.
Uma reforma em plena Segunda Guerra
O investigador insiste que este foco resulta da história e cultura holandesa. “O sistema de saúde começa em 1941, quando estávamos ocupados pela Alemanha. A Holanda foi o primeiro país a ter legislação para organizar a forma como as pessoas contactam o sistema de saúde. Nessa altura foi definido que o primeiro ponto de contacto era o médico de família. Foi nessa altura que criámos as listas”, reforça Chris van Weel.
Peter tem 42 anos, é holandês e formador (coach) na área empresarial. Lígia tem 38 anos, é portuguesa e veio viver para Amesterdão há um ano. Tal como o marido, é coach, mas na área familiar. Como todos os residentes na Holanda, tiveram de subscrever o seguro básico privado obrigatório, que custa cerca de 100 euros por mês, independentemente dos rendimentos. Destina-se a todos os que têm mais de 18 anos. As filhas, Adriana, de oito anos, e Alicia, com dois meses feitos no final de Junho, estão incluídas no seguro dos pais sem custos adicionais. Mas há ainda outros descontos para quem trabalha por conta própria ou de outrem. Os empregadores descontam uma percentagem por cada colaborador (cerca de 8% do salário) e o próprio contribui também com uma percentagem de cerca de 12,5% destinada ao equivalente à segurança social, com parte destas verbas a serem encaminhadas para a saúde.
É com essas verbas adicionais que o Estado volta a equilibrar o sistema. Ou seja, compensa as seguradoras pelas crianças incluídas e pelos doentes que representam maior risco de ter despesas, como os idosos ou doentes crónicos. Assim, as seguradoras não podem recusar doentes ou apresentar-lhes propostas mais caras pelos seus problemas de saúde, assegura Chris van Weel. As verbas servem também para compensar os doentes crónicos por terem custos mais avultados, através do chamado Exceptional Medical Expenses Act (AWBZ), e para reembolsar os que têm menores rendimentos. Isto porque, além do prémio mensal, os cidadãos têm também de pagar os primeiros 350 euros anuais de despesas de saúde, que não estão isentas de pagamento como forma de sensibilização para o uso.
Há também descontos para pessoas que adiram a programas de gestão de doenças como a diabetes ou a obesidade. Aliás, Van Weel lembra que quem tutela o sector é o Ministério da Saúde, Bem-Estar e Desporto – uma junção de pastas que denota uma visão “global e integrada” sobre o tema. Outros serviços como a adaptação das casas a pessoas com deficiência, idosos ou lares transitaram para os municípios. Os médicos de família recebem um valor fixo por cada doente e mais uma verba por cada consulta. Há também programas experimentais que compensam estes profissionais quando o controlo dos doentes crónicos é feito com bons resultados.
O pacote básico do seguro inclui os serviços dos médicos de família, parteiras e dos médicos de outras especialidades e hospitais, desde que o doente seja referenciado pelos cuidados primários e ainda comparticipação de medicamentos prescritos. No caso dos serviços hospitalares e de alguns medicamentos e exames, os primeiros 350 euros ficam do lado do doente, mas para o médico de família e cuidados para grávidas e crianças não há qualquer co-pagamento. O dentista apenas está garantido até aos 18 anos e depois dos 65, pelo que muitas pessoas contratam uma cobertura adicional para medicina dentária que regra geral ronda os 20 euros. O transporte de doentes em táxis e ambulâncias, quando considerado necessário, também está coberto, assim como outros serviços como dietista ou terapeuta da fala. Apenas algumas sessões de fisioterapia são pagas, com o doente a ter de assegurar o custo das primeiras dez. No entanto, para os doentes crónicos, esta despesa volta a ser assegurada.
Peter e Lígia não têm dúvidas de que o que pagam compensa. E garantem que o modelo aparentemente confuso e esquartejado tem largas vantagens. A começar pela relação próxima que têm com o “huisart”, o médico de família, a quem recorrem sempre em primeira instância, quando em Portugal “a relação não existia”. “Aqui em questões de saúde há mais a naturalidade. Confiamos no médico de família e sabemos que se na maior parte dos casos nos diz para ficar em casa com paracetamol é porque chega”, diz Lígia. Este é, no entanto, um dos factores mais criticados em fóruns online por alguns portugueses a viver na Holanda. A isso Lígia responde de novo com a mesma palavra: cultura. Adriana interrompe a conversa com uma experiência que mostra as diferenças difíceis de traduzir, nomeadamente na independência para as crianças. Tem de fazer uma prova de natação em que cai à água vestida. “É para saber nadar se, ao andar de bicicleta, cair a um dos canais”, explica. Outro exemplo citado pela menina é que, tal como os colegas, almoça sandes levadas de casa.
Nem a experiência do parto em casa mudou a visão de Lígia. Adriana nasceu num hospital em Portugal, mas Alicia nasceu no quarto dos pais. O parto durou cerca de quatro horas e as coisas precipitaram-se de tal forma que a parteira não chegou a tempo e foi Peter que assumiu os comandos. Lígia assegura que foi um caso absolutamente excepcional e diz que, no fundo, estavam preparados pela forma como decorreu a preparação para o parto. Nas consultas de grupo com a parteira falaram de vários cenários, escreveram um “plano de parto” e eram as grávidas que mediam a própria pressão arterial ou que controlavam a glicémia. “Sinto que fui mais dona do processo”, sintetiza. Mesmo com as diferenças, a mortalidade infantil na Holanda é apenas ligeiramente superior à portuguesa, mas a morte materna é menor.
As mudanças no pós-parto também são abismais. Mesmo quem tem o bebé no hospital, excepto nas cesarianas, costuma ter alta no próprio dia e para trás deixa quartos individuais com banheiras para fazer dilatação e bolas de pilates. Quando a família regressa a casa recebe a visita de uma enfermeira que vê se está tudo bem, faz o teste do pezinho, dá as primeiras vacinas e entrega um boletim com as consultas agendadas até aos quatro anos no centro destinado a crianças e que funciona num sítio distinto do consultório particular do médico de família. A partir dessa idade há algumas consultas asseguradas nas escolas. Nesse centro há os chamados médicos da infância, uma especialidade que não tem equivalente em Portugal. Os pediatras são reservados para os casos mais graves.
Lígia e Peter destacam também o papel da “kraamzorg”, uma profissional com formação nesta nova fase da família e que durante a primeira semana está na casa do casal. Ajuda com várias tarefas: de conselhos sobre amamentação à limpeza da casa, refeições ligeiras ou mesmo entreter o bebé ou filhos mais velhos. Tudo isto está incluído no seguro básico obrigatório e reforçam que a “dispersão” funciona de forma “integrada”.
A experiência integrada de Almere
Almere é uma cidade nova a 30 minutos de Amesterdão que deu os primeiros passos na década de 1970 e que conta com quase 200 mil habitantes, a um ritmo de quase mais 5000 pessoas por ano. O facto de ter sido criada de raiz, de ter uma população com rendimentos tendencialmente baixos e a inexistência inicial de um hospital obrigou a que os serviços de saúde fossem “pensados de forma ainda mais integrada e com uma aposta inevitável nos cuidados primários”, destaca Jan Herweijer, médico de família até 2007 e agora gestor no Zorggroep, o maior grupo prestador de cuidados de saúde em Almere. Case-study em muitos relatórios internacionais, Almere junta nos mesmos edifícios aquilo que é difícil visualizar no sistema de saúde aparentemente esquartejado de Amesterdão ou de outras zonas holandesas descrito por Peter e Lígia, onde os potentes sistemas de informação ajudam a gerar coesão e a guiar os cidadãos.
O centro de saúde visitado é um dos 23 do Zorggroep nesta zona e o maior de todos, com 13.500 pessoas cobertas. Chama-se Castrovalva e à distância – e mesmo à entrada – poderia passar por um centro comercial com uma fachada de pequenos tijolos que remete para um cenário espanhol. Na base do edifício existe logo uma farmácia e um centro especializado na saúde infantil, que tanto faz visitas domiciliárias como acompanha as crianças com e sem marcação. O hall amplo e luminoso no rés-do-chão deixa ver uma cantina aberta a toda a população com refeições saudáveis por oito euros – um valor baixo num país em que o salário mínimo é de 1500 euros.
No andar de cima funciona o equivalente a um centro de saúde como se conhece em Portugal, mas com algumas diferenças. Na televisão da sala de espera, quase vazia, a programação é direccionada para a promoção da saúde, mas também informa os utentes sobre quem está a trabalhar e um atraso de 10 minutos na consulta dá direito a um alerta no plasma. As salas dos consultórios não perderam o cheiro a novo e há muitos espaços dedicados a pequenas cirurgias conduzidas pelos médicos de família ou para que os doentes urgentes que fiquem resguardados dos restantes. Há salas para as parteiras desenvolverem os programas de saúde materna. A zona de atendimento telefónico também é especialmente grande, com Jan Herweijer a explicar que a formação das assistentes permite prestar algum aconselhamento telefónico mesmo em termos de medicação. Há ainda uma área para fisioterapia.
As instalações não servem só os cidadãos que vivem no exterior. Para um dos lados do centro de Castrovalva desenvolvem-se jardins e edifícios com fachada em madeira onde vivem os doentes internados em cuidados continuados e existe até uma residência dedicada a pessoas com demência, num total de mais de 50 vagas. Nessas alas vivem as pessoas que o sistema considerou terem necessidade de um apoio mais permanente dos cuidados primários, mas também doentes a recuperar por períodos mais curtos de acidentes vasculares cerebrais ou de cirurgias em que a recuperação pode ser feita fora do hospital, como a prótese da anca. No caso das demências, os doentes vivem em apartamentos para seis pessoas e o jardim tem portas com código que os impedem de sair para a rua. Os residentes mais permanentes decoram os espaços com mobília que trazem de casa, pelo que quase todos os quartos lembram uma casa dos avós. Em toda a Holanda os doentes podem também optar por receber parte do dinheiro que gastariam numa instituição e usá-lo para pagar a um cuidador informal, como um familiar ou vizinho.
Jonatas de Lemos tem 52 anos, é brasileiro e ortopedista. Veio para a Holanda há 15 anos e acabou por se tornar médico de família. Trabalha em Castrovalva e reconhece que a agregação de serviços ainda o impressiona, assim como a liberdade na organização do dia-a-dia. Quanto trabalham a tempo inteiro, na Holanda os médicos de família têm 2300 doentes nas suas listas – em Portugal são 1900. Mas Jonatas, como a esmagadora maioria dos médicos, acaba por ter menos porque trabalha apenas em part-time, quatro dias por semana – uma prática comum na Holanda, independentemente das profissões. No quinto dia os seus doentes ficam na mão de um colega e Jonatas de Lemos vê os doentes desse colega quando também ele está fora.
Além das consultas tradicionais, é também a Jonatas e aos médicos de família que cabem os cuidados paliativos domiciliários. Em parceria com enfermeiros treinados, deslocam-se várias vezes por semana a casa destes doentes e de todos os que não conseguem ir ao centro. A partir das 17h e até o centro de saúde reabrir, há um centro de atendimento nocturno que funciona junto do hospital local. As consultas com o médico de família duram apenas 10 minutos, o que é motivo de alguma insatisfação. Mas o médico assegura que o contacto próximo com os utentes e a facilidade com que se agendam consultas permite que este tempo chegue. “As consultas com as enfermeiras duram 30 minutos e nessas trabalha-se mais com os doentes crónicos ou estilos de vida”, ressalva.
“Comparativamente com outros países, pedimos menos exames, prescrevemos menos antibióticos e fármacos em geral. Como sabemos que estamos certos? Os dados, as estatísticas mostram-nos isso. Fazemos medicina baseada na evidência científica. Não vamos atrás do mais novo ou do mais caro. Se o medicamento mais barato resolve, então é esse que damos”, sintetiza Jonatas de Lemos, que reforça que é o primeiro ponto de contacto dos doentes e que ele próprio acciona uma ambulância quando necessário, não deixando de se colocar a caminho da casa do doente. No entanto, o clínico brasileiro reconhece que a literacia em saúde é superior na Holanda e que permite outra forma de trabalhar. Ainda assim, diz que muito do sucesso está no facto de trabalharem com protocolos e programas específicos para doentes crónicos, onde conseguem um desempenho ainda superior à média do país. Há várias doenças em que os indicadores são superiores aos portugueses, mas em alguns cancros a posição é pior.
Em casa com paracetamol
Um desempenho que Álvaro Faustino, 34 anos, e Elsa Faustino, 31 anos, tiveram de pôr à prova quando em pouco tempo se cruzaram com a combinação de um bebé prematuro com a palavra cancro. São ambos portugueses e vivem em Roterdão há nove anos. Saíram de Portugal “quando já se cheirava o que aí vinha” e depois de tropeçarem no desemprego. Ele trabalha na construção civil, ela nas limpezas. Foi aqui que nasceu a pequena Lisa, agora com quatro anos. Pequena é a palavra certa. Elsa vai buscar o caderno escrito em forma de diário, decorado com autocolantes mimosos e preparado pelas enfermeiras na maternidade onde Lisa passou as primeiras semanas de vida. Nasceu prematura, às 33 semanas de gestação e com 1,380 quilogramas.
Elsa deixou de sentir o bebé e foi encaminhada pela parteira para o hospital e acabou numa cesariana de urgência. Por isso, Lisa é seguida no centro para crianças mas também no pediatra. Com Lisa ainda pequena, Elsa palpava pouco depois um caroço na mama. Dirigiu-se ao médico de família, que no próprio dia accionou meios e colocou Elsa no dia seguinte num hospital a fazer todos os exames necessários. Veio o diagnóstico de cancro e exames adicionais. A cirurgia realizou-se em menos de três semanas. “É incrível a forma como nos referenciam e a qualidade em tudo”, diz Elsa.
“As coisas são muito diferentes e torna-se muito difícil comparar por causa da cultura. Em Portugal espirramos e vamos para o hospital. Temos a ideia de que o hospital é o sítio certo para tratar tudo e aqui não. Aqui confiamos e sabemos que temos de ir ao médico de família. Ficamos em casa com paracetamol e logo avaliamos. Há muitas pessoas que não lidam bem com isto”, ilustra Álvaro, que confessa que demorou a habituar-se. Agora gosta da tranquilidade de um país em que “todos somos saudáveis até prova em contrário” e sem “cultura da doença”. Elsa sublinha que a facilidade com que marcam consulta ou com que o médico pode vir a casa ajuda muito, mas reforça que aprenderam “a não stressar e esperar”. “Há casos em que telefono, receitam o que entenderem e vou directamente à farmácia porque a receita vai lá parar sozinha”, diz.
Bárbara Pais vive há dez anos em Amesterdão com o marido holandês Ewout Hiltermann. Têm ambos 35 anos. A designer partilha alguma da desconfiança inicial sentida por Elsa e por Álvaro, mas que aos olhos do piloto Ewout não faz sentido. “É incrível pensar em tudo aquilo que Portugal paga sem questionar. Não sei como não estão mesmo na bancarrota. Eu sei que descontam dos impostos, mas não têm impostos assim tão altos para aguentar coisas que nem me fazem sentido, como ir ao médico sem nada e trazer de lá uma receita”, resume Ewout. Bárbara agora está de acordo, mas demorou a acostumar-se e a perceber as vantagens. De tal forma que o primeiro filho do casal, Xavier, agora com quatro anos, ainda nasceu em Portugal. “Ia de propósito para ser vista lá e nasceu por cesariana”, conta.
Já a segunda filha, Nina, com quase dois anos, acabou por nascer na Holanda, também por cesariana devido a alguns problemas de saúde de Bárbara. A taxa de cesarianas é de apenas 15%, quando em Portugal ultrapassa os 30%, chegando mesmo aos 70% nos hospitais privados. Foi com a infância de Xavier e com a mudança para um médico de família de quem gosta muito que começou a admirar “a naturalidade holandesa” e a aperceber-se de que os portugueses, “adultos ou crianças”, estão “sempre a tomar alguma coisa”. “Fui-me apercebendo que gosto mais da mentalidade de cá.” Mesmo durante o acompanhamento da gravidez sentiu que se preocupavam mais com o seu bem-estar do que “com a obsessão de nos pesarem a toda a hora” e ficou maravilhada com a presença da “kraamzorg” já elogiada por Lígia e Peter.
Bárbara e Ewout são saudáveis e acabam por não ter muitas experiências com os serviços de saúde além das marcações com os filhos, ao contrário de Elsa por causa do cancro. Bárbara interiorizou que a promoção da saúde está para lá dos consultórios, mas mesmo assim ainda teve episódios caricatos. “Cheguei no Verão passado com análises que fiz em Portugal e o médico de família não percebeu porque tinha aquela lista toda. Até me senti envergonhada.” Sobre o receio de ter algo não diagnosticado, diz que é a relação próxima com o médico que permite mudar a forma de pensar e que “quando o médico diz alguma coisa sabemos que é mesmo preciso e isso dá confiança”. “Aqui, na Holanda, preocupam-se que nos sintamos bem e se nada indicar o contrário só vamos ao médico quando nos sentimos doentes. Em Portugal parte-se do princípio de que a pessoa está doente a não ser que algo prove que está saudável e por isso recebe-se sempre um medicamento. É uma diferença de filosofia, de cultura.”
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