Vamos colocar este Sequeira no lugar certo

Fundação Aga Khan patrocina com 200 mil euros campanha de Sequeira

Com uma única doação de 200 mil euros, o braço português da Fundação Aga Khan vai igualar o total das participações conseguidas até agora pela campanha que pretende comprar um quadro do pintor português Domingos Sequeira para o Museu Nacional de Arte Antiga (MNAA). Esta campanha nacional de angariação de fundos tem como objectivo comprar a pintura Adoração dos Magos (1828) por 600 mil euros para aquele museu de Lisboa. Foi lançada no final de Outubro e tinha conseguido juntar até agora um terço da verba total necessária para a aquisição. Com a verba da Fundação Aga Khan, ultrapassará os 400 mil euros, atingindo dois terços do total.

A Fundação Aga Khan Portugal, ligada à comunidade muçulmana ismaelita que pertence ao ramo minoritário xiita, integra uma rede internacional de cooperação que funciona na área da cultura e do desenvolvimento social. Esta iniciativa, explica o comunicado de imprensa a que o PÚBLICO teve acesso, insere-se na decisão, anunciada no ano passado, de construir a sede global da sua comunidade em Portugal, o chamado “Imamat Ismaili”. 

"Dada a relação de grande cumplicidade com Portugal e os portugueses, a Fundação Aga Khan não poderia ficar indiferente a esta campanha, que tem o grande mérito de envolver a sociedade civil", diz ao PÚBLICO, numa declaração por emailNazim Ahmad, responsável da Fundação Aga Khan em Portugal. Com este donativo, "a fundação espera também contribuir para que outras entidades se juntem a este projecto, permitindo que o quadro de Domingos Sequeira Adoração dos Magos fique em Portugal e continue a enriquecer o património cultural dos portugueses".

A entrega formal do cheque de 200 mil euros será feita na quarta-feira pelo príncipe Amyn Aga Khan, representante e irmão do próprio Aga Khan, líder da comunidade ismaelita, ao ministro da Cultura, João Soares, e ao director do MNAA, António Filipe Pimentel, numa cerimónia que terá início às 17h no museu. A fundação destacou ainda o papel do ministro da Cultura "em todo este processo".

"Da Fundação Aga Khan significa um acto exemplar de cidadania cultural, de envolvimento num país onde ela própria se está a implantar", afirma ao PÚBLICO o director do museu. "Há claramente um sinal que a fundação está a querer dar, de apoio a uma grande instituição cultural portuguesa, de apoio simbólico a Portugal, começando exactamente por esta pintura que podia ser muito incómoda mas é o contrário. Trata-se de uma pintura religiosa, de tradição cristã, mas que representa um encontro entre mundos, entre um Oriente longínquo e um Ocidente, em torno de uma mensagem ecuménica e de paz." 

Quando falta pouco mais de um mês para esta campanha terminar, o site do PÚBLICO, onde a campanha está alojada, contabiliza 3.187.255 pixéis comprados, o tal terço da obra, ou seja, mais de 190 mil euros. Falta contabilizar as contribuições das empresas Aeroportos de Portugal (ANA), 20 mil euros, e EDP, 15 mil euros, que embora anunciadas este mês ainda não aparecem na lista dos patrocinadores. As empresas têm sido, aliás, os grandes ausentes desta campanha, como se pode constatar pelos primeiros lugares da lista dos patrocinadores agrupados nas entidades, que junta empresas e todo o tipo de instituições. 

A campanha, intitulada Vamos Pôr o Sequeira no Lugar Certo, apela a pequenos e grandes mecenas, tendo dividido o quadro em dez milhões de pixéis, permitindo contribuições mínimas de seis cêntimos. É a primeira do género em Portugal com esta dimensão nacional — além do PÚBLICO, tem ainda como parceiros principais a agência de publicidade Fuel, a RTP e a Fundação Millenium BCP —, embora seja prática comum em vários países há décadas. Neste momento, a pintura está nas mãos de um privado, descendente do primeiro duque de Palmela, que pediu que a sua identidade não fosse revelada. 

A Adoração dos Magos faz parte da chamada “série Palmela”, um conjunto de quatro telas sobre a vida de Cristo – Descida da Cruz, Adoração dos Magos, Ascensão e Juízo Final – que terão sido executadas entre 1827 e o começo da década de 1830. A "série Palmela" é vista como o testamento pictório de Sequeira, considerado um dos mais importantes pintores portugueses do século XIX. As obras foram compradas por D. Pedro de Sousa Holstein, duque de Palmela, à filha do artista em 1845.

Segundo o comunicado de imprensa, a rede Aga Khan vai "promover e participar futuramente em mais iniciativas na área da cultural em Portugal, em parceria com o Ministério da Cultura e com a sociedade civil, no âmbito da colaboração entre Portugal e o Imamat Ismaili".

Este domingo, o bar-discoteca LuxFrágil, em Lisboa, organiza uma festa dedicada a Sequeira, a partir das 18h. Em vez da contribuição de seis cêntimos, é obrigatório pagar, pelo menos, seis euros para entrar no Lux, e os convidados são mesmo desafiados a ser mais generosos, através de múltiplos de seis euros. 

Artigo alterado a 15 de Março: acrescenta declarações do director do Museu Nacional de Arte Antiga; nomeia o valor total recolhido até agora, que ultrapassa os 400 mil euros

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