Os filmes da vida de Manoel de Oliveira espectador
Casa do Cinema Manoel de Oliveira da Fundação de Serralves inicia este domingo um ciclo semanal com dez títulos da mesa-de-cabeceira do realizador. Abre com Max Linder, pioneiro francês do burlesco.
Quando se referia à sua experiência iniciática de espectador de cinema, Manoel de Oliveira (1908-2015) evocava normalmente em primeiro lugar o nome de Max Linder. No baú das suas memórias afectivas, precedia os outros nomes grandes do burlesco: Charles Chaplin, Buster Keaton e Harold Lloyd. A seguir ao realismo dos irmãos Lumière e à magia de George Méliès, Max Linder deu-nos “a expressão do cómico cinematográfico”, que, a partir de França, haveria de enformar – escreveu Oliveira (em Ditos e Escritos) – “as sucessivas expressões cinematográficas” que transformaram aquilo que começou por ser visto como um simples “espectáculo de feira” na depois designada Sétima Arte.
É com um filme deste actor, argumentista e realizador francês, Sete Anos de Pouca Sorte (1921), que a Casa do Cinema Manoel de Oliveira implantada em Serralves, no Porto, inicia este domingo, às 17h, o ciclo Manoel de Oliveira Espectador. Ao longo dos próximos três meses, em dez sessões semanais, o programa dará a ver uma selecção de obras que oferece “uma panorâmica das suas referências cinéfilas, começando pelas mais remotas”, diz o comunicado da instituição, dirigida por António Preto.
Sete Anos de Pouca Sorte é uma longa-metragem da segunda fase da curta, mas prolífera, carreira de Max Linder (1883-1925), por si realizada e interpretada no início da década de 1920, no decorrer da sua segunda estadia nos Estados Unidos. Na ressaca matinal de uma festa de despedida de solteiro, ‘Max’, alter ego do actor, confronta-se com um espelho partido (por um seu criado) em casa, situação que vai espoletar uma sequência de situações e gags – o historiador e crítico francês Georges Sadoul vê na “sua comicidade um claro parentesco com Buster Keaton” –, que confirmam o ditado “Espelho partido dá sete anos de azar”, referido no título do filme.
Dez filmes até Abril
Ao filme de Max Linder, segue-se, a 11 de Fevereiro, um título de outro cineasta francês, Marcel L’Herbier, A Desumana (1924). Por ordem cronológica, serão ainda apresentados ao longo deste ciclo A Paixão de Joana d’Arc (1928), de Carl T. Dreyer; Luzes da Cidade (1931), de Charles Chaplin – que sempre reconheceu em Max Linder o seu mestre (curiosamente, Luzes da Cidade, que Oliveira disse ter tido muita influência no seu Aniki-Bóbó, é agora o único título comum ao ciclo que a Fundação de Serralves e a Cinemateca Portuguesa promoveram em 2008, quando do centenário do realizador) –; O Atalante (1934), de Jean Vigo; As Noites de Cabíria (1957), de Federico Fellini; Deus e o Diabo na Terra do Sol (1964), de Glauber Rocha; Caça do Leão ao Arco (1965), de Jean Rouch, um particular amigo de Oliveira; Mouchette (1967), de Robert Bresson; e O Vento Levar-nos-á (1999), de Abbas Kiarostami.
“Esta primeira revisão das preferências cinematográficas de Manoel de Oliveira, sendo forçosamente pessoal e lacunar, traduz bem o gosto ecléctico de um realizador que, tendo visto de tudo (e tudo tendo visto acontecer), terá percebido melhor do que ninguém a tensão entre o transitório e o imutável, entre o passadismo técnico, a efemeridade das modas e a persistência do que nos define como humanos”, diz o comunicado da Casa do Cinema, lembrando o caso invulgar de um cineasta cuja vida longa lhe permitiu praticamente acompanhar a própria evolução da Sétima Arte, incluindo nela “a passagem do mudo ao sonoro, do preto e branco à cor, da película ao digital”.
“A obra de Oliveira sintetiza cumulativamente toda história do cinema, do mesmo modo que a sua experiência espectatorial resume o que pode entender-se como uma história da cinefilia”, acrescenta a Casa do Cinema.
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