Vamos colocar este Sequeira no lugar certo

Contar a vida de Sequeira através das cartas

 

1768

Março, 10

Na Rua da Ponte ao Pátio das Vacas, em Belém, nasce Domingos António do Espírito Santo, filho segundo do marítimo António do Espírito Santo, natural de Lagos, e de Rosa Maria de Lima, natural de Lisboa. É baptizado na paroquial da Ajuda a 30 de Março, sendo padrinho o tendeiro Domingos de Sequeira Chaves, também morador na freguesia da Ajuda, de quem adopta o apelido.

1781

Dezembro, 2

Domingos António matricula-se como discípulo ordinário na recém-criada Aula Pública de Desenho, instituída sob patrocínio régio. O registo de matrícula, assinado também pelo pintor Joaquim Manuel da Rocha, regente da Aula e professor de Desenho de Figura, indica-o morador na Rua do Embaixador e na idade de 14 anos (que ainda não completara). A Aula começou por funcionar no Convento dos Caetanos e o seu regulamento contemplava a distribuição de prémios aos alunos mais distintos. A condição de aluno “ordinário” implicava a frequência de um curso de cinco anos, a preferência nos concursos e a isenção de recrutamento militar.

1782

Primeiros desenhos conhecidos do jovem aluno do Rocha, alguns datados de Junho a Agosto deste ano e assinados já com o apelido Espírito Santo Cequeira ou Seqeira (Biblioteca Pública de Évora). São exercícios conformes ao método seguido na Aula, onde a cópia do natural só era consentida depois de trabalho prévio sobre modelos de estampas, pinturas ou esculturas. Idêntica assinatura surge numa Santa Maria Madalena Penitente guardada nas reservas do Museu Nacional de Arte Antiga (MNAA), obra que constitui a primeira pintura conhecida do artista e certamente datável do final do período em que frequentou a Aula régia (1781-1786).   

1784

Sequeira ganha o 1° prémio do concurso da Aula, com o desenho a sanguínea Pirro e Glaucias (Fundação Ricardo Espírito Santo Silva).

1786

Obtém de novo o 1° prémio do concurso deste ano com o desenho a sanguínea Abraão expulsando Agar (Fundação Ricardo Espírito Santo Silva). Com a morte de Joaquim Manuel da Rocha, a 28 de Dezembro, e completados os cinco anos de aprendizagem, abandona a Aula régia e entra para a oficina de Francisco de Setúbal, um pintor medíocre e extravagante. Consta que colaborou, como ajudante, na pintura de tectos e panos para a casa de João Ferreira, um próspero negociante de solas; Beckford viu os aposentos, "horrendamente dispostos e os estuques dos tectos ornamentados com pinturas alegóricas, mediocremente executadas, e cobertos de ornatos doirados".

1788

Maio

Sequeira parte para Roma como pensionista do “real bolsinho” de D. Maria I. Embora sem prova documental, alguns biógrafos referem que a benesse terá sido obtida a instâncias do Marquês de Marialva.

Junho, 6

Desembarca em Génova levando na bagagem uma carta de recomendação de João António Pinto da Silva, guarda-jóias da Rainha, para o cônsul de Portugal nesta cidade, João Piaggio – "O Portador desta he Domingos Antonio de Siqueira, que tendo muita habilidade para a Pintura o manda S. Mag. para Roma a aprender a dita Arte: E he a mesma Senhora servida que VM. Lhe mande assistir naquella Corte com dez mil reis em cada hum Mez, pagos promptamente athe nova ordem de S. Mag.". É a primeira vez que o pintor aparece nomeado sem o primeiro dos seus apelidos de baptismo, Espírito Santo.

Junho, 29

Chega a Roma, hospedando-se na embaixada portuguesa. José Pereira Santiago, encarregado de negócios na ausência do embaixador D. João de Almeida, relata numa carta de 3 de Setembro que o moço logo começou a trabalhar sem perda de tempo – "e o aproveita em observar algumas Pinturas que lhe vão a genio neste Campidolio, e Galerias de Principes; e Se vai aperfeiçoando com toda a Curiosidade sem que se poupe ao trabalho, querendo o tambem ter em fazer de Sua idea, e arbitrio o meu Retrato por não lhe agradar o que viu feito de mão alhêa". Vergílio Correia (1923) atribui a Sequeira um retrato de Santiago e um outro de seu filho, Francisco Pereira, que encontrou na posse de seus descendentes em Roma.

Outubro

Primeira excursão a Grotta Ferrata, nos arredores de Roma. Na capela farnesiana da Abadia copia, em desenho, os frescos de Domenichino consagrados a S. Nilo e a S. Bartolomeu. Pereira Santiago relata numa carta o talento do moço: “Levei Domingos Antº Sequeira a Grotta ferrata; em 4 dias desenhou toda a Capella de Dominiquino com admiração dos intendentes e de 3 Ingleses que aly estudavam. Graças a Deos que já vejo hum moço português dar nome”.     

1789

Janeiro

Está a finalizar uma cópia de Santa Irene curando as feridas de S. Sebastião, de Bartolomeo Schedoni. É a primeira pintura “romana” de Sequeira, hoje em colecção particular. Tencionava oferecê-la à Rainha, como prova de merecimento, mas o embaixador D. João de Almeida achou o assunto “pouco próprio”, talvez pela nudez clássica em que o santo surge representado. Acaba por enviar para a corte uma Santa Maria Madalena, copiada de Guido Reni (Palácio Nacional de Queluz)

Março, 17

Sequeira comunica a Pinto da Silva a obtenção da sua primeira distinção num concurso romano: "Tendo nestes ultimos dias aberto na Academia de Capidolho os Concursos dos desenhos para q. se apresentarão quarenta concorentes tive a filicidade de merecer o segundo premio dos seis q. estão destinados para os q. mais se distinguicem». O desenho premiado é um Estudo de Nú, conservado na Academia de S. Lucas, em Roma. Na mesma carta, Sequeira aproveita para solicitar ao guarda-jóias "hum novo auxilio para Com elle poder satisfacer as despezas indispencaves das gratificações q. se fazem a quem mostrão as galarias e q. permitem q. nellas se estude e não menos Para hum vistido p.ª este anno".

Maio, 25

Recebe o 2° prémio da classe de pintura do Concurso Clementino com o desenho Milagre da multiplicação dos pães e dos peixes, de grande formato e executado em pouco mais de um mês, e dois desenhos do Sacrifício de Isaac elaborados nas escassas duas horas de duração da "prova ex-tempore". Informa imediatamente João Pinto da Silva do seu sucesso, descrevendo detalhadamente a cerimónia de entrega dos prémios e insinuando a escassez das verbas de que dispõe para as suas necessidades. Este responde-lhe a 7 de Julho, felicitando-o mas acrescentando "que VM. não se encha de vaidade para Se Supor mayor que os outros" e recomenda-lhe que faça alguma obra digna de poder ser dirigida à Rainha, pois que "factos costumão provar mais que palavras"; quanto às despesas, "não me esquecerey de promover a Sua conveniencia quanto me for possivel».

Setembro, 23

O embaixador D. João de Almeida informa sobre a estadia de Vieira Portuense em Roma, que então pintava uma Fuga para o Egipto propondo-se oferecer o quadro à Rainha. "Sequeira cuja rivalidade não tem limite fica trabalhando em outro também de Invenção sua p.ª o qual lhe dei eu o Sugeito mais conforme à sublime Dignidade de Sua Magestade que representa Iesus Christo ordenando que se pague o Tributo a Cesar, e q. se dê a Deos o q. he de Deos, a disposição deste quadro [A Moeda de César] tem merecido o aplauso dos Professores, e a emulação que existe entre estes dous rivaes lhes tem feito fazer progressos surpreendentes". A pintura, em parte por acabar, encontra-se hoje em coleção particular.

1790

Janeiro

Sequeira continua a trabalhar na Moeda de César, para o que recebe, sob atestação do Mestre Nicola la Picola, uma verba para "despesas em modelos e estudos tintas e Pano e Piceis".

Setembro, 1

Uma carta de Vieira Portuense refere-se à frequência de pinacotecas romanas por Sequeira – "anda procurando licença p. ° hir p.° a Gallaria Collona podendo estar na Corsini".

Outubro, 6

Nova excursão a Grotta Ferrata. Em carta de 26, para D. João de Almeida, diz que "tenho feito estodo junto Com o Agricula do homem Nu con tintas põr q. he o q. V. Ex.' me Re comendou muito". O colega de estudo que o pintor refere trata-se de Luigi Agricola, que obtivera o 1° prémio no concurso Clementino de 1789.

Dezembro, 14

Escreve a Pinto da Silva anunciando-lhe a próxima remessa da Moeda de César e também de uma cópia de Gerardo della Notte representando S. José trabalhando e Jesus alumiando, para oferecer a "Sua Alteza o Pricipe». Pede que lhe sustentem certas despesas com os seus estudos.

1791

Parece ter sido neste ano que Sequeira trava íntima convivência com a família Cometti, frequentando assiduamente o seu palácio romano e aí realizando alguma obra de retrato. Consta que na casa de campo dos Cometti Sequeira terá pintado o tecto da sala de jantar, representando ao centro O carro de Apolo e, em torno, A fábula de Narciso – mas não restam vestígios ou testemunhos directos desta decoração. Segundo cartas que o seu biógrafo Sousa Holstein pôde consultar, consta também que Sequeira se enamorou de uma muito jovem filha ou sobrinha dos Cometti e que o romance mereceria a aprovação familiar.

Fevereiro, 2

Sequeira solicita ao guarda-jóias Pinto da Silva, seu protector, que lhe indique o tema de uma pintura que se propunha realizar para lhe oferecer – "espero em V. Sª de mandar  me dizer o passo q. mais dezeja Devino o porfano". No mesmo dia, escreve a D. João de Almeida informando que o novo embaixador, D. Alexandre de Sousa Holstein, chegado a Roma a 25 de Novembro, lhe pedira o esboceto "do quadro de invençam q. mandei para a Rainha", certamente A Moeda de César. Refere-se a passados problemas de saúde que o obrigaram a ausências na aula de Domenico Corvi – "o q. me tem Custado mais he onão ter ido a Cademia do Corve estas Noites". A mudança de embaixador acrescentara-lhe as despesas, pois que no tempo de D. João de Almeida "alem de tudo q. me dava Sempre huma vez o Jantar otra o almosso e otras tantas Como vestido meLevava fora tudo isto era a popar".

Março, 16

Pede que a sua pensão do real bolsinho lhe seja acrescentada, "pois em Rezam de o Viver em Roma he tudo mais Caro o Dobrado agora do q. quando xigei", acrescentando que os 5 escudos mensais que recebia de D. João de Almeida eram para sustento de sua mãe.

Abril

Está a trabalhar na Conversão de S. Paulo (Alpiarça, Casa Museu dos Patudos) e num Senhor amarrado à coluna (quadro pequeno, para Sua Majestade) – "dou Parte a V. S. q. tendo eu com tanto gosto feito o aboseto de S. Paulo, do qual estou Contente por q. graças a Deos tem tido aprovaçaon dos Porfeçores, por q. entre tantos pençamentos q. fiz escullheiram o milhor o qual para os estudos deste e de otro q. ja tenho tambem feito o aBoceto". Um ano depois, o guarda-jóias acusaria a recepção das pinturas dizendo "com cinceridade, que ambos pareceram bem, sem embargo de que alguns Profeçores lhes descobrem defeitos, de que espero que VM se emmende nessa boa Escolla".

Maio, 25

Informa D. João de Almeida de que está fazendo um pequeno quadro de sua invenção para lhe oferecer. Trata-se da Morte de Marco António (MNAA) — "faso este Sugeito para V Ex.ª por ter tido a Seitaçam o pensamento, que fiz, tanto de Cavaluxe [Antonio Cavalluci] como de Munciu Canharo [?] e de otros Porfessores".

Agosto, 3

Primeira referência ao Milagre de Ourique (França, Museu de Eu) — "Hu grande Estudo q. tenho feito em huma Composiçam muito vasta de figuras q. he hu quadro q. tenho detriminado a fazer para S. Mag. Representante quando El Rei D. Afonso Hanriqi primeiro Rei de Portugal ove a Voz de Iesus Cristo e Vio portado de hu grupo de anjos antas de dar a batalha Contra os Cinco Reis no Campo de origi". Sequeira pede opinião sobre a dimensão conveniente da obra (a que Pinto da Silva responderia que "o poderá executar na proporção que melhor lhe parecer conforme a ideya e figuras que quizer executar" ...) e refere que tem padecido de certos "isvinimentos da Cabesa q. perdia os Sintimentos", provocados pelo estudo aturado e pelos calores do verão romano.

1792

Abril, 4

Carta do guarda-jóias para Sequeira reprovando a sua liberdade de pedir dinheiro ao cônsul João Piaggio para custear certas despesas com a execução de pinturas. "Por esta forma creyo que VM pertende Vender, e por bom preço, os Paineis que ahy faz, ao mesmo tempo que devera Lembrar se da grande Esmolla, e mercê que deve a S. Mag. Em o querer adiantar em huma Arte, que lhe possa ser util, e à sua Familia, e em que VM possa tambem fazer honra á Nação. Eu como seu Amigo aconselho a VM que se dispa dessa cobissa, ou ambição Romana, e que tire dessa Corte somente o que pode servir para o seu adiantamento, e não as outras couzas com que todos arguem aos Italianos". Na resposta, o pintor protesta a sua boa fé no assunto, e refere que as despesas se destinavam ao Milagre de Ourique e a um novo quadro cujos estudos iniciara – um S. João de 7 palmos de largo por 4 de alto (trata-se da primeira menção à Pregação de S. João Baptista, hoje em Vila Viçosa, na coleção do Paço dos Duques de Bragança).

Julho

Sequeira chega a Nápoles, onde se deslocara por motivos de saúde. Os médicos tinham aconselhado a mudança de ares como terapia para os padecimentos que o próprio pintor define como "comvelucoens nervinas nos olhos e quntinuas dores de Cabeça". A estada prolonga-se por quatro meses.

Novembro, 8

Já de novo em Roma, recebe 80 escudos a empregar nos estudos para um quadro encomendado por Pina Manique. Trata-se certamente da primeira referência ao trabalho com a Alegoria à Fundação da Casa Pia (MNAA, em depósito na Assembleia da República).

1793

Janeiro, 30

Santiago informa que Sequeira dera começo, nas instalações da Embaixada, ao "quadro grande", isto é, ao Milagre de Ourique.

Fevereiro, 26

Importante carta de Sequeira a Pinto da Silva, onde o pintor confessa as suas aspirações a académico romano e a pintor régio, comparando-se a Vieira Lusitano. Refere-se a um requerimento que mandara "aonde faso ver que os Rezons que aLego Creio merecerem a Provaçam pois tenho procurado de destengrimi fazendo o mesmo q. fez o nosso Antigo Vieira e mais. que Com esta obra q. faço para o Pricipe Nosso Senhor [Milagre de Ourique] mercendo aprovaçam dos Porfesores todos me querem dar a honra de ademetirem me Porfesor. Sendo tudo isto Consolaçam para V. S.ª pois me aLembra que éram estes os Seus dezejos. agora espero q. V S.ª me aCabe de fazer feliz. Sendo a minha felisidade o Ser Pintor do gabinete de S. Mag. Como èra o Nosso Vieira». Termina referindo que pouco tem saído de casa devido ao ambiente anti-francês que assolava Roma, "pois nestes dias pasados foi me preciso fugir Com bastante Medo pois vi me em hum prigo grande vendo tanta gente Contra de mim julgando q. eu foce frances".

Abril, 3

Carta de Santiago informando que, na embaixada, o pintor se achava a trabalhar nos "dois quadros grandes, hum para a nossa Corte [Milagre de Ourique], e o outro para o Sr. Intendente Geral [Alegoria à Fundação da Casa Pia]".

Agosto, 14

Sequeira diz que terminara a Pregação de S. João Baptista e que estava a ultimar o Milagre de Ourique. O quadro da Pregação seria expedido na primeira semana de Setembro, para Génova, e depois para Lisboa.

Outubro, 6

É eleito membro da Academia de S. Lucas, com o grau de professor. Apressa-se a comunicar a boa nova a Pinto da Silva: "dou parte a V. S.ª inexplicavel Contentamento em q. me acho, por me ver chegado ao auge do grao que me derão em me admettirem entre os Accademicos de S. Lucas. Com todas as honras. ou direi ainda mais. Com outras Superiores áquellas que Se Costumão dar aos Celebres Professores de Pintura". Como era da praxe, apresentara para ser admitido uma obra de sua autoria, A degolação de S. João Baptista (Roma, Academia de S. Lucas), e diz também que iria fazer um auto-retrato "para Se unir áquella para memoria Como he Costume dos Accademicos".

1794

Janeiro, 3

Carta de Sequeira a Pinto da Silva referindo que D. João de Almeida lhe escrevera aconselhando-o a que pensasse voltar a Portugal — "para puder formar huma escola portugueza em Lisboa" — mas oferecendo entretanto a sua casa em Londres para uma estadia do pintor — "me diz q. alli em poco tempo posso fazer hum bom Capital para dalli hir a Lisboa". Propõe-se fazer a viagem por terra, "obecervando obras de muitos outros Autores como idifisios e muitas Couzas analguas a mª porfiçam", para o que solicita ajudas de custo e transferência de pensão. Acrescenta estar pronto para partir nessa Primavera e que o quadro de D. Afonso Henriques já estava acabado, mas que "devia aCabar otro quadro grande para o Snr. Intendente [Pina Manique] o qual mo emComendou. No tempo q. eu estava em portugal".

Abril, 9

Resposta do guarda-jóias aconselhando Sequeira a permanecer em Roma e a adiar os seus projectos londrinos para quando já fosse "inteiramente hum Consumado Pintor". Quanto às ideias do seu retorno a Lisboa, "tambem devo dizer a VM que aqui em Lx.ª terá muito pouco que fazer; porque não há Pessoas com gosto de Pinturas, e por isso todos os Pintores que aqui se achão não fazem se não couzas de pouco merecimento, como são algumas Pinturas de Paredes, e tambem tetos de Cazas pelo gosto de Pilman [Jean Pillement], que creyo VM ainda aqui conheceo; e além disto só se fazem alguns poucos retratos para o que não Sey se VM tem genio".

1795

Março, 31

Sequeira queixa-se veementemente a Pinto da Silva da magreza da sua pensão, "Sendo Conhesido de quazi toda a Nobreza desta Sidade", e sublinha o maior mantimento dado aos "Rapazes q. estam em Roma mandados do Snr. Intendente" bem como ao Vieira Portuense. Refere que tem "adiantado diversos desipulos os quais alguns tem tido premios em Campidolhio e Sou porcurado de muitos outros para virem ao meu estudo" e que bem poderia dar essas lições para "adiantar os meus nassionais". Pede, assim, ajudas de custo para poder voltar a Portugal.

Junho, 15

Resposta de Pinto da Silva dizendo que não se atreve a dar-lhe conselho face aos intentos de retorno a Lisboa, "só lhe digo que aqui tera munto pouco que fazer porque bem sabe, que os Portuguezes não tem grande paixão pela pintura; e me parecia mais justo, que ahy se demorasse mais tempo, para acreditar milhor o seo Nome, e merecimento". Sequeira só receberá a carta em Génova, a 20 de Julho, das mãos de João Piaggio, quando já se encontrava em trânsito para Lisboa. Partira de Roma no mês anterior, fazendo uma larga digressão por Bolonha, Parma, Florença, Milão e Veneza, "para Obeservar as galarias e Monomentos Antigos p.ª maijor minha InstruÇam". Na Academia de Belas Artes de Parma deixou uma pintura de pequeno formato, representando S. João Baptista (hoje na Galeria Nacional de Parma).    

Junho, 20

Em carta à Sra. Cometti, endereçada de Bolonha, dizia: "vado a Lisbona e torneró a Roma pieno de accademicato". A referência é de Sousa Holstein, que a considerou uma confidência probatória de que o artista não planeara como definitivo o seu regresso a Lisboa. O mesmo biógrafo afirma que Sequeira, antes de deixar Roma, fora recebido em audiência pelo Papa Pio VI, que lhe ofereceu uma relíquia de Santo António. (Em 1902, um sobrinho-neto do pintor, Tomás Júlio da Costa Sequeira, legou por testamento ao Tesouro de N. Sra. da Oliveira, em Guimarães, um relicário do Santo Lenho por ele tradicionalmente identificado com a referida oferta do Papa).

Agosto, 2

De Génova, Sequeira escreve ao guarda-jóias dando notícia dos sucessos da sua viagem – "alem de Ser Porfessor e Cademico em Roma o Sou na grande aCademia a florensia em Bologna, e em Parma nas Sidades aonde floresem mais as belas Artes. e isto o vera de todos os meus dePlomaz pois em todas estas Sidades tenho Recebido as maiores atencons e tenho Sido Recebido de maneira q. me via Confuso. em particular em Parma". Respondendo à carta anterior, diz que a sua ida para Lisboa "espero me seeja de Benefisio pois tendo a Sua Porteçam espero de poder dar provas dos meus estudos para aSim ver Se paso alguma fortuna na patria pois este he o fim para q. eu tenho estudado mais não para ficar fora. mais Sim para ahi deichar as porducons dos meus estudos e trabalhos por estes pocos dias q. hum homem deve viver neste mundo".

Novembro (ou Dezembro)

Sequeira chega a Lisboa. Narra à Sra. Cometti o modo como tem sido recebido na sua terra natal: "Vão progredindo a cada passo o meu credito e o meu nome; recebo finezas de todos, adora-me o povo. O Príncipe elle mesmo elogiou-me, o outro dia, fallando diante de mim com o embaixador de Hespanha".

Dezembro, 17

O Príncipe D. João, futuro regente — "em attenção ao distincto merecimento que adquiriu em Roma na arte da pintura de que tem dado distinctas provas" —, concede-lhe uma pensão vitalícia de 60 moedas anuais e casas pagas, sem prejuízo de remuneração especial por cada trabalho que executasse.

1796

Instala-se em Belém, ao Pátio das Vacas, aí residindo provavelmente com a mãe, as irmãs, Maria Rosa das Dominações (n.1773) e Maria Joaquina (n.1776), e o irmão mais novo, Manuel Vicente (n.1782).

Tem o seu primeiro dissabor com os preços de mercado. Segundo Cyrillo V. Machado, memoralista e seu colega de profissão, todos pretendiam ter alguma obra do novo artista mas admiravam-se dos preços que exigia. O Conde de Val de Reis recusa-se a contratar-lhe por 1000 moedas a empreitada de dez batalhas para uma das “antecâmaras” de sua casa.

Em busca de solidariedade profissional contacta com Pedro Alexandrino e Cyrillo – "Lastimou-se do abatimento da Arte, propondo que se unissem todos para a exaltar, dando-lhe mais estimação, e maior valor às obras. Tinha toda a razão; mas quem póde fazer mudar de repente hum antigo costume?" (Cyrillo).

Sequeira começa a frequentar o solar de D. Rodrigo de Sousa Coutinho, Conde de Linhares. Resulta dessa convivência uma série de 51 desenhos (alguns datados de 1796 a 1802), organizados no chamado Álbum de Arroios. Hoje, emoldurados, permanecem na posse de descendentes.

Março, 1

Holstein refere-se a uma carta de Sequeira, com esta data, onde o pintor afirma que terminara um quadro histórico e os retratos de dois príncipes, e que tivera encomenda de um quadro de Santo António para William Beckford (desenho no MNAA).

Novembro, 22

Anúncio na Gazeta de Lisboa: "Domingos António de Sequeira tendo acabado, para Mr. Beckford hum Painel, que representa Bacco e Ariadna, o expõe na sua casa, junto ao Pateo das Vacas, no sitio de Belem, por vinte e sinco dias, a todas as pessoas que se quizerem dignar de o ver, e prinicipiarão a vinte e quatro do corrente mês". Além destas encomendas, parece ter executado, ainda para o inglês, um quadro de Nossa Senhora do Desterro, gravado pelo seu amigo Gregório Francisco de Queirós. Do tema de Baco e Ariadne restam dois estudos em desenho (MNAA).

1797

Junho, 13

Sequeira escreve a D. João de Almeida, embaixador em Londres, comunicando-lhe que "Depois de tantos annos chega a oCazian de mandar o quadro de Cleopatra espero q. chege bem Condesionado". Trata-se da pintura que realizara ainda em Roma (cf. Maio 1791) ou da Morte de Cleópatra (MNAA) do mesmo período.

1798

Junho, 1

A Gazeta de Lisboa noticia a abertura, a 13 de Maio, do Real Teatro de S. João, no Porto, referindo que "Ornava o Theatro hum panno pintado pelo celebre Domingos Sequeira, actualmente empregado no serviço de S. M. o qual conciliou muito a atenção dos entendedores".

1800

Por motivos ainda hoje algo obscuros, Sequeira ingressa na Cartuxa de Laveiras (Caxias). O seu recolhimento caracteriza-se por uma assinalável actividade artística, pintando uma série de cinco telas de grande dimensão com passos da vida de S. Bruno (fundador e patrono dos Cartuxos) e de outros santos eremitas (Santo Onofre, S. Paulo e Santo Antão). O conjunto encontra-se disperso por três museus (MNAA, Museu Nacional de Soares dos Reis e Museu de Évora)  

1802

Julho, 28

Decreto de nomeação de Sequeira e Vieira Portuense como "Primeiros Pintores de Câmara e Corte". Vencendo um ordenado anual de 2 contos de réis e sege de exercício, ambos ficam encarregados da direcção das obras de pintura no Palácio da Ajuda, em construção, pertencendo-lhes "regular de acôrdo o methodo com que haviam de ser executadas"; em caso de discórdia, o assunto seria regulado pelo Presidente do Real Erário, D. Rodrigo de Sousa Coutinho, "que tomará as ordens do Principe Regente". O decreto incumbe-os ainda de proporem os pintores "segundos" e o ensino "na escola que se haja de instituir", anexa ao edifício.

Neste ano, inicia-se a cunhagem, na Casa da Moeda, de novas peças de ouro e moedas de bronze exibindo a efígie do Príncipe Regente, para as quais foram adoptados modelos feitos por Sequeira. Desenha também uma medalha para os prémios da Aula de Debuxo e Desenho da Companhia Geral das Vinhas do Alto Douro, no Porto.

Está datado deste ano o Retrato do Príncipe Regente (P. N. Ajuda).

1803

Abril, 1

Arrendam-se umas casas, no Pátio de D. João, à Ajuda, para a "academia de pintura"; as chaves ficam na posse de Sequeira. Além de Joaquim Gregório da Silva Rato e de António Faustino, não consta que aí tenham trabalhado outros discípulos de Sequeira.

Abril, 21

Sob proposta de Sequeira, são admitidos na obra da Ajuda os pintores Arcângelo Fuschini, Cunha Taborda e Bartolomeu António Calisto, seus companheiros de estudo e pensionato em Roma.

Setembro

É nomeado mestre de desenho e pintura da Princesa da Beira, D. Maria Teresa, a quem passou a dar lições, bem como a sua mãe, D. Carlota Joaquina, e a suas tias, D. Maria Francisca Benedita e D. Maria Ana.

Está datado deste ano O Príncipe Regente passando revista às tropas na Azambuja (P. N. Queluz). Terá também pintado um tecto na Ajuda, que não agradou.

1804

Julho, 23

Carta do secretário de estado dos negócios da guerra ao Arsenal do Exército: "Domingos Antonio de Sequeira achando-se encarregado por S.A.R. o Principe Regente Nosso Senhor de tratar alguns Assumptos da Historia Portugueza, e carecendo de fazer observaçoens sobre vestidos de ferro, couraças, capacetes, espadas, e espingardas ao uzo antigo; He o Mesmo Senhor servido que no Arsenal Real do Exercito não sómente se lhe patentêem todos quantos armamentos existirem daquelles tempos, mas que possa fazer d'ahi conduzir para a caza da sua habitação aquelles de que precizar para seu estudo".

Novembro, 3

Por privilégio real, Sequeira recebe o exclusivo, por vinte anos, de "fazer construir e ter as embarcaçoens que inventou para o uzo dos banhos". Trata-se das chamadas barcas de banhos, destinadas a conferir maior privacidade e recato aos banhos públicos de mar, "construidas com quartos, de maneira que com toda a comodidade, decencia e sem perigo, podesse cada pessoa privadamente aproveitar-se de hum comodo que por todos os principios vinhão a ser muito uteis e muito mais por haverem embarcaçoens separadas, humas só para os homens e outras para as mulheres".

1805

Janeiro, 12

É agraciado com a Ordem de Cristo — "sendo dispensado nas provanças e habilitações de sua pessoa, e de apresentar quaesquer certidões e folhas corridas" — e a respectiva tença de 12 mil reis anuais.

Presume-se que entre 1802 e 1805 Sequeira tenha executado uma boa parte das suas pinturas de temas históricos: Martim de Freitas entregando a D. Afonso III as chaves do Castelo de Coimbra (Col. Condes de Anadia), Lenda do nascimento de D. Afonso Henriques, Baptismo de D. Afonso Henriques (esboços a óleo no MNAA e Palácio de Mafra), D. Afonso V armando o filho cavaleiro diante do cadáver do Marquês de Marialva (esboços a óleo no Palácio da Pena e em col. particulares), Egas Moniz diante do Rei de Leão, Batalha de D. Afonso V e Desembarque de Afonso de Albuquerque (todos no MNAA). Também fez esboços para decorações parietais em Mafra, que seriam parcialmente prosseguidos por outro.

Um quadro da Última Ceia (Col. Rio Maior), de grandes dimensões e onde se auto-retrata como criado, deve igualmente corresponder a este período.

1806

Maio, 8

Por proposta da Junta Administrativa da Companhia das Vinhas do Alto Douro, Sequeira sucede a Vieira Portuense (f. 1805) como director e lente da Aula de Debuxo e Desenho anexa à Academia Real de Marinha e Comércio do Porto. O ordenado é de 600 mil réis anuais, na obrigatoriedade de passar três meses no Porto para superintender à referida Aula.

Agosto, 15

Sequeira deve estar no Porto, onde institui um novo regulamento para a Aula. O regulamento tem a sua assinatura seguida de um eloquente elenco dos seus cargos e títulos: "Cavalleiro Professo na Ordem de Christo: Primeiro Pintor da Camara, e Côrte: Mestre de Dezenho, e Pintura dos Serenissimos Principes, e Infantes, Augustos Filhos do Principe Regente Nosso Senhor: Lente da Academia de S. Lucas, em Rôma, e das principaes da Italia: Directôr da Aula Regia de Desenho, e Pintura da Cidade do Porto". Noutro documento, há também notícia da compra de materiais para o ensino na referida Aula: "estampas que contem principios de estátuas académicas, história, de paízes, marinha e navios".

1807

Sequeira está no Porto quando da 1ª invasão francesa (e partida da corte para o Brasil), em Novembro. Aí preparava certos festejos escolares e uma exposição pública dos trabalhos dos seus alunos, bem como das suas régias discípulas, que já se não realizaram. Estadeara também em S. Jerónimo a Real, Braga, terra natal do seu amigo e protector Pedro José da Silva, que retratará (em 1809) num grande ex-voto gratulatório (Braga, Confraria do Bom Jesus do Monte) .

Dezembro, 9

Ordem do novo administrador geral das Finanças para os trabalhos da Ajuda serem suspensos e o pessoal despedido. Poucos dias depois (a 23), a ordem anterior é revogada e Sequeira mantém o seu cargo.

1808

Janeiro, 16

Sequeira regressa a Lisboa. Junot decretara que todos os encarregados de obras públicas ou reais se lhe apresentassem para darem conta do que administravam.

Janeiro, 26

Audiência com Junot, na qualidade de director das pinturas da Ajuda e responsável pela arrecadação dos materiais inerentes a esse encargo. "Junot recebe-me bem, faz-me o elogio de que eu era um artista que dava credito à nação, e determina que eu continue no exercicio em que me achava, porque os homens de merecimento deviam em todos os tempos merecer a maior contemplação. N'esse mesmo acto passei a pedir-lhe o pagamento de dois mezes de meu ordenado, que me deviam (...) Mais me determinou então Junot, que eu fizesse algumas obras, principiando por um painel do estado actual de Lisboa, sobre o pensamento, que elle me deu e escreveu de seu punho". Esta alegada memória do pintor, transcrita por Ribeiro Guimarães numa ortografia que não é de modo algum a de Sequeira, refere-se à obra Junot protegendo a cidade de Lisboa (MNSR), datada deste ano.

Sequeira convive e viaja pela Estremadura com o Conde de Forbin, ajudante de campo do general Delaborde e futuro director do Museu do Louvre, visitando os mosteiros da Batalha e de Alcobaça. Regista, num seu álbum de desenhos (MNAA), essas excursões e alguns dos tesouros de ambos os mosteiros. Deixa inacabada uma Alegoria a Napoleão (Col. particular), talvez projectada na suposição de uma viagem do Imperador a Lisboa. Terá pelo menos iniciado um retrato equestre do Major Constant, na Ajuda, que lhe viria a trazer dissabores após a retirada dos franceses.

Outubro, 25

Segundo documento citado por Holstein, após a saída dos franceses em resultado da Convenção de Sintra (30 de Agosto) Sequeira requer dispensa de metade do seu ordenado de pintor régio — 1 conto de reis por ano – como contributo para o depauperado tesouro público e "por todo o tempo que durar a guerra com a França". Pede ainda escusa de figurar nas listas de donativos que iam saindo na Gazeta de Lisboa, onde de facto não consta o seu nome. Este donativo, "que faço em virtude do meu dever", terá subsistido até 1814.

Dezembro, 15

Quando recolhia de casa do Marquês de Marialva, onde jantara com Pedro José da Silva e o Conde da Lousã, Sequeira é preso por três soldados e conduzido ao regimento de cavalaria 4. Aí lhe anunciam o pretexto aparente da prisão, a de que fora visto, num café, falando com indecência do Príncipe Regente. A acusação desde logo não ficou provada, mas nada impediu que fosse transferido, no dia seguinte, para o quartel da Luz, aí continuando detido por mais de um mês. De alegações posteriores constantes do processo que correu pelo Juízo da Inconfidência, e que só conhecemos por fontes indirectas, depreendem-se pelo menos três acusações de colaboracionismo com os franceses imputadas a Sequeira: ter executado o quadro encomendado por Junot, no qual haveria alusões e alegorias ofensivas da nação e do regente; ter transformado em casa de pintura a sala do dossel do Paço da Ajuda; e ter metido um cavalo dentro de uma sala do Paço, para realizar o retrato equestre do Major Constant. Fusquini e Calisto, pintores subordinados de Sequeira na obra da Ajuda, depõem contra ele no processo, bem como Manuel da Costa, pintor de tectos.

1809

Janeiro, 18

Do quartel da Luz, Sequeira é transferido para a prisão do Limoeiro. Neste mesmo dia, uma portaria manda proceder a inventário da Casa de Pintura da Ajuda e sua entrega ao novo director, Arcângelo Fuschini.

Setembro

Sai em liberdade da cadeia do Limoeiro. Embora mantenha o cargo de pintor de Câmara e Corte, Sequeira não volta a exercer a direcção das obras de pintura na Ajuda nem a ser incumbido de executar novos trabalhos para o edifício.

Outubro, 16

Na Igreja dos Mártires, casamento de Domingos Sequeira com Mariana Benedicta Vitória Verde, natural da freguesia de S. Julião de Lisboa e dez anos mais nova que o pintor (n. 1778). Cerca desta data, o pintor faz o retrato da esposa e do cunhado, João Baptista Verde, e onde também alegoricamente se auto-representa (MNAA).

1810

No princípio do ano, Sequeira muda residência para o campo de Santa Bárbara, em Arroios.

Desloca-se ao Porto de acordo com os seus encargos na Aula de Desenho da Academia de Marinha e Comércio, produzindo aí um novo "Regulamento para os estudos" que elucida o seu pensamento sobre os processos de aprendizagem académica em desenho e pintura.

Em Outubro ou Novembro inicia os seus estudos para a célebre gravura Sopa de Arroios (1813), que documenta o acolhimento, em Lisboa, a milhares de refugiados da 3ª invasão francesa.

Por encomenda do Barão de Sobral, pinta a Alegoria às Virtudes do Príncipe Regente (P. N. Queluz). Deste ano ou do seguinte será a Alegoria ao regresso da família real (Col. Palmela).

1811

Março, 7

Primeiro documento referente aos trabalhos da baixela que o Conselho de Regência decidira oferecer a Lord Wellington, depois Duque de Vitória. Um aviso expedido pelo secretário de estado dos negócios da guerra, Miguel Pereira Forjaz, ao Arsenal do Exército, determina que se aprontem os oficiais, ferramentas e material necessário para a "breve conclusão" de uma baixela de que se achava encarregado o sargento-mor Francisco António Raposo.

1812

Fevereiro, 7

Na freguesia dos Anjos, nasce a primogénita de Sequeira, Mariana Benedita Vitória. O parto foi complicado, pois a recém-nascida é baptizada em risco de vida pelo próprio cirurgião-parteiro. A pintura votiva de Sequeira habitualmente designada por Invocação (Museu do Caramulo) relaciona-se decerto com estes acontecimentos.

Abril, 29

Data constante da inscrição num desenho para uma das figuras alegóricas da Baixela, indicando que Faustino José Rodrigues deveria "fazer por elle modello em cera". Este desenho, da autoria de Sequeira, é o primeiro documento que menciona o seu envolvimento na empreitada.

Dezembro, 30

Baptizado de Mariana Benedita, em Santos-o-Velho. É seu padrinho de baptismo o jovem morgado de Farrobo, João Pedro Quintela, retratado por Sequeira no ano seguinte (MNAA).

Datam deste ano as pinturas alegóricas Lisboa protegendo os seus habitantes e Génio da Nação Portuguesa (CML, Paços do Conselho).

1813

Fevereiro, 7

Ofício de Sequeira a Pereira Forjaz, secretário de estado dos negócios da guerra. Ordenada a aceleração dos trabalhos da Baixela Wellington, o artista sublinha que "constantemente de dia e noite tenho tido hua fadiga extraordinaria em apromptar as plantas Alçados e cortes de Platô bem como os detalhes de diferentes pessas de mta. empertinencia". Em carta de 21, informa: "Já tenho feito os modelos das pratas estão-se fazendo os das colheres estou feito torneiro, graças a D.s que me vai dando saude para dar razão a tantos officiaes de diferentes ramos e ahinda são poucos para os trabalhos q. ha a fazer".

Março, 4

Aviso determinando que o Arsenal satisfaça as requisições de pessoal e de material para o andamento da obra da Baixela, de que Sequeira estava incumbido conjuntamente com António Raposo. Depois desta data, a abundante documentação sobre a Baixela passa a nomear apenas Sequeira quanto à direcção e coordenação de todo o projecto e seu andamento. A obra foi executada na sua residência, agora na Rua da Santíssima Trindade a Buenos Aires, e num prédio contíguo arrendado para o efeito.

Junho, 21

Morre o irmão mais novo, Manuel Vicente, na batalha de Vitória.

Setembro, 28

Francisco Sodré, representante oficioso do governo português junto de Wellington, noticia o desagrado do novo Duque de Vitória quanto aos modelos dos pratos, colheres, garfos e facas que Sequeira lhe enviara por amostra.

Dezembro, 17

Publica-se a Sopa de Arroios, gravada de parceria com Gregório Francisco de Queirós.

1814

Fevereiro, 15

Nasce o segundo filho, Domingos, na freguesia de Santos-o-Velho, sendo seu padrinho, como no caso da irmã, Joaquim Pedro Quintela. A esposa do pintor, Mariana Benedita Vitória Verde, morre no parto.

Dezembro, 14

Num ofício dirigido a Pereira Forjaz, Sequeira refere que remete junto uma descrição da obra da baixela "acompanhando a expozição que o Governo fará a meu respeito". Esta é certamente a que consta de um documento, sem data, existente no Arquivo Histórico Militar e intitulado "Exposição do Governo a S.A.R. sobre o procedimento, e mérito de Domingos Antonio Sequeira no desempenho do monumento de q. foi encarregado pelo mesmo governo". Aí se relatam aspectos curiosos do desempenho de Sequeira na direcção do trabalho da Baixela: "São igualmente ponderaveis as excellentes qualidades, q. o ditto Sequeira em si reune no zelo, arranjo economico, prudente sistema, q. adoptou p.ª a boa ordem entre os Operarios; e extraordinaria actividade com q. tem empregado noites, madrugadas, e dias sem interrupção p.ª  pôr em movimento hum laboratorio de cento e trinta pessoas; com a combinação de mil ideias p.ª a boa organização e desempenho, instruindo os Operarios na construção, e maquinismo; alem de Plantas, Cortes, e Alçados; fazendo-lhes peças espessadas, e estas em detalhes; modelando, e trabalhando em todas as offecinas; e providenciando todas as objeçoens dos operarios de cada huma dellas em particular" . Mais à frente, refere-se que o pintor, mesmo em meio a esta actividade frenética, não terá abandonado as suas responsabilidades pedagógicas na Aula do Porto: "Alem disto o ter sacrificado a sua propria habitação p.ª a transformar em Offecinas e forjas; os moveis de sua casa detriorados no serviço da mesma obra; a sua familia [o doc. diz adiante que o pintor já se achava viúvo e com dois filhos] sofrendo imensos emcomodos; e finalmente a sua saude de todo arruinada pela continua agitação em q. vive há mais de dois annos; e neste mesmo estado providenciando com a maior energia a Aula de Dezenho da Real Academia da Marinha, e Commercio da Cidade do Porto; afim de concervar as bases por elle estabelecidas na ditta Aula p.ª o augmento das Bellas Artes no seu Pays; unico objecto a q. todo se dedica".

1815

Sequeira desenha e dirige a execução de uma série de peças cinzeladas em ouro – o punho de uma espada de honra, insígnias, condecorações e outros objectos – com que o exército português quisera presentear o Marechal Beresford, já galardoado com o título de Marquês de Campo Maior.

1816

Agosto, 14

Em carta a Pereira Forjaz, Sequeira assinala que trabalharam na Baixela 142 oficiais, deles destacando 72 operários de mérito. Nesta relação constam os seguintes mesteres: desenhador, escultor, abridor, lavrante, oficial de lima, oficial de martelo, torneiro, cutileiro, fundidor, serralheiro, formador, oficial de malho, carpinteiro e correeiro.

Setembro, 10

Finalmente terminada, a Baixela embarca na fragata Pérola. Três dias depois, Sequeira apresenta a relação final dos custos, quase somando os cem contos (98,118$105).

Devem datar deste ano as pinturas A família do 1 ° Visconde de Santarém (MNAA) e Retrato de Mariana Benedita e Domingos (MNAA).

1817

Março, 27

Morre o filho, com três anos de idade.

Neste ano, Sequeira desenha uma peça para executar em prata (Lusitânia, esboço no MNAA) destinada a ser oferecida a D. Leopoldina por ocasião do seu consórcio com D. Pedro, no Brasil. Desenhou também o retrato dos noivos (MNAA).

1818

Janeiro, 17

Posse de Joaquim da Costa e Silva como Inspector das Obras da Ajuda. Convoca Sequeira para Conferências destinadas a reorganizar o trabalho de pintura no edifício; nessas ocasiões, o pintor reúne com colegas de profissão, entre eles Fuschini, que contra si tinha deposto no processo de 1808-09. Relata Costa e Silva num relatório posterior (1821): "Algumas vezes foi o dito Sequeira ao mesmo Palacio: pedio Modellos(..) fez Conferencias tanto no referido como em sua Casa e na de Cyrillo Wolkemar Machado, e huma dellas na do Marquez de Borba, a que assistirão o dito Marquez, o Ex-Governador Ricardo Raymundo Nogueira, o Dezembargador Domingos Monteiro de Albuquerque e Amaral, os dois Pintores Taborda e Fosquini, e eu tambem".

Setembro, 16

Tendo-se lembrado de que "seria hum estimolo muito agradavel a Sua Magestade [D. João VI], o ver em toda a estenção a vista da Cidade de Lisboa athe a barra, e de toda aque ofrece a Costa desde Cacilhas athe ao riba Tejo", Sequeira solicita ao Conde de Peniche e governadores do reino que lhe seja emprestada uma barraca de campanha de coronel, um soldado para a armar e desarmar e o apoio do juiz de fora de Almada, a fim de realizar os estudos para essa panorâmica (desenho no MNAA), a gravar por Benjamim Comte. Obtém o pretendido e, no mês seguinte, pede mais quatro cadeiras e duas mesas volantes "para com mais comodidade colucar as Camaras obscuras e opticas, para o Objecto da Vista q. tenciono fazer no Citio de Almada".

1819

Junho, 3

Para a continuação dos "Trabalhos do Prospecto da Cidade de Lisboa e outra banda, em os diverços pontos q. tenho destinado tanto na terra como no már", dirige-se a Pereira Forjaz para que lhe obtenha do Arsenal da Marinha uma embarcação grande e um escaler que o transportasse aos vários "pontos volantes", nomeadamente a nau S. Sebastião, fundeada no Tejo. Pede ainda uma vela grande para "cubrir a Barraca q. mandei fazer sobre o Terraço de S. Vicente", referindo-se por certo aqui à Torre de S. Vicente vulgarmente designada de Belém. Só lhe é facultada a vela e o acesso à nau S. Sebastião "no citio em que está". A obra da panorâmica de Lisboa viria a perder-se num incêndio, mas o Cardeal Saraiva diz que ainda a viu, em 1821, na casa de Sequeira, e muito adiantada.

Está datado deste ano o Retrato de José Clemente de Mendonça e Mendes (Col. particular).

1820

Dezembro, 16

A nova Junta de Governo saída do movimento liberal, presidida por Manuel Fernandes Tomás, encarrega Sequeira da execução de um retrato de D. João VI para a Sala das Cortes. A encomenda foi rapidamente satisfeita, já que a 5 de Janeiro do ano seguinte a Mnemosine Constitucional descreve assim o retrato – "El Rei Nosso Senhor posto em pé, do tamanho do Natural... tendo em seus hombros o Manto Real..." – e, a 20 do mesmo mês, o Diário do Governo indica a sua colocação por cima do trono que na referida Sala se havia preparado para o monarca. Hoje pertence ao Museu da Assembleia da República.

Dezembro, 30

O Astro da Lusitânia informa que Sequeira "está actualmente occupado na composição de dois quadros que os entendedores reputão como obras inteiramente primas da arte". Trata-se de Portugal à beira do abismo (antiga col. Mac-Bride) e da Alegoria à Constituição (MNAA).

1821

Fevereiro, 9

O deputado Pimentel Maldonado propõe nas Cortes que se erigisse, no Rossio, um monumento comemorativo das datas predominantes da revolução vintista (24 de Agosto, sua eclosão no Porto; 15 de Setembro, adesão de Lisboa; e 1 de Outubro, chegada a Lisboa da Junta Provisional de Governo). Aparecem quatro projectos, mas é o de Sequeira que merece a aprovação do Congresso. Abre-se subscrição pública para a sua concretização.

Março, 21

Por aviso da Regência, Sequeira é solicitado a colaborar na formação de uma Academia, "em que se preparem todos os trabalhos de pintura, que sirvam para ornato de Palácios Reaes, outros Estabelecimentos e Edifícios Nacionais", mas que sirva também de Escola, "em que se possa, ou escolher, ou fazer progredir os engenhos proprios para esta grande Arte". Trata-se da primeira intenção oficial manifestada quanto ao estabelecimento do Ateneu ou do Liceu de Belas Artes (cf. 1823).

Abril, 23

Sequeira escreve ao Soberano Congresso propondo-se "offertar as produções do seu engenho na execução da representação dos feitos mais memoraveis da epocha actual, e deixar à posteridade os monumentos, que sirvão de honra, estimulo, e entusiasmo aos Successores dos benemeritos da Patria, e dignos Representantes da Nação, em dous grandes quadros". Um deles é a Alegoria à Constituição, que já estava em curso de realização; o segundo, "como feliz resultado do primeiro, he a Representação do Augusto Congresso, personalisados os Dignos Representantes da Nação nas primeiras Sessões em Cortes" - projecto que resulta na esplêndida série de desenhos de "Retratos dos Constituintes” (MNAA). Solicita que lhe disponibilizem edifício próprio para a realização do projecto, que o preparo e despesas inerentes — "aliás de pouca monta" — sejam consideradas como despesas das próprias Cortes e que "durante esta Incumbencia, nenhuma outra Authoridade possa interromper nem alterar a sucessiva applicação do recorrente". No dia seguinte, o Congresso aprova inteiramente "a patriotica Offerta" e as condições requeridas.

Junho, 21

Ouvida a Comissão das Artes e Manufacturas, o Congresso disponibiliza salas da Aula do Comércio para atelier e residência de Sequeira, enquanto durasse a execução "dos dois grandes quadros que devem servir de Monumento á nossa gloriosa Regeneração Política".

Agosto, 18

As Cortes resolvem que no dia 15 de Setembro seja lançada a primeira pedra do monumento do Rossio, "tendo para isso approvado com algumas alterações nos emblemas o desenho offerecido por Domingos António de Sequeira".

Setembro, 15

Lançamento solene da primeira pedra do monumento do Rossio, com a presença de D. João VI e de alguns membros da família real, regressados a Portugal em 4 de Julho. Expõem-se, na sala do risco do Arsenal da Marinha, os dois modelos de Sequeira bem como um outro, da autoria de Joaquim Rafael, para monumento análogo a erigir no Porto. Sequeira fica encarregado da "Direcção da dita Obra até ao seu ulterior complemento".

Novembro, 6

Por decreto das Cortes Constituintes é suprimido o lugar de director da Aula de Desenho do Porto, que Sequeira ocupava desde 1806 e que lhe rendia 600 mil réis anuais.

Dezembro, 1

Relatório da Comissão de Artes e Manufacturas acerca de um novo projecto para a construção de uma sala de sessões das Cortes, anexa ao Colégio dos Nobres. Apresenta-se o desenho escolhido, de Luis Chiari – "o mais proprio, tanto por ser aquelle cuja execução em mais breve tempo se conseguirá, por ser despido d'ornatos, e bellezas d'arquitectura, como por ser pelas mesmas razões o menos dispendioso" – e refere-se que "o habil e celebre Artista Portuguez Domingos António de Sequeira, fez algumas alterações no referido risco que muito concorrerão para a sua elegancia".

Dezembro, 31

Criação do Banco de Lisboa (antecessor do Banco de Portugal). Sequeira está entre os primeiros accionistas do banco e é de sua autoria o desenho das notas emitidas no ano seguinte, bem como o esboço do selo da nova instituição.

1822

Janeiro, 10

Sequeira apresenta às Cortes desenhos de figurinos para uniformes de ministros de estado e diplomáticos.

Abril, 19

Sessão das Cortes que recebe uma representação de Sequeira "em que expõe os estorvos que tem experimentado no desempenho da obra de que foi encarregado do Monumento do Rocio". Neste mês, Luis da Silva Mousinho de Albuquerque envia-lhe, de Paris, uma prensa litográfica, pedra e utensílios próprios para gravar. Sequeira desenvolverá, em seguida, os primeiros trabalhos de litografia no nosso país.

Maio, 16

Eleição dos corpos gerentes da Sociedade Promotora da Indústria Nacional, instituída em Abril. Sequeira é eleito para a Comissão das Artes Mecânicas e desenha uma medalha para a Sociedade, destinada a galardoar os industriais distintos.

Julho, 8

A Comissão de Artes e Manufacturas é de parecer que as despesas relativas aos dois quadros que Sequeira realizava para o Soberano Congresso lhe sejam integralmente pagas.

Outubro, 22

As Cortes aprovam o pagamento das referidas despesas, efectuadas até à data, mas ordenam "que se suspenda a execução dos sobreditos quadros". Neste mês, Sequeira envia circulares a todos os municípios convidando-os à subscrição de um seu projecto paralelo ao do Rossio, um segundo monumento compreendendo uma estátua de D. João VI, a erigir na Praça dos Remolares ao Cais do Sodré. Descreve pormenorizadamente o projecto – "este Monumento he o triumpho do primeiro Rei Constitucional, o Senhor D. João VI, elevado pelas cinco Provincias de Portugal, Reino do Algarve, e Ilhas Adjacentes…" -, adianta que o lançamento da primeira pedra deveria ocorrer a 26 de Fevereiro do ano seguinte, dia de aniversário do monarca, e que a praça passasse então a chamar-se de D. João VI.

Novembro, 22

Morte de Manuel Fernandes Tomás, figura primacial do liberalismo vintista. Ainda neste ano ou no seguinte Sequeira colabora nas homenagens ao estadista e desenha um projecto para gravura de subscrição pública a favor da família (MNAA).

É certamente deste ano o Retrato de Mariana Benedita, filha do pintor (MNAA).

1823

Janeiro, 16

Debatem-se nas Cortes os ordenados dos Pintores de Câmara, inscritos na verba orçamental relativa ao Palácio da Ajuda, e a questão da organização do ensino das artes pelo Estado. Borges Carneiro, Rocha Loureiro, Freire de Carvalho e Manuel Aleixo reconhecem nos seus discursos os merecimentos de Sequeira, mas a sua pouca dedicação ao ensino é também rudemente apreciada, produzindo-se moções e insinuações várias para que o realizasse em escola adequada que deveria estabelecer a fim de continuar a receber os seus vencimentos. Uma passagem da intervenção de Pato Moniz pretendia resumir o assunto em debate: "A questão principal he o que se ha de dar a este homem: mas quantas questões se tem enlaçado com ella? Argumenta-se com a boa fama e pericia artistica de Domingos António de Sequeira: não há dúvida que merece contemplação, mas he por essa contemplação, ou como pintor da camara, que se lhe ha de dar o ordenado, que até agora disfructa? Esta he a questão principal, tudo o mais he divagar (...) Convenho que a este homem se dê alguma penção, mas a titulo de pintor da camara nem um real. Os empregados da casa real devem ser pagos pela dotação de El Rei, e não pelo thesouro publico". A sessão acabaria por aprovar uma redução de 400 mil reis no vencimento de Sequeira estabelecido desde a sua nomeação como Primeiro Pintor de Câmara e Corte, em 1802.

Março, 25

Projecto de estatutos do Ateneu das Belas-Artes. Lê-se no preâmbulo: "O Atheneo he composto de professores e de amadores das Bellas Artes. O seu fim he estabellecer e propagar na Nação o conhecimento delias. Os seus meios são: instrução regular e gratuita; premios e distinções concedidas ao merecimento". E no capítulo II: "O Atheneo declara por seu Socio fundador ao Senhor Domingos Antonio de Sequeira, ao qual tocará a Presidencia perpetua do Concelho de Direcção". Os estatutos seriam aprovados a 27 de Abril, começando logo a funcionar o novo estabelecimento. Um mês depois, com a queda do regime liberal, dispersam-se os organizadores, afasta-se o pessoal docente e encerram-se os cursos.

Abril, 10

Segundo portaria da Câmara de Lisboa, encara-se uma nova localização, agora o Passeio Público, para o projectado monumento a D. João VI – "Julga a Camara que não só será facil o acabamento do Passeio Publico (...) mas tambem a coroação desta obra com a inauguração em seu centro de uma Estatua do melhor dos Reis Constitucionaes o Senhor D. João VI (já projectado pelo nosso celebre Artista Sequeira)".

Maio, 2

O Intendente das Obras Públicas faz saber que no dia 9 se admitiriam "os lanços para se arrematar a obra da Praça do Rocio, e parte da obra do Monumento, a quem por menos preço, e com as precisas seguranças se encarregar da sua construção".

Maio, 9

Na sequência do debate de 16 de Janeiro nas Cortes, promulgam-se quatro decretos criando e regulando o exercício de uma Escola de Desenho de História e Pintura "no Liceu das Bellas Artes estabelecido no Rocio", e encarregando Sequeira de a organizar e reger. Aprova também a requisição de Caetano Aires de Andrade para o "assistir e ajudar nas respectivas lições".

Maio, 27

Vila-francada, termo do constitucionalismo. Dias depois é arrasada toda a obra do monumento do Rossio.

Setembro, 7

Sequeira e sua filha embarcam para Plymouth. Visitam Londres, onde se demoram por oito dias, e chegam a Paris no princípio de Outubro. O pintor leva cartas de recomendação para certos correspondentes em Havre, Bordéus e Toulouse, certamente na eventualidade de não pretender estabelecer-se na capital francesa.

Outubro, 9

Escreve de Paris a João Baptista Verde, seu cunhado, contando-lhe impressões da viagem e de quanto foi bem recebido pelo Marquês de Marialva, de novo reintegrado como embaixador de Portugal na capital francesa. — "aqui temos com elle visto ja couzas das Bellas Artes muito respeitaveis".

Novembro, 3

Informa de novo o cunhado sobre as suas deambulações — "a grande Galaria do Luvre he tão bem couza espantoza, são tantos os Objectos que ha para ver que eu agora he que princepio a ir ver o preciouzo com o meu grande condutor e amigo o Ex.mo Marquez de Marialva, pois emprega os dias vagos p.ª me conduzir e igualm.te a Nini emquanto não entrou no Colejo" – e do seu convívio com os portugueses do círculo do embaixador — "hua bella Sociedade pois que são todos escolhidos e não se ademitem os que a jente não conhece he tudo papa fina e gente do melhor Caracter, e ricos, e que a maior parte tratasse com estadão (...) Aqui podesse viver com toda a liberdade gastar muito o pouco sem que ninguem lhe emporte". Este feliz reencontro com o seu protector não duraria no entanto muito tempo, pois o Marquês de Marialva morre a 22 de Novembro. Sequeira dedica-lhe uma litografia, iniciando com ela uma série de trabalhos litográficos realizados durante as suas estadias em Paris, onde este novo processo de gravação de imagens estava muito avançado.

Datado deste ano um desenho retratando D. Miguel (MNSR). Existe uma outra versão datada do ano seguinte.

1824

Abril, 28

Reside no n°94 Rue Faubourg St. Honoré e anuncia ao cunhado que contava fazer um quadro para o Salon do Louvre. Envia exemplares de estampas litográficas que ia executando.

Agosto, 25

Abertura do Salon. Sequeira expõe a pintura Morte de Camões (hoje não localizado, desenhos preparatórios no MNAA e MNSR) e, já depois da inauguração do certame, um Repouso na fuga para o Egipto (também não localizado). O Conde de Forbin [v. 1809], agora director-geral dos museus de França, era membro influente do júri de admissão das obras e encarregado da sua colocação.

Setembro, 27

Informa Baptista Verde de que fora passar algum tempo a Nantes, como refrigério do seu trabalho, e discorre sobre a boa recepção da Morte de Camões, quer na imprensa, quer por parte do pintor François Gérard. A carta é, além disso, um testemunho importante acerca da sua própria estratégia de participação no Salon: "ora como eu visse e obeservasse que aqui em geral os pintores Francezes apurão-se muito no brilhantismo das Cores, propusme p.ª fazer algum destaque delles fazer hu painel tetcro e hu sugeito triste e o lume de hu.ª candeia, para só fazer ver o ifeito Optico e esperção, do que rezultou que O Barão de Gerard que he o Primeiro Pintor del Rei de França, e na minha opinião da Europa, quando convidei a vir vello disse VERDADEIRAMENTE VEJO NO VOSSO PAINEL QUE VÓS SOIS HUM PINTOR CONSUMADO DESDE OS PÉS ATHE A CABEÇA, E O VOSSO PAINEL HE FEITO PARA OS GRANDES ARTISTAS MAIS DO QUE PARA O VULGO E DELEITANTES QUE AMÃO SO OBONITO, e em geral todos os outros por diferentes frazes me dezião omesmo". Pede ainda ao cunhado que lhe mande umas laranjas para obsequiar Gérard, em cuja quinta havia jantado dias antes – "tratasse melhor q. os duques em Portugal, e he hum pintor &.°".

1825

Janeiro, 14

Cerimónia de entrega de prémios do Salon. Sequeira recebe, das mãos de Carlos X, uma das cem medalhas de ouro a atribuir aos participantes mais destacados. "Isto com os elogios com q. me honrão os primeiros Artistas, e as refleçoens q. nos diarios ó jornaes fazem dos meus quadros julgo hum soficiente para a piquena amostra que fiz em pouco tempo, e os amigos conhecerão que ainda doente procuro de estudar de modo q. onome de Portugal não seja confondido na ignorancia" (carta ao cunhado datada de 18). Nesta missiva emite, a propósito do seu discípulo no Ateneu Francisco Paula Cerqueira, um incisivo juízo sobre a escultura em Portugal: "que elle tenha despozição para a escoltura não dovido, mas para ser Escultor não he em Lisboa que poderá fazer couzas q. meressa apena só para bonecos de rapazes brincarem nos prezepios se atanto pode chegar as obras de escultura em Portugal". Anuncia já projectos de mudança, contando viajar para Itália nos meados do ano, com o seu amigo Pedro de Sousa, que chegara a Paris em Setembro, a fim de assistir ao Jubileu em Roma e procurar local que fosse mais conveniente para a sua saúde e estada de sua filha – "he verdade que se eu tivesse boa saude para poder trabalhar aqui tenho meios de ganhar mui decentemente para a minha subsistencia e de minha filha mas a saude não mo premite, apezar que estou muito melhor e com grande deferença do q. estava em Lisboa".

Março, 19

Envia a Baptista Verde o retrato a óleo de Pedro de Sousa, dando-lhe instruções para que ele próprio se encarregue de lhe aplicar o verniz. Queixa-se de problemas de saúde, mas continua a trabalhar – "agora estou com hum quadro de retratos de familia em meio corpo do tamanho do Natural que espero acabar antes da minha partida p.ª Italia". Trata-se do retrato de Domingos Borges de Barros, embaixador do Brasil em Paris e depois Visconde da Pedra Branca, com sua esposa e dois filhos (Museu de S. Paulo). Diz que o nosso embaixador em Roma, Domingos António de Sousa Coutinho, Conde do Funchal, já estava à sua espera e preparadas acomodações em Santo António dos Portugueses, acrescentando: "e lá vou fazer este anuo o Retrato do Nosso Augusto Soberano do tamanho do Natural por hu.ª emcomenda q. tive do mesmo Embaixador".

Está datado deste ano o Retrato de Adrião Ribeiro das Neves (Oxford, Ashmolean Museum), pintado ainda em Paris. É, neste género pictórico, a obra de Sequeira mais próxima do estilo de Goya.

1826

Maio, 26

Sequeira regressa a Paris.

Julho, 26

Escreve ao cunhado com palavras de regozijo pela morte (a 10 de Março) de D. João VI – "Agora ja pode escrever livrem. te fugio o Papão que fazia medo athe aos mais afoitos, Viva O Grande Imperador, e Rei de Portugal Viva a Nova Constituição, e Vivão os Portuguezes honrados". Acrescenta estar a concluir uma litografia com o retrato de D. Pedro, "Grande Imperador e Rei e nosso Redemptor", e que conta partir nos fins de Agosto para Roma, indicando já a sua nova direcção, no n°56 da Rua de Condutti. Pede notícias dos seus amigos José Inácio de Andrade e Bernardo José de Abrantes e Castro, ambos liberais, e manda lembranças "a todos que julgar q. são amigos, por que dezejo sempre conresponder com amizade aquem mameresse, e a quem não q. vão ao Diabo tudo que he canalha e gente fengida Malditos que possão serem desterrados da suciadade tal ipocrizia, estou muito escaldado".

Setembro

Acompanhado pela filha, Sequeira estabelece-se definitivamente em Roma.

Outubro, 7

O secretário da embaixada escreve a Sequeira exigindo urgência no acabamento do retrato de D. João VI e que se obrigue a terminá-lo até ao próximo inverno (hoje na embaixada de Portugal junto da Santa Sé).

1827

Abril, 24

Sequeira escreve a João Baptista Ribeiro, seu antigo discípulo e lente de desenho na Aula do Porto, recomendando-lhe que assista ao desembarque e eventual reparação de alguns quadros e esbocetos que João Allen, coleccionador, acabara de adquirir em Roma.

Acarinhado pelo meio artístico de Roma, liga-se a um amplo movimento de artistas e forças sociais para criar a famosa Societá degli Amatori e Cultori di Belle Arti, cujos estatutos previam a realização anual, no Campidoglio, de uma exposição colectiva dos seus sócios. É para as primeiras exposições anuais da Sociedade que Sequeira projecta a série de quatro telas, de tema religioso, que irão ser integradas nas colecções do Duque de Palmela após a morte do pintor e geralmente consideradas como o seu mais notável “testamento artístico”.

 A Descida da Cruz, primeira obra desta série, é pintada em Castel-Gandolfo, durante o Verão.

Outubro, 29

Casamento, em Roma, de Mariana Benedita com João Pedro Miguéis de Carvalho e Brito, secretário da embaixada de Portugal e, mais tarde, Barão de Venda da Cruz. O casal viria a ter dezasseis filhos. Pelo menos os dois primeiros, Maria José (n.1828) e António Filipe (n.1830), nasceram ainda em vida de Sequeira.

1828

Segundo testemunho de seu genro, Sequeira pinta em três meses a Adoração dos Magos, durante uma estadia de Verão de novo em Castel-Gandolfo. (De facto, uma carta de Gianni endereçada de Paris, a 14 de Setembro, refere: "Mi fa piacere di sentire che siete vicine a terminare il Quadro dell'Adorazione de Magi"). A Ascensão e o Juízo Final seriam realizados em anos subsequentes – "Os dous outros, refere Miguéis, foram pintados em Roma quando já a sua saude começava a decahir".

Outras pinturas do último período romano, na maior parte estudos a óleo: Susana e os velhos (Col. part.), Loth (Col. part.), Prisão de Cristo (Casa Museu dos Patudos), Negação de S. Pedro (Museu do Banco de Portugal), Coroação da Virgem, A Virgem em Glória, Cristo Escarnecido, Mater Dolorosa e Tobias curando o pai da cegueira (todos do MNAA). Perderam-se ou não estão identificadas as seguintes: Baptismo de Cristo e Jesus crucificado (para os Torlonia, duques de Braciano); A Fé ou As grandes virtudes teologais (para a Duquesa de S. Petersburgo); Santa Verónica (para igreja das Capuchinhas de Roma); Caminho do Calvário (para a Igreja da Paz, Roma); Nossa Senhora, o Menino e S. José; O Salvador e Pregação de Santo António aos peixes.

O governo miguelista suspende-lhe a pensão do real bolsinho. Na prática, a suspensão manter-se-á pelo menos até 1835.

1829

Passa o Verão em Castel-Gandolfo, onde é acometido por um ataque de gota.

1830

Fevereiro, 4

D. Pedro IV, Imperador do Brasil, agracia Sequeira com a Ordem Imperial do Cruzeiro.    

1831

Dezembro, 4

É admitido como membro da Insigne Congregazione De Virtuosi al Panteon.

1833

Primeiros ataques apopléticos. Sequeira deixa de pintar.

1834

Abril, 1

Reunião do Conselho Académico da Academia de S. Lucas, conferindo a Sequeira o lugar de Conselheiro da Classe de Pintura.

Outubro e Novembro

A correspondência oficial de Migueis de Carvalho, a propósito do pagamento de pensões ao seu sogro, refere que Sequeira "se acha, vai para dous annos, quasi inteiramente privado do exercicio das suas faculdades intellectuaes, em consequencia de repetidos attaques apopleticos que tem padecido" e impossibilitado de requerer, pelo "proprio punho", os ordenados atrasados.

1837

Janeiro, 19

A Academia Real de Belas-Artes de Lisboa, fundada no ano anterior, pede a nomeação do pintor para seu Director Honorário.

Fevereiro, 9 e 18

Sequeira é nomeado Comendador da Ordem de Cristo. Publica-se em Diário do Governo o decreto que confere a Sequeira o cargo indicado pela Academia.

Março, 7

Domingos António de Sequeira morre, em Roma, aos 69 anos

Actualização da cronologia inicialmente publicada no catálogo da exposição Sequeira, um Português na Mudança dos Tempos

 

Comentários

Os comentários a este artigo estão fechados. Saiba porquê.
Estudo de figura, desenho a sanguínea, Biblioteca Pública e Arquivo Distrital de Évora.
Sacrifício de Isaac, desenho a lápis e aguarelado, 1789, Accademia Nazionale di San Luca, Roma.
Moeda de César, óleo sobre tela, Colecção Família Loureiro Borges
Conversão de S. Paulo, 1791-1792, Alpiarça, Casa Museu dos Patudos. Carlos Monteiro
Pregação de S. João Baptista, 1793, Fundação da Casa Bragança, Paço Ducal de Vila Viçosa. José Pessoa
Estudos para a morte de Cleópatra, desenho, 1791-1794, MNAA. Luisa Oliveira
Retrato de Bocage, 1797, Óleo sobre tela, Colecção Particular.
S. Bruno em oração, c.1800, MNAA. José Pessoa
Retrato do Príncipe Regente D. João, 1802, Palácio da Ajuda. José Pessoa
O Príncipe Regente passando revista às tropas na Azambuja, 1803, óleo sobre tela, Palácio Nacional de Queluz.
Lenda do Baptismo de D. Afonso Henriques, estudo a óleo, 1803-1806, MNAA. José Pessoa
Junot protegendo a cidade de Lisboa, 1808, Museu Nacional de Soares dos Reis. Carlos Monteiro
Retrato de João Baptista Verde e Mariana Benedicta Vitória Verde, 1809, MNAA. Luisa Oliveira
Alegoria às Virtudes do Príncipe Regente D.João, 1810, Palácio Nacional de Queluz José Pessoa
Retrato de João Pedro Quintela (Farrobo), 1813, MNAA. Luisa Oliveira, José Paulo Ruas
A Sopa de Arroios, gravura, 1813, MNAA José Pessoa
A família do 1 ° Visconde de Santarém , MNAA. Luisa Oliveira, José Paulo Ruas
Retrato de José Clemente de Mendonça e Mendes, 1819, óleo sobre tela, Colecção Dr. João Gonçalo do Amaral Cabral.
Alegoria à Constituição, estudo a óleo, 1821, MNAA José Pessoa
Nota do Banco de Lisboa, 1822 (1ªemissão), desenho de Sequeira, Impressão calcográfica a preto, Colecção Banco de Portugal.
Retrato da Mariana Benedita, filha do pintor. Óleo sobre tela, 1822-1823, MNAA.
Estudo para gravura da Subscrição a favor da família de Manuel Fernandes Tomás, 1822-1823, MNAA. José Pessoa
Retrato do Príncipe D. Miguel, 1823, desenho a carvão e lápis sobre papel, Câmara Municipal do Porto.
Estudo para a Morte de Camões, desenho, 1823-1824, MNAA. Luisa Oliveira
Retrato de Adrião Ribeiro das Neves, 1825, óleo sobre tela, Ashmolean Museum,Oxford.
D. Pedro IV, Imperador do Brasil