José Cardina anda na sua vida, a trabalhar no campo, e é preciso telefonar-lhe para combinar uma visita ao Museu Cardina. Mas vale a pena esperar por uma altura em que ele possa, porque este museu – “estão aqui 20 anos de trabalho”, diz-nos – é um testemunho único não só da persistência de um homem como de um tempo da história desta ilha, em que Porto Santo era “o celeiro da Madeira”, com os seus campos de cereais e moinhos de vento.
Foi quando viu este mundo, que conhecia de pequeno, começar a desaparecer que José Cardina, 55 anos, decidiu registá-lo. E fê-lo de várias maneiras – nas extraordinárias miniaturas que mostram todas as actividades agrícolas e ofícios que existiam, mas também nos ainda mais incríveis modelos em tamanho natural, como o moinho que nos mostra neste momento. “Levei quatro meses para o fazer, mas fiz tudo sozinho. Quando comecei, achei que não ia conseguir”, conta. Mas a réplica é em tudo igual ao último moinho que funcionou em Porto Santo, e tudo no interior funciona da mesma maneira, com mós para a moenda trigueira e a moenda alva, que deixava a farinha mais fina “para o senhor rico”.
“Ainda me lembro de lavrarem com o arado, de ver os moinhos a funcionar”. Quando começou a fazer as suas peças, “nunca pensou que isto ganhasse esta dimensão”. Mas as pessoas, ao perceberem o gosto que ele tinha – “que vem de pequeno, aos onze anos cheguei a fazer um arado” – davam-lhe algumas peças ou instrumentos agrícolas já sem utilidade e ele recuperava-os.
Hoje o museu – também o edifício foi construído por ele – é o guardião desse tempo desaparecido. E quando há instrumentos que não conhece bem, pesquisa. “Já comecei a recolher fotos para complementar tudo isto." Há um arado, um carro de bois com uma peça de 1912, um lagar de madeira, um trilho, um sistema de debulha para os cereais em que as pessoas iam em cima de uma pá de madeira com pedras incrustadas por baixo, que girava para triturar a espiga e separar a palha, um sistema de moagem por tracção animal – “este fiz a partir de uma foto ampliada e levei um mês de férias inteiro para o terminar”.
Inaugurado em 2006, o Museu Cardina foi uma obra construída ao longo de vinte anos pelas mãos de um homem. Se hoje não tem as portas abertas é porque as pessoas não querem pagar o bilhete que permitiria ter um funcionário aqui, explica, com mágoa, José Cardina. Só podemos esperar que o tempo prove como estão enganados ao não saberem dar valor à história que aqui se conta.
Comentários