Saúde de proximidade

Duas médicas portuguesas, uma experiente e outra em início de carreira, mostram o dia-a-dia da saúde familiar num centro de saúde em Portugal. Uma realidade que contrasta com a Holanda, que é um exemplo mundial nos cuidados de saúde primários. O que podemos aprender com um país que tem um sistema baseado em seguros de saúde obrigatórios?

Ver vídeo
Desça para ler

Cobertura Nacional dos Médicos de Família

Fonte: Ministério da Saúde

Distribuição Nacional dos Médicos de Família

Fonte: Ministério da Saúde

Número de inscritos no Agrupamento de Centros de Saúde Almada Seixal

Fonte: ACES Almada-Seixal

Incentivos só levaram 192 médicos para zonas carenciadas

O Serviço Nacional de Saúde (SNS) tinha, no final do ano passado, 192 médicos a “receber incentivos para fixação em zonas carenciadas”, segundo dados da Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS) enviados ao PÚBLICO. A medida criada pelo governo PSD/CDS foi revista no ano passado pelo actual executivo, que aumentou a remuneração adicional a dar aos médicos e reduziu o tempo de contrato. Ordem e Sindicato Independente dos Médicos afirmam que é preciso abrir mais vagas para colocar clínicos onde são precisos.

Os primeiros incentivos para levar médicos para zonas carenciadas foram criados em 2015, mas o impacto reduzido levou que o actual ministério revisse as regras, mudança que está agora a fazer um ano. Assim, em vez dos 21 mil euros brutos adicionais por um contrato de cinco anos na zona carenciada, os médicos passaram a receber cerca de 36 mil euros brutos por um contrato de três anos, sem serem obrigados a devolver ao Estado o montante recebido se decidirem ir embora antes daquele período. Acrescem ainda dias adicionais de férias, 15 dias por ano para formação e um regime preferencial de colocação dos cônjuges.

A ACSS adianta que “todas as vagas que constavam no despacho [referente a 2017] das zonas carenciadas foram preenchidas” e acrescenta que “o Ministério da Saúde tem já em preparação o diploma que apresentará as especialidades e entidades abrangidas em 2018, assim como os incentivos a atribuir aos profissionais”.

Mas não foi possível obter resposta em tempo útil sobre quantos médicos ainda recebem incentivos ao abrigo do primeiro despacho, quantos entraram directamente para este regime, quantos pediram alteração de regime ou solicitaram o fim do contrato antecipadamente.

O despacho 1788-B, a que a ACSS se refere, foi publicado em Diário da República a 27 de Fevereiro do ano passado e dizia que os incentivos podiam ser dados até um máximo de 150 médicos. Eram identificadas 34 especialidades distribuídas por 21 agrupamentos de centros de saúde, nove centros hospitalares, seis unidades locais de saúde e dois hospitais. Medicina geral e familiar, medicina interna, anestesiologia, ortopedia, radiologia e ginecologia eram algumas das especialidades que as várias unidades mais diziam sentir falta.

Ao contrário do que costuma acontecer, no ano passado só o concurso para a colocação de recém-especialistas de medicina geral e familiar foi aberto, ficando por lançar o da área hospitalar e as suas respectivas vagas. A lista do concurso lançado contemplava 128 vagas em centros de saúde considerados carenciadas em todo o país, incluindo centros de saúde em Sintra e Montijo. Tendo em conta o limite de 150 vagas carenciadas referidas no despacho 1788-B, sobrariam apenas 22 lugares a beneficiar de incentivos para os hospitais.

"Publicidade enganosa"

“O Sindicato Independente dos Médicos lamenta a publicidade enganosa que o Governo faz em relação a este tipo de incentivos. 150 vagas são metade dos médicos que o hospital de Portalegre precisa”, aponta o secretário-geral do sindicato. Jorge Roque da Cunha relembra que o concurso para a colocação dos clínicos que terminaram no ano passado o internato da especialidade nas áreas hospitalares ainda não foi lançado. “É lamentável que o ministério deixe estes médicos saírem para o privado ou para o estrangeiro.”

Para o bastonário dos médicos, Miguel Guimarães, 192 médicos colocados em zonas carenciadas ao abrigo dos incentivos “é pouco”. E lança três perguntas: “Se vagas colocadas no despacho foram todas preenchidas como o ministério diz, então porque faltam médicos em Beja, Faro, Aveiro, Viseu, Leiria, em quase todos os hospitais? E se este sistema funciona porque não abrem mais vagas destas no sítio onde faltam médicos? Será que permitiram aos hospitais mais carenciados fazer contratações à margem dos concursos?”

Miguel Guimarães também destaca a ausência de um concurso nacional para a colocação dos médicos que terminaram a especialidade em 2017 nos hospitais. “Constatamos a necessidade de milhares de profissionais de saúde. Mas continuamos sem resolver a questão, não por falta de pessoas mas porque aparentemente o Estado não está interessado em contratar, pois o que tem feito é atrasar os concursos. Continuo convencido, apesar dos incentivos poderem ser complementares, que se os médicos forem melhor tratados e lhes derem a possibilidade de cuidar dos doentes com as novas tecnologias e de acordo com o que aprenderam, com mais facilidade ficam nas zonas carenciadas”, afirma. Com Margarida David Cardoso