No comboio de Sófia para Belgrado, começamos a ver o revisor, um homem de colete, com um enorme crucifixo de ouro, com careca e nariz adunco a dar-lhe um ar de vilão de filme, atirar displicentemente uns lençóis para os compartimentos da carruagem com camas. Era o prelúdio para o episódio do comboio pobre.
Quando entramos, passamos numa carruagem onde alguém tinha perfumado com cremes e cheiro a cosméticos – era o melhor a fazer durante esta viagem. Ninguém estava com grande disposição para conviver ou conversar. Interessava passar a noite e chegar.
O vilão transformou-se num revisor simpático, apesar de ter levado as nossas reservas de lugar afastando os protestos (“precisamos da factura!”) com um gesto e um sorriso. Depois, a viagem foi um corropio de revisores, guardas de fronteira que competem em brusquidão na abordagem e remexem os passaportes com brio, de um e outro lado: saímos da União Europeia por umas horas.
Ao ver amanhecer em Belgrado, dividimo-nos entre a pena de ir já embora e a preocupação com a etapa seguinte. Lá vamos, suspirando de alívio ao ver os compartimentos arejados e bancos confortáveis do comboio de Belgrado para Budapeste. A diferença entre dois comboios em tão curto espaço de tempo foi a maior da viagem até agora. De resto, repetiu-se o mesmo corropio de revisores e polícia de fronteira, desta vez também com guardas de alfândega que escrutinaram carruagens e passageiros.
Mas já estávamos de novo na União Europeia. Notava-se pelo menos numa coisa: as tarifas de roaming tinham passado de altas a normais.
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