Cinema
Escolhas de Jorge Mourinha, Luís Miguel Oliveira e Vasco Câmara
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10
Nostalgia da Luz
De Patricio Guzmán
Estreado em Portugal à boleia do posterior O Botão de Nácar, este documentário de 2010 o mestre chileno Patricio Guzmán é uma das obras-primas recentes do género. É um olhar poético, apaixonado, sobre a sangrenta história de um pequeno país justaposta ao infinito do universo à sua volta sugerindo que a memória histórica pode, ela própria, ser entendida como uma forma de arqueologia infinitamente curiosa. Jorge Mourinha
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9
Sítio Certo História Errada
De Hong Sang-Soo
A extraordinária imaginação de Hong Sang-Soo posta ao serviço, como habitualmente, de uma intriga minimalista e à beira do “estruturalismo” – no caso, a mesma história repetida na segunda parte do filme, com ligeiras alterações de pormenor (como num “e se?”) que trazem um clima diferente. A graça da mise en scène de Hong, a profunda justeza dos actores, o humor mais subterrâneo ou mais superficial: tudo isto faz do coreano um dos maiores (e mais discretos) realizadores em actividade. Luís Miguel Oliveira
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8
A Academia das Musas
De José Luis Guerín
Desconstrução inspiradíssima do academismo sob a forma de uma comédia romântica que só aos poucos se revela como tal, sempre a perguntar onde começa a realidade e termina a ficção, A Academia das Musas é a história de um professor pinga-amor e das mulheres que se deixam levar na sua cantiga. Como se a poesia não passasse de uma boa desculpa para sacar miúdas. J.M.
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7
À Sombra das Mulheres
De Philippe Garrel
À superfície (o preto e branco àspero, as histórias de amores mais frustrados ou mais concretizados) é o “Garrel do costume”. Esgravata-se e percebe-se que essa ideia é um erro: o triângulo amoroso é a coisa mais desolada que ele filma em muitos anos, a miséria sentimental a rimar com a miséria material, a mesquinhez e o desespero vividos em quartos esconsos e paredes manchadas pela humidade. Curto, brusco, violento, e sequíssimo: enorme filme. L.M.O.
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6
Boi Neon
De Gabriel Mascaro
O cenário são as vaquejadas do Nordeste brasileiro, misto de rodeo, feira agrícola (a lama, o esterco), desporto e espectáculo de electrónica e forró (o néon). Com uma delicadeza enorme, Gabriel Mascaro observa o espectáculo a acontecer, interceptando-o mas não estando disposto a descodificá-lo: é uma paisagem socioeconómica que muda e uma paisagem humana que é um mundo de possibilidades. É um filme de prazer: a sensação fulminante de descobrir corpos como coisas a acontecer e não estereótipos. Vasco Câmara
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5
O Ornitólogo
De João Pedro Rodrigues
Talvez o filme mais solto de João Pedro Rodrigues, sempre a encontrar uma porta nova para abrir ou um caminho diferente para seguir, e ao mesmo tempo o mais cifrado, o mais misterioso, pela pluralidade de alusões – da natureza (e da ornitologia) ao imaginário hagiográfico, transposto por milhentas sugestões da pintura clássica. Mas misterioso, sobretudo, pelo processo de “encarnação de um cineasta” (literalmente: um realizador a tomar o lugar dum actor), que no fundo é a grande narrativa de O Ornitólogo. L.M.O.
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4
Ela
De Paul Verhoeven
Paul Verhoeven “isabelle-huppertou”. Foi a lenta mas persistente vertigem do extático Ela: uma actriz abandonou-se ao seu realizador para, finalmente, o dirigir – transformando-se ela no princípio da mise-en-scène. Isabelle entrou para uma genealogia, a das mulheres de Verhoeven, e completou-a: completou Renée Soutendijk, Sharon Stone, Elizabeth Berkley e Carice van Houten, mulheres de acção que queriam conquistar o mundo, mas mulheres de acção sem visão do mundo. V.C.
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3
A Lei do Mercado
De Stéphane Brizé
Vincent Lindon, interpretando um desempregado, inicia o processo de cursos de formação, de aconselhamento profissional, com vista ao mercado de trabalho. O mercado tenta violentar a sua moral. A terceira colaboração de Stéphane Brizé com o actor, depois de Mademoiselle Chambon (2009) e Quelques heures de printemps (2012), passa do habitat íntimo e sentimental dos filmes anteriores para o espaço público e político. É a exposição e violentação de um corpo, o de Lindon, que fala com o silêncio dos actores clássicos. V.C.
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2
Love Is Strange – O Amor é uma Coisa Estranha
De Ira Sachs
A arte do melodrama está longe de estar perdida no cinema americano. A melhor prova disso é a elegância, a delicadeza, a sobriedade do filme de Ira Sachs, história de um casal com 40 anos de vida em comum forçado a viver separado enquanto procura resolver os seus problemas financeiros e de habitação. Basta um realizador que saiba criar espaço e actores que tenham confiança nele. J.M.
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1
Os Oito Odiados
De Quentin Tarantino
Está no ar do tempo receber mais um Tarantino como um Tarantino a mais. É fácil ver em Os Oito Odiados a repetição das idiossincrasia do realizador numa altura em que as idiossincrasias do realizador começam a saturar alguns – chegado ao oitavo filme, Quentin é acusado de ser mais do mesmo (e, contraditoriamente, de já não ser o mesmo). Ainda para mais rodeou a distribuição de preciosismos que não tendo chegado a todos, e até por causa disso, marcaram o filme com marcas de excepcionalidade e de afectação rétro. Por exemplo, o “intervalo”, coisa do passado que existiu nas sessões especiais que compuseram o road show com “cartão” no início e introdução musical a inundar o ecrã com Ennio Morricone, que Tarantino desenhou para algumas salas, em algumas cidades, que tiveram capacidade de se (re)equiparem para as cópias em 70 mm. Ora, o que hoje se revela excepcional neste huis-clos que se fecha com toda a violência no interior é a sua actualidade. No saloon d’Os Oito Odiados está toda a América, divisões e ressentimentos de um país improvável. Os tempos do mainstream americano não são os de continuadas e determinadas sevícias, como as que (se) inflige Os Oito Odiados. Não há nada igual a isto, hoje. A última vez que o vimos foi nos anos 70, com DePalma, Carpenter, Altman ou Polanski, cinema que está neste saloon sem sensibilidade para o pastiche: o cinema é o país de Tarantino, é a sua História, é a sua política. Esplendorosa é a forma como excita a capacidade do espectador para “ver filmes” dentro deste filme, transformado em imenso e demoníaco espaço mental. V.C.
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