Uma em cada quatro pessoas não segue indicações de prescrição de antibióticos

Estudo mostra que 14% dos inquiridos admitem ter antibióticos armazenados em casa e destes, mais de metade diz tê-lo desde o último tratamento.

Foto
Mais de metade dos inquiridos sabe que o consumo de antibióticos está ligado ao aparecimento da resistência aos antimicrobianos. JGS JOAO GUILHERME

Um quarto dos inquiridos num estudo nacional sobre o uso de antibióticos não segue as indicações de prescrição e mais de sete em cada dez não conseguem identificar o que tomaram.

De acordo com este estudo, feito pelo Grupo de Investigação e Desenvolvimento em Infecção e Sépsis (GIS-ID), com o apoio do Centro de Estudos Aplicados da Universidade Católica Portuguesa, apesar de ter melhorado o número dos que confessaram não seguir a prescrição face aos valores de 2020 (um terço), ainda assim "é um factor de preocupação".

"Há um nível de falência dos tratamentos por causa disso", disse à Lusa o presidente do GIS-ID, João Gonçalves Pereira, que alerta para a importância de as pessoas "se responsabilizarem pela sua saúde".

O responsável lembra que, "quando se começa o tratamento, os sintomas diminuem, mas sem resolver a infecção e, se a pessoa interrompe o tratamento, isso facilita a recidiva da infecção. E essa recidiva pode ser mais complicada, porque pode aparecer sobre a forma de abcesso, implicando tratamento com medicação, mas também tratamento cirúrgico".

Além disso - sublinha - "mais importante do que a pessoa interromper precocemente, é o problema de não cumprir o horário. Isto provoca uma exposição em concentrações subterapêuticas, o que facilita (...) o aparecimento de baterias, no limite, com resistências".

"É duplamente preocupante. Há estudos europeus que dizem que as taxas de não cumprimento podem atingir 50 ou 60%. É um problema transversal", afirma o médico, lembrando que há medidas que podem ajudar a diminuir o problema como usar antibióticos de dose única diária, tentar usar mnemónicas, como juntar o medicamento ao almoço, ao jantar ou ao deitar, para que as pessoas não se esqueçam".

Porque "nenhum doente deixa de tomar por maldade. É por distracção, por esquecimento", acrescenta.

O estudo - semelhante ao realizado em 2020 - mostra que aumentou o valor (80%) dos que apenas tomam antibióticos quando prescritos pelo médico (era 66% em 2020). "Parece haver maior aderência ao conselho médico, mas há uma grande desresponsabilização das pessoas pela sua própria saúde", sublinha o presidente do GIS-ID.

Não conseguem identificar o que tomam

O estudo, que pretendeu avaliar o estado actual do conhecimento dos portugueses em relação ao consumo de antibióticos e o potencial impacto destes comportamentos no problema da resistência aos antimicrobiano, mostra que 77% não consegue identificar o antibiótico que toma e nem sempre quem diz saber os identifica correctamente.

Os dados revelam ainda que aumentou o número de pessoas que referem que a duração do tratamento é a informação mais importante ao ser-lhe prescrito um antibiótico (de 37% em 2020 para 52% em 2022).

Sobre a importância de entregar os medicamentos que já não usa nas farmácias, apenas metade dos inquiridos disse que o faz. São principalmente as mulheres (30% vs. 20% dos homens).

Mais de um em cada dez (14%) admitem ter antibióticos armazenados em casa e mais de metade destes (57%) diz tê-lo desde o último tratamento. São mais os homens quem armazena medicamentos em casa (58% vs. 42%) e os mais velhos (mais de 55 anos) são quem menos o faz.

Questionados sobre para que servem os antibióticos, 42% indicaram que são para infecções causadas por bactérias, um valor que aumentou face a 2020 (36%).

Quanto à consciência sobre a resistência aos antimicrobianos, 30% nunca ouviu falar - uma melhoria ligeira face a 2020, em que 34% nunca tinha ouvido falar. São sobretudo as mulheres (54%) que consideram que este é um problema de extrema relevância e, principalmente, os mais velhos (mais de 65 anos, com 22%).

Mais de metade (54%) sabe que o consumo de antibióticos está ligado ao aparecimento da resistência aos antimicrobianos. Quem menos referiu ter conhecimento foi a faixa etária dos mais jovens (menos ou igual a 25 anos). Um em cada cinco disse ter conhecimento de um familiar ou amigo (18% em 2020) que já teve uma infecção por um micróbio resistente aos antibióticos e 3% confessaram que eles próprios já passaram por essa situação (4% em 2020).

O estudo envolveu 1600 inquéritos válidos e estão representados 213 concelhos de Portugal Continental e ilhas.

Sugerir correcção
Comentar