Há muitos meses, Derek Taylor sentou-se no seu apartamento, no Sul de Manchester, com pena de si próprio. Tanta gente a morte lhe tem levado. Males da idade. Completou 88 anos o homem alto, magro, de cabelos curtos, grisalhos, penteados para trás, e óculos rectangulares, de aros finos, a meio do nariz.
Não se deixou afundar na cama demasiado baixa para as suas pernas. Pegou numa caneta e num caderno de argolas e escreveu, com letras capitulares: “De vez em quando, toda a gente se sente sozinha”. Pensou no que tinha feito, noutras alturas, para afastar aquela sensação dolorosa. Como se alguém lhe tivesse pedido umas dicas, começou a fazer uma lista: “esforça-te para fazer novas amizades; inscreve-te num clube de um passatempo qualquer; vai ao centro comunitário e descobre que actividades há por lá; aprende a usar um computador na biblioteca local; pensa em arranjar um inquilino; serve-te mais vezes do telefone para contactar pessoas, não esperes que te contactem; liga a amigos e familiares com quem não tens falado; aproxima-te dos vizinhos; se puderes, faz voluntariado.”
Não enfiou as folhas numa gaveta. Entregou-as nos paços do concelho, um edifício imponente, neogótico, que peca por não ter sanitários públicos. Decorridos três meses, recebeu um telefonema. “Sabes aquelas notas que deixaste comigo?”, perguntou-lhe a funcionária. “Em breve, teremos o Fórum de Idosos. Seria muito bom que viesses e que lesses as tuas notas em voz alta para que todos pudessem ouvir.”
Derek alegrou-se com aquelas palavras, mas lembrou-se que já tinha um compromisso naquele dia. Declinou o convite. Não aguentaria ter uma reunião de manhã e outra de tarde. As suas dicas, porém, foram transcritas, impressas em papel A4 e distribuídas pelos presentes – recebeu uma dúzia de cópias a cores.
As grandes cidades do Reino Unido estão a encontrar formas de dar voz aos residentes mais velhos. Nenhuma como Manchester: desde o início do século desenvolve uma estratégia de valorização dos idosos que passa por ouvir a opinião de pessoas como Derek e de a ter em conta na hora de tomar decisões.
A câmara não pára de desafiar pessoas, grupos ou organizações a apresentar ideias – grandes ou pequenas – para tornar a cidade mais amiga dos idosos. Um Comité de Idosos reúne-se a cada seis semanas para escrutinar planos e políticas públicas; há idosos sentados em todos os grupos de trabalho criados para desenvolver a estratégia “Manchester amiga dos idosos”; um Fórum de Idosos reúne-se duas vezes por ano para debater problemas e soluções com os decisores políticos: e há cerca de 140 “campeões”, isto é, idosos que funcionam como intermediários entre as comunidades e as entidades culturais.
Manchester é uma espécie de farol da rede internacional de cidades amigas dos idosos, lançada pela Organização Mundial de Saúde (OMS) em 2010, porventura a primeira política global para o envelhecimento em meio urbano – baseada numa lista de verificação de espaços exteriores e edifícios, transportes públicos, habitação, participação social, respeito e inclusão social, participação cívica e emprego, comunicação e informação, serviços de apoio comunitário e de saúde. Integrou o grupo fundador e coordena a rede no Reino Unido.
Não é que o envelhecimento já tenha atingido níveis anormais em Manchester. Pelo contrário. A cidade mantém-se jovem e vibrante – só 9,5% da população tem mais de 65 anos, bem abaixo da média nacional (17,4%), mais ainda da média europeia (18,4%) ou da portuguesa (19, 6%), uma das mais altas do espaço comunitário. É que Manchester tem uma população idosa com um grau de exclusão invulgar no Reino Unido, resultado do declínio económico dos anos 1970/80, do que foi a vida das pessoas, do modo como a cidade se desenvolveu. E a câmara, controlada pelo Partido Trabalhista e liderada por Richard Leese, decidiu transformá-la numa “óptima cidade para envelhecer”.
Abordagem cidadã
As estatísticas são conhecidas. As sociedades mais desenvolvidas assistem a um aumento ininterrupto da esperança média de vida conjugado com uma quebra da fecundidade. Pelas previsões do Eurostat, lá para 2050 um terço da população europeia terá mais de 65 anos. Mesmo cidades com forte crescimento populacional como Manchester (19% entre 2001 e 2011) terão grande número de pessoas de 70, 80, 90 anos.
Há 15 anos que o trabalho de Paul McGarry, na Câmara Municipal de Manchester, é pensar e fazer pensar nos residentes mais velhos. Recusa a narrativa do envelhecimento como “fardo” – a retórica da “bomba demográfica” que irá “arrasar os sistemas de protecção social”, “dar cabo dos serviços nacionais de saúde”, “esmagar a produtividade”. Prefere a narrativa do envelhecimento como “conquista” da civilização.
É o discurso oficial de uma cidade que afirma não só desejar manter os seus idosos como querer atrair mais. Ouvimo-lo quando nos sentamos com McGarry no Café das Esculturas, um espaço singular no rés-do-chão dos paços do concelho: valorização dos conhecimentos e das experiências dos mais velhos e da sua capacidade de consumir, de investir, de gerar emprego, de estimular a economia.
A tónica importa, avisa. Para construir o seu modelo “age-friendly”, Manchester partiu do conceito de cidadão activo ou potencialmente activo, não do de utente, cliente ou paciente dos serviços sociais ou de saúde. Não nega que o envelhecimento aumenta a probabilidade de doença, isolamento, dependência, estigma. Afirma que compete a todos minimizar os riscos. Em vez de alimentar ressentimento por haver quem viva até mais tarde, procura reunir condições para que as pessoas sejam saudáveis, activas, independentes.
Um assunto de todos
Vem do outro lado do Atlântico o discurso sobre a necessidade das sociedades se prepararem. O conceito de envelhecimento activo emergiu nos Estados Unidos na década de 60 e chegou à Europa via OMS, que em 2002 emitiu uma orientação assente em três pilares: participação, segurança e saúde.
Manchester já estava pronta para se pôr na linha da frente. Logo em 2003 lançou um programa de valorização dos idosos, de acção pelo seu direito a reclamar a cidade, a usá-la. Apoiou-se muito nos trabalhos produzidos pelo Instituto de Investigação Colaborativa sobre Envelhecimento da Universidade de Manchester, liderado pelo sociólogo Chris Phillipson. Fez parceria com idosos, organizações de idosos, organizações comunitárias, grupos de voluntários, governo central, universidades.
A cidade tratou de desafiar os rótulos que se colam aos mais velhos, de que são lentos, de que são fracos, de que são dependentes, de que que não gostam de aprender coisas novas, de que são avessos às novas tecnologias. As ruas foram tomadas por cartazes enormes com imagens de idosos a fazer coisas banais. Num deles, via-se um grupo de mulheres preparadas para uma partida de basquetebol, noutro um casal heterossexual numa cena erótica, noutro um casal gay a passear de braço dado…
Para McGarry, mudar as percepções sociais deve ser uma prioridade de qualquer cidade que se queira tornar “amiga dos idosos”. O contexto ajuda a fazê-lo: os chamados “baby boomers”, os que nasceram no rescaldo da Segunda Guerra Mundial, têm estado a chegar à idade da reforma e possuem mais educação, mais poder de compra, mais capacidade de organização, mais consciência de direitos do que a geração anterior.
“Ainda há 15 ou 20 anos, pensionista era sinónimo de pobre no Reino Unido”, corrobora John Hannen, responsável pelo departamento de Investigação e Política do Centro de Organizações Voluntárias da Grande Manchester. “Hoje, não.” Embora no Reino Unido um quinto dos idosos viva abaixo do limiar da pobreza, eles constituem um grupo heterogéneo, alvo de quem vende produtos e serviços, protagonista de artigos de Life & Style em tudo quanto é jornal e revista. E é neste desabrochar da “economia grisalha” que Manchester afirma que quer manter os seus idosos e atrair outros.
A narrativa faz sentido. Ter criado uma narrativa que faz sentido, que as pessoas entendem, que desafia as ideias feitas, é uma das lições a tirar da estratégia da cidade, considera Tine Buffel, da Universidade de Manchester. Isso e ter apoio político, liderança, parceria alargada, efectivo envolvimento de idosos. Ela própria fez de idosos co-investigadores para perceber como tornar três bairros mais “age-friendly”.
“Se quiserem tirar uma fotografia ao que está a acontecer em Manchester, é uma luta porque o mais importante passa-se na cabeça das pessoas”, resume Hannen. “Tem a ver com passar poder às pessoas, ouvi-las, tratá-las com respeito.” Parece-lhe que um bom exemplo pode ser visto em algumas lojas de Old Moat, em Withington, no Sul de Manchester, identificado como zona de “ocorrência natural de reformados”. “Têm um selo de qualidade, digamos, que indica: isto é uma loja ‘age-friendly’. Não é preciso fazer muito. Bastar disponibilizar uma cadeira para que uma pessoa se possa sentar enquanto espera, um copo de água e, se houver, quarto de banho. Quanto é que isso custa? Custa alguém preocupar-se.”
Bairros amigos dos idosos
Derek vive lá, no Old Moat, um conjunto de ruas largas, bem pavimentadas, com casas de um lado e de outro, construídas umas a seguir às outras, com grandes quintais, nos anos 1920, pelo Estado. O bairro pertence à Southway Housing Trust. Aquela instituição particular de solidariedade social comprou mais de seis mil fogos no sul da cidade em 2007, ano em que a câmara se desfez de toda a habitação social.
Não é por acaso que Old Moat é das mais envelhecidas zonas de Manchester. “As pessoas gostam de morar ali”, resume Cathy Ayrton, directora da organização. Apreciam o sossego, a abundância de árvores, a serventia de transportes públicos, a proximidade do centro. Quase metade dos moradores já ultrapassou os 65 anos. É de esperar que os que têm 40 ou 50 só saiam se a vida laboral ou familiar os empurrar.
Recorreram a profissionais da Universidade de Manchester, da Escola de Arquitectura de Manchester, do Leech Rhodes Walker Arquitectos para perceber que oportunidades oferece Old Moat, que obstáculos coloca, como pode tornar-se mais adequado às necessidades dos residentes mais velhos. A ideia era criar um modelo que pudesse ser replicado pela organização noutros bairros.
Os peritos produziram um relatório com 114 recomendações, algumas muito pequenas, lembra Catherine Morris, responsável pelo projecto. “Old Moat tem apenas uma rua comercial. Alguns dos idosos que moram mais longe disseram: Custa-nos percorrer esta distância. Seria bom que tivéssemos um sítio para descansar.” E bancos foram colocados pelo caminho e à entrada da área comercial.
Derek já agradeceu mil vezes o pequeno gesto. Anda devagar, embora não precise de se apoiar em nada. “Estou a ficar um pouco velho”, suspira. “Antes nem pensava. Fazia. Fazer era parte de viver. Agora, antes de fazer qualquer coisa tenho de hesitar, de me perguntar: será que consigo fazer isto?” Nota mudança nos pequenos afazeres do quotidiano. “Quando vou às compras e trago leite, batatas ou açúcar, qualquer coisa mais pesada, é uma luta. Quando saio da loja não há problema, mas quando estou a meio do caminho... Ai. Tenho de usar aqueles bancos…. Nunca me passou pela cabeça que teria de fazer uma coisa dessas. Agora estou contente por terem colocado aqueles bancos…”
Não compra muito de cada vez. Vive sozinho desde que a última namorada, Margaret, fez as malas e voltou para a Irlanda. “Nos últimos 12 meses não me tenho sentido tão bem como antes. As coisas começam a custar-me. Não é nada em particular. É tudo, de certo modo. Tenho de admitir isso…. Eu tenho o entusiasmo de fazer, mas não tenho força para fazer. Por exemplo, esta manhã demorei cinco minutos a sair da cama. Não devia dizer isto, mas é verdade. É algo com que vivo, mas que me vai apanhando.”
Betty Bull, que mora a umas ruas de Derek, não gosta de o ouvir dizer aquilo. Recomenda-lhe que não se levante logo, que antes se vire para um lado, se vire para o outro, estique as pernas, leve os joelhos ao rosto. E que não se esqueça de ter sempre uma cadeira firme por perto para se segurar, caso caia.
Também vive sozinha, a mulher pequena, franzina nos seus 86 anos. Está viúva há 6 anos. O filho não vive longe, mas foi à Austrália visitar o neto, que acabou de lhe dar uma bisneta. “A minha filha mantém-se por perto. De vez em quando vem ver-me. Falamos ao telefone todos os dias. ‘Estás bem? Sim, obrigada. O que tens feito? Não muito’. Ela não sabe de metade das coisas que eu faço! Tenho a minha pequena área sob o meu domínio”, ri-se.
Há muito quem se perca ao visitá-la. Vive numa rua circular, a mulher de cabelo escorrido, apurado sentido de humor. O projecto prevê uma mudança no desenho de ruas como a dela, sinalização maior, com diferentes cores para que as pessoas com demência se possam orientar melhor. E ela aplaude.
Para envolver a comunidade, a Southway adoptou o modelo da autarquia: encontra-se com intermediários, os chamados “campeões”, como Derek e Betty, a cada dois meses para conversar sobre que já está feito e o que vão fazer, o que está a resultar, o que não está. E foi para ir a uma dessas reuniões que Derek não foi ao Fórum de Idosos ler a sua lista de dicas para combater o isolamento. Conhecem bem a vizinhança. Saem de casa todos os dias – andam a pé, de metro, de autocarro, de comboio. “Se uma pessoa não sai, fica deprimida. A depressão traz pensamentos horríveis”, diz ela.
Um estado a encolher
Derek não se queixa do país. “Estou bem. Só espero que a minha saúde não piore.” Não paga taxas moderadoras nas consultas de urgência ou de rotina, intervenções cirúrgicas ou internamentos, nem quaisquer medicamentos que lhes sejam prescritos. A cada Inverno, tem subsídio para pagar o aumento da conta do gás ou da electricidade.
Vivendo em Manchester, dir-se-ia que só o cansaço o pode impedir de circular. A cada mês, passe gratuito para quase todos os transportes públicos. Sempre que quiser, entrada livre em museus, galerias, bibliotecas, piscinas. E que farta que é a agenda cultural para quem já ultrapassou a barreira dos 65.
Quase todos os autocarros têm piso rebaixado, rampa, espaço reservado a cadeiras de rodas e a carrinhos de bebé, motoristas formados para prestar especial atenção a pessoas idosas ou com mobilidade reduzida. Prevalecem passeios limpos, livres de obstáculos, reservados a peões, com bermas rebaixadas ao nível das passadeiras, amiúde assinaladas com marcas antiderrapantes e equipadas com sinal sonoro.
Manchester gaba-se de ser a melhor cidade para viver sem carro a seguir a Londres – 73% das viagens para a cidade a cada manhã fazem-se a pé, de bicicleta ou de transportes públicos. Mas quem carrega tantos anos, como Derek, vê falhas em muito lado: ainda há sítios perigosos para atravessar, quase não há sanitários públicos, dava jeito ter mais bancos na cidade para descansar, recuperar forças.
“Saiu um relatório este ano a dizer que estamos a atingir os critérios das cidades amigas das pessoas idosas”, comenta McGarry. “Não é fácil. As cidades foram estruturadas para pessoas jovens, em idade activa. Cresceram sem que as mais velhas fossem chamadas a ajudar a pensá-las, a planeá-las. E em 2009 a crise financeira e económica desembarcou no Reino Unido, trazendo as políticas de austeridade.”
Os idosos com fraca mobilidade já se afligiam com a perda de recursos, como postos de correios, bancos, mercearias. Com os cortes, viram fechar algumas bibliotecas, reduzir o horário de algumas piscinas, encolher a cobertura de transportes públicos, dificultar o acesso a alguns apoios sociais.
“O que se faz quando se tem cortes significativos ano após ano?”, pergunta McGarry. “O que se faz quando parte da nossa equipa desapareceu? As prioridades da cidade agora são o crescimento económico, a reforma dos serviços públicos, a integração dos serviços sociais e de saúde, a requalificação dos bairros. Tenho de me sentar na mesa e de dar uma perspectiva “age-friendly” de tudo isso. É esse o desafio. Temos de adaptar o nosso programa, a nossa narrativa, a nossa linguagem ao novo contexto. Central para nós é mobilizar todos os recursos da cidade, seja do sector cultural, seja do sector social.”
Um aspecto anima-o: a filosofia da cidade está a propagar-se aos concelhos vizinhos. Uma dezena de entidades está a criar aquilo a que chama um Hub do Envelhecimento da Grande Manchester. Envolve a saúde pública, os transportes púbicos e outros sectores estratégicos e visa incentivar comunidades e ambientes amigos dos idosos e ajudar quem tem demência a manter-se na comunidade e a controlar a sua vida até mais tarde.
“O envelhecimento é quase tudo”, diz John Hannen, que reprenta o Centro de Organizações Voluntárias Grande Manchester na Hub. “Não importa só quem é velho agora. Também quem vai ser velho dentro de 10, 15, 20 anos. Que serviços públicos vamos ter daqui a 10, 15, 20 anos? Se as pessoas não envelhecem bem, acabam nas urgências, nos hospitais, porventura incapazes de voltar a casa ou de viver sozinhas”, diz. Têm de ter um assistente pessoal ou de se instalar num lar, o que é caríssimo.
Acha que há muito para mudar nas cabeças dos britânicos (dos europeus?) e uma delas é a ideia de que para um grande problema tem de haver uma grande solução. A lógica de Manchester parece-lhe exemplar: “Trabalhar com as pessoas para encontrar muitas soluções. Tomar pequeno-almoço com um grupo de vizinhos, por exemplo, pode ser muito importante.” Pode ser o grande momento de convívio de um idoso. E dizem os estudiosos que o isolamento e a solidão são piores do que o tabaco e o sedentarismo a semear doença.
Isolamento e solidão
O debate sobre o isolamento e a solidão atravessa o Reino Unido. A Big Lottery já canalizou 82 milhões de libras para que, ao longo de seis anos, em 15 zonas do país se teste o que não funciona e o que funciona e pode ser replicado. A gerir o fundo na Grande Manchester, o Centro de Organizações Voluntárias decidiu apoiar idosos a pesquisar, identificar e investir em pequenos projectos que tornem o lugar mais “age friendly” e a incentivá-los a identificar novas actividades que possam fortalecer as redes locais.
“É preciso pensar em formas de ajudar as pessoas a apoiarem-se umas as outras”, comenta Hannen. “Isso é a abordagem ‘age-friendly’. É olhar para um sítio e perguntar: o que podemos fazer para tornar este sítio mais fácil para as pessoas se movimentarem, se encontrarem, fazerem as suas vidas? Como é que podemos pôr as pessoas em contacto, fazer com que convivam, com que se entreajudem?”
O terreno é fértil. Só na cidade, há três mil grupos de voluntários e organizações comunitárias, o que representa cerca de 10 mil pessoas. Alguns já recebem uma pequena verba para os ajudar a fazer actividades com idosos. O Bons Vizinhos Didsburry, por exemplo, tem actividades todos os dias no pequeno pavilhão do parque local, alugado à autarquia: música, artes, informática, exercícios de memória, cinema.
Na terça-feira de manhã é grande o rodopio em torno de um pequeno-almoço. A quinta-feira é o mais sossegado dos dias: juntam-se seis a oito pessoas para almoçar, dizer piadas e falar sobre a vida. “Se não tivéssemos o Bons Vizinhos, estávamos sozinhas, em casa, não teríamos para onde ir”, diz Ruth, de 91 anos, conduzida até ali por um voluntário. Há uns meses, estava acamada e participava no almoço via Skype. “Recebi um Ipad quando fiz 90 anos. Fui para a turma de novas tecnologias. Aprendi a usar. Adoro.”
Multiplicam-se as aulas de informática pelo país fora. As novas tecnologias facilitam a vida na hora de fazer compras, consultar o extracto bancário, conversar com amigos e familiares. No Old Moat, o bairro de Derek, há monitores que vão a casa dos idosos mais relutantes ou incapazes de sair ensiná-los a usar computador ou tablet. Derek já se alistou no próximo curso. O projecto dele será vender o que foi juntando e que não terá espaço para guardar quando se mudar para um apartamento mais pequeno.
“Sempre tive bons vizinhos, conta ele. “Agora, tenho um vizinho que é muito jovem e que tem muitos amigos. Ele gosta de ouvir música e gosta de fazer alterações na casa. A minha existência calma alterou-se consideravelmente.” Vai trocar um T2+1 por um T1. É o grande investimento do senhorio no bairro: construir apartamentos para acolher idosos sozinhos, como ele, ou casas de madeira que se podem montar e desmontar para colocar nos grandes quintais de famílias que vivem num aperto de avós, pais e netos. Lá para o Natal, Derek muda-se para o seu apartamento novinho e “age-friendly”.
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